Jovem quilombola baiana é aprovada em medicina em faculdade no RS

"Estudava de segunda a sábado", diz Carlúcia, que já virou referência para comunidade

  • D
  • Da Redação

Publicado em 21 de agosto de 2021 às 16:56

- Atualizado há um ano

. Crédito: Divulgação

Uma estudante quilombola de 21 anos foi aprovada no vestibular para medicina da Universidade Federal de Pelotas (UFPEL), no Rio Grande do Sul. Carlúcia Alves Ferreira, de Candiba, viveu dois anos de desafios enquanto sonhava com a aprovação e agora já se tornou um referencial para outras meninas da comunidade. 

Carlúcia concluiu o Ensino Médio em 2019, no Colégio Estadual Antônio Batista, que é em tempo integral. Logo em seguida ela foi aprovada em enfermagem na Universidade do Estado da Bahia (Uneb), mas contrariou conselhos e acabou cancelando a matrícula nesse curso, para resolver continuar estudando para estudar medicina, que era o seu sonho.

Ela conta um pouco como foi a trajetória. “Comecei a estudar em casa, com auxílio das plataformas gratuitas e dos conteúdos do projeto Enem 100%. Estudava de segunda a sábado, fazia duas redações e um simulado por semana. Tive o apoio irrestrito de professores da escola, em especial a professora de redação Vina Queiroz, que se reunia comigo para pensar estratégias de estudos e transmitir”, explica.

Mesmo estudando bastante, Carlúcia também continuou trabalhando com venda de lanches e artesanato e ainda arranjava tempo para dar aulas de reforço escolar para as crianças da comunidade. A jovem mora em uma casa pequena com os pais e a irmã. 

A baiana celebra a conquista, mesmo em meio a tantas adversidades.  “Meus pais nunca puderam dar algo a mais do que o básico. Então, a minha vida no quilombo sempre foi muito limitada. Porém, isso não impediu que eu sonhasse grande e, com o incentivo da minha mãe, nunca desisti da medicina. Gosto de pessoas e de cuidar delas. Quero estar presente tanto nos momentos mais tristes, quanto nos mais felizes. Sou uma prova de que uma preta pobre pode ser uma médica. Fiz minha matrícula e vou fazer de tudo para ser uma excelente profissional e proporcionar para a minha família e as pessoas que eu amo uma vida mais confortável”, diz.

Mãe de Carlúcia, a lavradora Luciene Santos Alves Silva, 47 anos, conhecida como Tia Yô, também se emociona ao falar da aprovação da filha. “É uma felicidade muito grande. Sempre sonhei em estudar, mas na minha época as mulheres daqui não podiam, isso era coisa de menino. Estou emocionada e muito feliz. Carlúcia vai ser inspiração para muitas jovens pretas que vivem na zona rural, de renda muito baixa como nós. Ela é uma menina decidida, com uma fala firme e com propósito para a vida. Tenho certeza de que esta é a primeira de muitas conquistas que essa guerreira quilombola vai ter”.

Vanessa da Silva, de 16 anos, que estuda no mesmo Colégio Estadual Antônio Batista que formou Carlúcia, diz que o exemplo estimula.  “Ela é um exemplo, uma pessoa muito estudiosa, que sempre lutou pelos seus sonhos. Vejo sua determinação para conquistar diversos sonhos e isso é uma fonte de inspiração para mim e para vários outros jovens da nossa comunidade. Saber que um de nós vai cursar medicina propicia uma felicidade imensa para toda a comunidade quilombola”.

A aulas já começaram, por enquanto na modalidade EAD, por conta da pandemia.