'Ginecologista trabalha colocando a mão na mulher', alega médico suspeito de assédio

Profissional de Vitória da Conquista se manifestou através de uma carta

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  • Mario Bitencourt

Publicado em 17 de maio de 2019 às 15:39

- Atualizado há um ano

. Crédito: Mário Bittencourt/CORREIO

Advogada apresenta defesa de ginecologista suspeito de assédio (Foto: Mário Bittencourt/CORREIO) Suspeito de assédio sexual, o médico ginecologista e obstetra Orcione Ferreira Guimarães Júnior, 40 anos, garante que é inocente. As afirmações foram feitas através de uma carta apresentada pelos seus advogados de defesa, nesta sexta-feira (17), em Vitória da Conquista, no sudoeste da Bahia.

As denúncias começaram em uma rede social, no dia 10 de maio. Desde então, 24 mulheres procuraram apoio jurídico na Subseção da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), na última segunda-feira (13), e, no dia seguinte, ao menos 13 delas registraram queixas na Delegacia Especial de Atendimento à Mulher (Deam). 

A responsável pela leitura do documento foi a advogada de defesa do médico, Palova Parreira, especializada em direito médico. No documento, Orcione Júnior afirma que “estão faltando com a verdade” e que “vão identificar os autores da página criminosa”. Ele acusa ainda “algum outro profissional que não quer aparecer na denúncia" de tentar prejudicá-lo”.Em sua defesa, o médico disse em trecho da carta que “ginecologista trabalha colocando a mão na mulher, a gente faz exames de útero, exame vaginal, de prevenção de câncer, tocando áreas da mama e fazer essas acusações é uma covardia”.Orcione Júnior pontuou ainda que tem 15 anos de formado e que, nesse tempo, já atendeu “mais de 15 mil mulheres”. Na continuação, ele diz que os relatos de assédio sexual são falsos. “Só foram 24 mulheres [que denunciaram], mas atendemos mais de 40 por dia e temos vídeos dessas pacientes nos apoiando e dizendo que nunca receberam tratamento indevido da nossa parte”, escreveu.

Durante a leitura, a advogada reforçou as palavras do médico e disse também acreditar que há um outro médico, cujo nome não foi revelado, tentando prejudicar o ginecologista. Ela afirma que o profissional já foi identificado e que notificou extrajudicialmente a esposa dele, que também teria participação no caso. “Ele se sentiu prejudicado depois que Orcione Júnior passou a atender por meio de um convênio com um plano de saúde”, disse.

“Analisando essa clínica, vocês vão encontrar as motivações [para as denúncias]”, acrescentou a advogada. Segundo ela, uma das mulheres que buscou a polícia para denunciar o médico, inclusive, não possui registro de atendimento com o profissional no hospital da cidade onde Orcione Júnior atende. Orcione Júnior é suspeito de assédio (Foto: Reprodução) Sem provas Durante a entrevista, Palova Parreira pontuou que há falta de provas documentais ou testemunhas que comprovem as acusações contra Orcione. Apesar disso, especialistas em direito criminal disseram ao CORREIO que, em casos de assédio sexual ou abuso, o depoimento das vítimas tem valor maior, pelo fato de que esse tipo de crime ocorrere geralmente em ambientes fechados, nos quais só estão a vítima e o abusador.

Ainda durante a entrevista, a advogada disse que “abraço e beijo não é abuso sexual, é relação de confiança”. Ela acrescentou que Orcione Júnior reconheceu ter atendido apenas duas das 24 supostas vítimas que afirmam terem sido assediadas sexualmente e que “a culpa [do médico] que tem de ser provada”.

Ao falar sobre uma das vítimas, Palova pontuou que se trata de "uma que se filma em ato sexual explícito na porta de um bar num bairro". "Não é que por fazer isso, que ela pode ser abusada, mas, ao analisar a conduta de quem acusa, você vai saber se aquela palavra é crível ou não”, completou ela, que negou em seguida que sua declaração é uma tentativa de desqualificar a vítima.

Outra mulher que teria sido assediada, segundo defesa, “teve uma suspeita de aborto provocado, mas não tem prova, porque se tivesse prova tinha que denunciar". "A paciente chegou com infecção mais grave no útero, e ele só poderia fazer mais exames para comprovar [o aborto] se a paciente concordasse. O médico não tem poder de polícia. Houve uma suspeita [de aborto], ele comunicou à paciente, que não autorizou maiores exames. Ele não pode obrigar”, completou a advogada. 

No Brasil, aborto é considerado crime e o Código de Ética Médica, no Art. 73 veda ao profissional “revelar segredo que possa expor o paciente a processo penal”.

Ao final da entrevista, Palova Parreira apresentou uma certidão do Conselho Regional de Medicina da Bahia (Cremeb), informando que “nada consta que desabone a conduta ético-profissional” do médico e uma declaração do Hospital Unimec (que possui uma gestão privada e outra municipal) com o mesmo conteúdo.

Orcione tinha se comprometido a comparecer à entrevista, mas se ausentou e alegou que iria a um culto ecumênico em sua clínica particular no bairro Brasil, em Conquista.

O suposto culto teria sido realizado por pessoas de uma igreja que apoiam o médico. Os advogados de defesa do médicos se comprometeram a enviar fotos e vídeos da cerimônia para a reportagem, o que não ocorreu até a publicação desta reportagem.

O CORREIO foi até a clínica onde teria acontecido o culto e encontrou apenas três pessoas no local, sendo dois homens e uma mulher, que disse que “faz 20 minutos que o culto acabou”, e fechou as portas. Foto: Mário Bittencourt/CORREIO Justiça exige exclusão de perfil A Justiça determinou nesta quinta-feira (15) que o Instagram exclua provisoriamente o perfil criado no dia 10 de maio para denunciar casos de suposto assédio sexual contra o médico.

A decisão dada pela juíza Arlinda Souza Moreira, da 1ª Vara do Sistema dos Juizados de Vitória da Conquista, determina também que o Instagram “forneça os dados cadastrais que permitam identificar o usuário que criou o referido perfil, como IP, data e hora de acesso”.

O CORREIO procurou a assessoria de comunicação do Instagram, que informou não ter sido notificado da decisão liminar (provisória). A rede social tem 48h, a partir da notificação, para tomar as providências exigidas, sob pena de multa diária de R$ 500. O perfil, que atualmente conta com 7,6 mil seguidores, mudou de nome recentemente. Ao invés de se chamar @diganaovca, agora tem nome de usuário @diganaovdc.

As vítimas têm entre 18 e 30 anos e os supostos assédios teriam ocorrido num período de seis anos, tanto na clínica do médico como em outros hospitais da rede pública e privada onde o profissional atendia. Desde que o caso se tornou público, o médico deixou de fazer atendimentos.Uma cópia da decisão liminar foi distribuída nesta sexta-feira (17) por advogados do médico Orcione Júnior, durante a entrevista.

O CORREIO entrou em contato com o presidente da Associação de Obstetrícia e Ginecologia da Bahia (Sogiba), Caio Lessa. Ele explicou que "todo caso que envolve atitudes contrárias à conduta médica são investigados pelo Conselho Regional de Medicina (CRM), mesmo sem que haja uma denúncia formal de um paciente".

Ele acrescentou ainda que não se manifestará sobre o caso do ginecologista por não ter conhecimento dos fatos.