Luther King solta a voz no preto Bahia

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  • Paulo Leandro

Publicado em 19 de outubro de 2019 às 05:00

- Atualizado há um ano

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Martin Luther King, Mandela, os líderes da Revolução dos Alfaiates e de todos os levantes populares afro-brasileiros manifestam-se em Roger Machado. O professor – este merece o título – desandou a falar verdades sobre o racismo no futebol.

Vamos editar os melhores momentos destes cinco minutos históricos. Serviram de atualização para uma genealogia do sofrimento dos 10 milhões de corpos humanos escravizados, arrancados de onde hoje ficam o Benin, a Nigéria, o Senegal, via Luanda.

Disse o professor Roger terem sido 25 gerações de escravizados em 388 anos de um sistema capaz de produzir abismos de desigualdades. O racismo institucional impôs nível de escolaridade menor e uma população carcerária composta 70% de negros.

Acrescentaria ao educador do Fazendão: a detenção dos negros é a política de Estado para segregar potenciais revoltosos pois torna-se mais fácil controlar o sistema prisional em vez de  enfrentar levantes e mais levantes, se livres estivessem estes excluídos.

Tanto isso é verdade que os tribunais anunciam a realização de mutirões para tentar, ao menos, apenar os detentos, pois a maioria sequer sabe por que está ali e qual o tempo da condenação, milhares deles já as tendo cumprido sem poder escapar.

Menores salários, maior mortalidade e outros itens, até mesmo a ausência de comentaristas e jornalistas de esporte negras evidenciam o que nosso Luther King do Bahia chamou de racismo estrutural produzido pelo Estado e as seitas que o apoiam.

O professor negou a versão do ‘coitadismo’, mas acusou o desmonte das políticas públicas. Não temos ainda campos de concentração para genocídio direto, mas podemos construir estruturas parecidas, se a cidadania seguir banalizando o mal.

Atravessamos o Brasil-Colônia, o Império e alcançamos a República, intensificando ou mascarando a discriminação contra o afro-brasileiro, ou o soteroafricano, como podemos chamar, pois Salvador, a Roma Negra, é a África reinventada.

A fala de Roger aumenta de importância porque ele é professor de um time nascido da rejeição ao racismo do Bahiano de Tennis e da Athlética (Associação), cujos grã-finos exigiram o fim dos seus departamentos de futebol para evitar a incômoda mistura.

O Ypiranga de Santa Dulce e Popó Bahiano, além do Botafogo do Corpo de Bombeiros, o Fluminense de Salvador, duas vezes campeão, e tantos outros clubs, aceitaram os colored mas os filhinhos de papai não toleravam perder, em jogo limpo, como até hoje.

Criado pelos players campeões, expulsos do Bahiano e da Athlética, o Bahia nasceu como resistência ao racismo de classe, mas o Bahia de hoje, apesar das belas campanhas de ativismo cidadão, pode ter vergado esta bela história de luta às estratégias de mercado.

A torcida vem desbotando porque os preços são proibitivos para quem tem menos dinheiro: os pretos. Poderia o Bahia, para ser coerente às palavras de seu Luther King, pensar numa forma de voltar a incluir as multidões afros afastadas?

Um sistema de cotas, com ingressos a preços mais acessíveis, poderia reduzir o impacto da alteração do perfil da torcida? A atual remodelagem pode favorecer a ordenha agora, mas vai definhar a espontaneidade, o melhor aspecto identitário dos afro-tricolores.

Paulo Leandro é jornalista e professor Doutor em Cultura e Sociedade