Jovens, não é papo de velho. Precisamos falar sobre a aids!

Após declaração do presidente Jair Bolsonaro, a aids voltou a ser pauta. Fora a fake news, a nova geração deixou de se preocupar com a doença. E isso é grave

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  • Da Redação

Publicado em 31 de outubro de 2021 às 16:00

- Atualizado há um ano

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Como diria uma frase inventada agora, há fakes que vem para o bem. Na última semana, o presidente Jair Bolsonaro associou a vacina contra a covid-19 à transmissão da aids. Suco de fake news, não é mais novidade. Porém, a fala do presidente acendeu um alerta bem diferente: já repararam que não se fala mais de HIV entre os mais jovens? Parece que a aids virou um assunto no pretérito imperfeito, onde apenas as gerações mais velhas “podiam” pegar a doença e andavam com camisinha na carteira. Ledo engano. Segundo a Secretaria da Saúde do Estado da Bahia (Sesab), até setembro deste ano 1.606 pessoas foram diagnosticadas com o vírus ou a doença no estado, somente em 2021. O HIV não pega com a vacina contra a covid-19, isso é fato, mas ainda é transmissível e não é papo de velho.

Para a turma da geração Z que gosta de ouvir músicas dos anos 80, certamente já ouviu Cazuza cantar “o meu prazer agora é risco de vida”. Pois bem. Ele se referia à aids, que foi sua sentença de morte e de tantos outros artistas da época. Hoje, com o avanço na ciência, uma pessoa diagnosticada vive uma vida normal, desde que não deixe de tomar suas medicações. Contudo, o HIV ainda convive conosco. Para se ter uma ideia, no último carnaval de Salvador, em 2020, 43 pessoas que fizeram um teste rápido nos postos de saúde espalhados pelo circuito tiveram diagnóstico positivo para HIV. Não queremos meter medo, mas o assunto é sério. Seus pais já falaram sobre aids com você? 

Parece óbvio, mas nunca é tarde para lembrar aos mais novos. O vírus é transmitido por transfusão sanguínea (sangue contaminado), pelo compartilhamento de seringas contaminadas, na gravidez e, principalmente, por relação sexual sem preservativo, caso alguma pessoa esteja contaminada. Por isso, ela é conhecida como uma doença sexualmente transmissível (DST). Mesmo assim, parece que a camisinha não é mais vista como prevenção, mas apenas uma maneira de evitar outra coisa. “Aids? Isso não pega mais não, tá louco. Uso camisinha porque não quero ser pai, não estou afim de engravidar ninguém. Não me preocupo com aids, nunca tive ninguém transando comigo dizendo que precisa usar camisinha para evitar a aids. Só pega isso quem faz o teste”, disse Agenor de Miranda, de 20 anos.  

