Grávida baleada pela PM em Paripe sai do coma induzido: 'milagre de Deus'  

Mãe comemora recuperação; médico prevê alta da UTI até essa terça-feira (25)

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  • Marcela Vilar

Publicado em 24 de maio de 2021 às 16:46

- Atualizado há um ano

. Crédito: Acervo Pessoal/Marina Silva/CORREIO

A gestante Jucilene de Santana Juriti, 23 anos, que foi atingida na porta de casa, no bairro de São Tomé de Paripe, em Salvador, na última segunda-feira (17), durante uma ação da Polícia Militar, saiu do coma induzido. Ela está internada no Hospital do Subúrbio e, segundo o marido, Ângelo Oliveira, 24, a previsão de alta da Unidade de Terapia Intensiva (UTI) para a enfermaria é até esta terça-feira (25).  

“Ela saiu do coma, graças a Deus, tá reagindo e comendo pastosamente. Eu tô mais descansado, aquele peso que tava nas costas já saiu. Tô mais tranquilo, sabendo que ela tá se recuperando”, agradece Ângelo Oliveira, que é servente de pedreiro.  

Sogra dele e mãe de Jucilene, a empregada doméstica Eliene de Santana, 42, também está aliviada com a melhora. "O verdadeiro milagre de Deus. A recuperação dela é surpreendente. Ela nao esta mais intubada, está falando e se alimentado. A dieta ainda pastosa, mas cada dia é grande vitória", comentou ela, sem esquecer da morte da neta que estava para nascer."Espero que seja feita a justiça, porque uma vida foi embora e posso garantir que era uma criança já amada por todos. Não iria faltar amor", completou dona Eliene, em resposta ao CORREIO.

Segundo o esposo, Jucilene saiu do coma no sábado pela manhã, por volta das 11h. Ela já não está mais intubada, porém, está sob observação na UTI. Ela passou por uma cirurgia r sofreu lesões no rim, estômago e no baço, além de ter quebrado um braço. A jovem ainda não sabe que perdeu o bebê no confronto com a polícia. Ele tinha sete meses. 

“Ela ainda não sabe, pensa que tá intubado. Eu não sei como chegar para ela e dar uma notícia dessa. Vou falar com a psiquiatra, para saber se pode, e tentar acalmar ela”, confessa Ângelo. A criança que estava em sua barriga foi sepultada pela família na última quinta-feira (20).

Segundo ele, a esposa ainda está muito abalada. “A mãe dela conseguiu entrar [na UTI], conversar com ela, ela respondeu, mas ainda está muito abalada, muito chocada. Ela lembra de tudo, o coma não afetou sua memória, ela está consciente do que aconteceu”, completou, se referindo à visita de dona Eliene.

O filho mais novo do casal, de dois anos, também não sabe do ocorrido, e tampouco tem consciência que a mãe está no hospital. Já a filha mais velha, de cinco anos, tem ciência. Todos moram juntos. Casados, Jucilene e Ângelo têm filhos de 2 e 5 anos de idade (Foto: Acervo da família) A Defensoria Pública da Bahia vai acompanhar o caso de Jucilene. A área especializada em Direitos Humanos da Defensoria atendeu Ângelo, que recebeu orientações jurídicas da defensora Eva Rodrigues. Ela vai acompanhar o caso, e tem inclusive uma audiência marcada na Corregedoria da Polícia Militar.

Relembre o caso Na segunda, Jucilene nem teve tempo de correr. Por volta das 16h30, ela foi atingida por três tiros, um deles na barriga, que atingiu o útero e matou seu bebê. A jovem sofreu lesões no rim, estômago e no baço, além de ter quebrado um braço.  

Jucilene estava na porta de casa ao lado da sogra e de seus outros dois filhos, de 3 e 5 anos. O mais novo estava sentado no colo da mãe quando ocorreram os disparos. Ele não foi atingido por muito pouco, mas ficou sujo com o sangue da mãe.

Mesmo baleada, Jucilene ainda encontrou forças para pegar os dois filhos no colo e levá-los para dentro de casa. Só depois ela caiu e pediu ajuda. O policial militar, que segundo testemunhas foi o autor de todos os disparos que atingiram a gestante, prestou os primeiros socorros e levou a vítima até o Hospital do Subúrbio.

Ângelo disse que os policiais perseguiam um homem que se escondeu no beco onde estavam a mulher, a mãe e os filhos dele. Ele contou que os policiais viram que a rua estava cheia e mesmo assim efetuaram os disparos. 

Caseira O casal Ângelo e Jucilene é evangélico e tinha se casado há oito meses, apesar de já terem outros dois filhos. Essa terceira gravidez era planejada e muito aguardada por todos os familiares.

Jucilene é conhecida por ser uma mulher tranquila, caseira e muito ligada à família. Durante a pandemia, ela evitava até sair para a casa da mãe por medo do coronavírus.

"Estou desacreditada de tudo. Isso está se tornando banalidade. Eu entendo que a bandidagem está grande e que eles não recebem a polícia com flores. Mas os policiais precisam ter treinamento. Eles não podem sair atirando à esmo num bairro em plena luz do dia", desabafa a mãe da jovem, Eliene Assis de Santana, de 42 anos.

Eliene tem problemas de hipertensão e ao chegar no hospital para visitar a filha, precisou ser atendida também pois passou mal.

Ela chegou a conversar com o policial autor dos disparos e ele contou que também é pai e que está colocando a cara à tapa para tentar salvar a vida de Jucilene.

Eliene cobrou alguma atitude do governador Rui Costa e o secretário de Segurança Ricardo Mandarino. "Quantas filhas, mães e crianças inocentes vão precisar morrer antes que alguém resolva esse problema? A gente vê acontecendo isso diariamente. Famílias sendo esfaceladas por conta de ações policiais", cobra.

Protesto Por conta da ação, familiares, amigos e moradores da região realizaram um protesto na manhã desta terça-feira (18) cobrando justiça. O grupo fechou o trânsito da BA-528.

Posicionamento da Polícia Militar Em nota, a Polícia Militar da Bahia informou que uma equipe da 19ª CIPM estava na Rua Adilson Ferreira, em Paripe, na tarde de segunda-feira (17), quando, de acordo com os policiais, se depararam com suspeitos que atiraram contra a guarnição.

As testemunhas ouvidas pelo CORREIO, no entanto, negam que houve um confronto entre policiais e bandidos e que apenas as autoridades efetuaram disparos.

A PM ainda informa que uma mulher grávida foi encontrada ferida e, em seguida, levada pelos policias para o Hospital do Subúrbio.

A nota encerra dizendo que o caso será apurado pela Delegacia de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), onde a ocorrência foi registrada. "A partir do resultado da perícia técnica, a PM adotará as medidas legais cabíveis", diz a corporação.

*Sob orientação sa subchefe de reportagem Monique Lobo