Iemanjá do Rio Vermelho

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  • Nelson Cadena

Publicado em 3 de fevereiro de 2022 às 05:04

- Atualizado há um ano

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Escrevo de novo sobre o assunto apenas para colocar no lugar alguns aspectos de meu artigo, publicado semana passada. Então, lembrei da oportunidade de comemorarmos o Centenário da Festa de Iemanjá no ano próximo. Esclareço que falei do Centenário da Festa de Iemanjá no Rio Vermelho. O culto ao Orixá na Bahia é mais antigo, realizado na pequena praia dos fundos da ponta de Monte Serrat, sob o comando do Pai de Santo Tio Ataré. Era culto, e apenas isso, exclusivo para o Povo de Santo da Bahia.

Mais tarde, e ainda no século XX, a Festa de Itapuã já incorporara uma romaria em louvor à Mãe D’Água como parte dos festejos. No Rio Vermelho, especificamente, já tínhamos desde a década de 1840 a Romaria dos Jangadeiros, eles organizadores e protagonistas da festa do arrabalde. Não há relato de oferendas. Mais tarde, quando o local se tornou um balneário para veraneio das famílias mais abastadas da cidade, a elite tomou conta e repaginou a festa, com o apoio da Igreja Católica. Nasce a Festa de Nossa Senhora de Sant’ Anna que incorpora a romaria como atração, promove corrida de jangadas e quando a igreja ordenou, excluiu os jangadeiros, em 1906. Um ano apenas, diante da repercussão e resistência.

Continuou sendo Festa de Nossa Senhora de Sant’Anna até a década de 1970, mesmo com o presente e romaria dos pescadores, evento menor agregado, a partir de 1923 ou 1924 - não há como saber a data certa, o registro é de oralidade. A romaria cresceu através da repercussão na mídia das músicas de Caymmi, dos artigos de Odorico Tavares na Revista Cruzeiro, das fotos de Verger na mesma publicação, das referências na obra de Jorge Amado, da presença, todo ano, de Jamelão na Bahia e de personalidades, sociólogos, antropólogos e folcloristas. Foi assim que a Festa de Iemanjá se sobrepôs à Festa de Nossa Senhora de Sant’Anna.

Se não sabemos qual a data certa da primeira romaria  nenhum problema quanto a isso. A data não importa, desde que tenhamos alguma referência e motivação. Nenhuma festa popular da Bahia, apenas uma exceção, tem certificado de registro de nascimento comprovado. Todas tem datas de oportunidade, aproximadas ou manipuladas pelas fontes da mídia. A exceção é a do Senhor do Bonfim, que rasgou o registro de nascimento duas vezes:  o da data do primeiro evento e o do ano de referência original.

O primeiro evento ocorreu em 24 de junho de 1754, o translado da imagem em romaria da Igreja da Penha para a igreja da Colina.  Mudamos o 24 de junho para janeiro, de modo a  favorecer os veranistas do arrabalde, a elite da cidade. Todas as festas populares da Bahia eram organizadas e financiadas pelas elites, antes do poder público meter o bedelho e dar palpite, com exceção da Festa de Santa  Bárbara organizada por feirantes, depreciativamente chamados de peixeiros.  E mudamos, também o ano de referência, para 1745 (em que o capitão e traficante de escravos Theodozio Roriz de Farias trouxe a imagem de Setubal), para atender à conveniência política de celebrar o bicentenário da festa em 1945.

A oportunidade de se comemorar o Centenário da Festa de Iemanjá, no ano próximo, é uma decisão dos três entes envolvidos na organização e financiamento da festa: a colônia dos pescadores, o terreiro encarregado do presente principal e a prefeitura que deve reservar um valor no orçamento, além do convencional corrigido e já corroído pela inflação, para celebrar o evento em alto estilo. O resto, a cobertura da mídia local e nacional, virá a reboque. Os baianos, o quarto ente, ficarão mais do que gratificados em participar de uma celebração que faz parte da memória coletiva de gerações e se, festejado em 2023, soma no contexto das celebrações do bicentenário da Independência da Bahia.