Parece redundante, mas este tipo de despreocupação preocupa. Diretora da Casa de Apoio e Assistência aos Portadores do Vírus HIV Aids (Caasah), Celeste Cardoso assegura que a aids ainda é um perigo, principalmente entre os jovens.“O que me assusta é que os jovens de hoje possuem a informação na palma da mão. Não pode ter a desculpa que não tem conhecimento sobre a aids, diferentemente dos anos 80 e 90. Eles sabem o que é a aids, só não se importam. Eles preferem priorizar o prazer, ao invés do perigo de ter o HIV. Muito preocupante, pois o HIV ainda pode matar”, diz Celeste.A Caasah acolhe pessoas com HIV há 30 anos, dando assistência médica, psicológica e social.  HIV x Aids  Se é informação que os jovens precisam, vamos lá. Primeiro vamos separar a aids do HIV. O primeiro é a doença, o segundo é o vírus. É como covid-19 e coronavírus, respectivamente. Em alguns casos, a pessoa pode ter o HIV no sangue, mas nunca desenvolver a doença (como um assintomático). Outra: ninguém morre de aids, mas em decorrência dela. Como ela é uma síndrome da imunodeficiência adquirida, o paciente perde sua defesa natural do corpo e até uma gripe pode ser fatal. Com medicamentos, a pessoa controla a carga de vírus e pode viver uma vida normal. Mesmo assim, o HIV ainda tem um efeito colateral devastador: o preconceito. “Vivo uma vida normal. O diabético tem muito mais problemas de saúde do que uma pessoa com HIV. Mas ninguém tem preconceito com o diabético. Hoje, digo que o HIV é muito mais uma doença psicológica que física. Vivo uma vida normal, mas ainda escondo minha condição para evitar o julgamento. Eu, mesmo vivendo uma vida normal, ainda tenho na testa o rótulo de pervertido pelo fato de ter HIV. É uma opressão automática”, disse Renato Manfredini, baiano que mora na Europa e convive com a doença há oito anos. Renato faz uso de três medicamentos que não são distribuídos de forma gratuita lá, diferentemente de no Brasil. “Cada remédio aqui custa 800 euros. No Brasil, o SUS distribui de graça”, conta. Ele só conseguiu medicamentos sem custos na Europa após entrar numa lista de cobaias para novos medicamentos. “Temos que agradecer por termos o SUS. O maior problema do Brasil é justamente o preconceito e a falta de informação clara sobre a doença e como ela ainda está entre nós. No Brasil, infelizmente, as pessoas ainda acham que a aids é uma doença apenas de gay. Incrível como ainda estamos atrasados nisso”, completa.

De fato, também é preciso desmistificar este equívoco. A aids não escolhe gênero, tampouco orientação sexual. Segundo o último boletim do Ministério da Saúde, de 2007 até junho de 2020 foram notificados 342.459 casos de infecção pelo HIV no Brasil. Destes, 31,3% se declararam heterossexuais. Mesmo assim, ainda existe o estigma de que só é preciso falar de aids entre os homossexuais.

“Minha família veio conversar comigo sobre a importância de usar camisinha após uma pessoa do meu interior, que é homossexual, ter sido diagnosticada com aids. Eu fiquei um pouco chateado com o conselho deles, pois outras pessoas da cidade, héteros, também já foram diagnosticadas e ninguém nunca havia conversado sobre aids lá em casa. Mas só quando um homossexual pegou que eles ficaram preocupados comigo. Eu sou bissexual, no caso”, conta Lauro Corona, que tem 20 anos. Ainda não existe a cura para aids, apesar de novas pesquisas estarem bem próximas dela. Enquanto isso, só se combate o vírus com três coisas: muita conversa, informação e camisinha. 

As fontes tiveram seus nomes trocados por de artistas que morreram em decorrência da aids. E para evitar o preconceito. 

Sabe o que é a aids, novinhx?

HIV – Sigla em inglês para vírus da imunodeficiência humana. Ele causa a doença chamada aids.

Aids – É a doença causada pelo HIV, que ataca o sistema imunológico responsável por defender o organismo de doenças. A pessoa perde sua defesa natural e até uma gripe pode ser perigosa. Nem todo mundo que tem o HIV desenvolve a Aids.

Transmissão – Pode ser passado através de relações sexuais sem o uso da camisinha, por transfusão sanguínea, pelo compartilhamento de seringas contaminadas ou de mãe para filho durante a gravidez.

A aids em números43 pessoas tiveram o diagnóstico de HIV nos testes rápidos nos postos de saúde durante o último carnaval de Salvador, em 2019. 37,6 milhões de pessoas no mundo têm HIV até 2020. 6 milhões pessoas no mundo desconheciam ter HIV até 2020 Estima-se que 690 mil pessoas tenham morrido de doenças relacionadas à AIDS no mundo em 2020.   1,5 milhão de pessoas foram infectadas pelo HIV, somente em 2020. 52,7% dos casos de HIV estão na faixa etária entre 20 e 34 anos. 1.011.617 de casos de aids no Brasil, entre 1980 e junho de 2020. 349.784 pessoas morreram em decorrência da Aids no Brasil, entre 1980 e 2019.  Fonte: ONU e Ministério da Saúde