Hospital em Salvador é condenado por escalar recepcionista lactante durante pandemia

A Justiça entendeu que a trabalhadora foi coagida a pedir demissão

Publicado em 9 de junho de 2022 às 16:32

- Atualizado há 10 meses

. Crédito: Foto: Agência Brasil

Uma recepcionista do Hospital Prohope Ltda. foi indenizada em R$4 mil e teve o seu pedido de demissão anulado e convertido em rescisão indireta após ter sido escalada para trabalhar em local insalubre no retorno à licença-maternidade, quando ainda era lactante. A decisão foi da 4ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região (TRT-5).

A Justiça entendeu que a trabalhadora foi coagida a pedir demissão, já que o hospital colocaria a saúde dela e do bebê em risco em face da pandemia da covid-19. Ainda cabe recurso da decisão.

Tudo começou quando a recepcionista estava de licença-maternidade, até maio de 2020. Com o fim da licença, ela teria que retornar às atividades presenciais na recepção do hospital, mas o bebê ainda estava em período de amamentação. Ao entrar em contato com a chefe por mensagens, a trabalhadora explicou que,  por ser lactante, fazia parte do grupo de risco da covid-19. O pediatra teria comunicado que ela não deveria retornar ao serviço no hospital, dando-lhe um atestado médico de 30 dias.

O prazo não foi acatado pela empresa, que concedeu 15 dias de afastamento. Segundo a trabalhadora, ela também pediu para ser incluída no programa do governo para pessoas em grupo de risco, mas não obteve êxito.

O hospital alegou, em defesa, que a recepção em que a empregada trabalhava não apresentava riscos, por não ser o setor de entrada de casos gripais.

Procurado pelo CORREIO, o estabelecimento afirma que a decisão judicial não é definitiva e ainda pode sofrer alteração no âmbito do judiciário.

"Já foram adotadas as medidas cabíveis e o processo está em grau de recurso. Cumpre informar que a decisão foi, inclusive, proferida sem que houvesse a realização de perícia técnica", diz pronunciamento.

O Hospital reforçou o "comprometimento e respeito às normas trabalhistas, especialmente ligadas à segurança e saúde de seus colaboradores".

Decisões

Para a juíza da 37ª Vara do Trabalho de Salvador, onde o caso foi inicialmente julgado, a trabalhadora foi coagida a pedir demissão do emprego. Ela considerou nulo o pedido de demissão e a rescisão do contrato, levando em conta que o empregador não cumpriu as suas obrigações (art. 483, d, CLT).

Ao avaliar o recurso da empresa, o relator, juiz convocado Marco Valverde, entendeu que o pagamento espontâneo e reiterado de adicional de insalubridade à recepcionista leva a presumir que o trabalho era realizado em condições insalubres.

O relator afirmou ainda que a CLT veda o trabalho da lactante nestes locais, independentemente do grau de insalubridade, e que é incontestável o alto poder de proliferação do coronavírus, sendo o ambiente hospitalar bastante propício ao contágio.

O magistrado afirma que no momento em que ela pediu demissão, em 2/6/2020, a reclamante ainda era considerada lactante e, consequentemente, não poderia voltar ao trabalho na emergência geral do hospital, “tendo em vista tratar-se de ambiente exposto a condições insalubres”. Em sua visão, “vendo-se obrigada a retornar ao trabalho, havendo, inclusive, o acolhimento apenas parcial de atestado médico que lhe foi concedido, a reclamante pediu demissão, ficando caracterizada a coação indireta por parte do empregador”.

Por todas essas questões, o juiz convocado decidiu manter a sentença que reconheceu a nulidade do pedido de demissão, convertendo-o em rescisão indireta do contrato de trabalho. O hospital terá ainda que indenizar a funcionária em R$ 4 mil por danos morais, uma vez que ficou comprovada a conduta ilícita em coagir, ainda que indiretamente, a trabalhadora a pedir demissão.