Luxo, consumo, mas poucas padarias: queixas dos moradores do Itaigara em 1989

Bairro se desmembrou da Pituba no início dos anos 1980 e virou reduto de consumo, com oito shoppings

Publicado em 29 de agosto de 2021 às 16:00

- Atualizado há um ano

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Bairro do Itaigara, Salvador, em 1989 (Foto: Haroldo Abrantes/Arquivo CORREIO) O ano era 1989 e fazia menos de dez anos que Salvador tinha ganhado um novo bairro: o Itaigara. Antes, o lugar era parte da antiga Fazenda Pituba, uma imensa área verde que pertencia a Joventino Silva – aquele mesmo que dá nome ao Parque da Cidade – e que ia desde a Orla até a Rótula do Abacaxi. Com o tempo, tudo foi se desmembrando até se formar uma grande Pituba e, lá pelo início dos anos 1980, o Itaigara se separou, tornando-se um reduto de luxo e consumo.

Mas, os moradores da nova ‘metrópole’, como classificou reportagem do CORREIO na época, não andavam lá muito satisfeitos. É que não bastava o luxo: na prática, o glamour do bairro, cujo nome, em tupi-guarani, significa ‘canoa de pedra ou de metal’, perdia para a falta de infraestrutura.

Altamente residencial, o bairro perdia em serviços. E os moradores menos afeitos aos encantos do consumo e do luxo se queixavam que faltavam padarias, bares, iluminação e até transporte. “Quem não tiver carro fica ilhado”, se queixava um paulista residente do bairro, Christoph Deringuer. Ele morava exatamente no limite entre o novo Itaigara e a Pituba, no condomínio Lake Jackson que, para alguns, era parte da Nossa Senhora da Luz.“Este é, por sinal, ponto e discórdia entre muitos moradores. Ninguém sabe precisamente onde começa e onde termina o bairro do Itaigara. Há ruas, como a Avenida Paulo VI, que se inicia na Pituba e se estende pelas imediações do Itaigara, servindo até de limite entre outros loteamentos. Por isso mesmo, muita coisa que o Itaigara não tem, se considera tendo, como acontece com o único bar de calçada, com mesas sobre a rua, o S.O.S Comidas Caseiras, do Seo Raimundo, na Rua das Rosas, ainda Pituba”, dizia a reportagem do CORREIO publicada no dia 2 de setembro de 1989.Agora, você, soteropolitano, que conhece a variedade de serviços – e bares! – do Itaigara, consegue imaginar aquele lugar com um único bar? Pois, era assim. E havia quem ainda se queixasse de que aquele estabelecimento com cadeiras na calçada não combinava em nada com o luxo e sofisticação do novo bairro. Vai ver, era justamente disso que os moradores mais queixosos sentiam falta. Disso e das padarias.

O hábito antigo de comprar pão fresquinho na padaria da esquina, dizia o CORREIO, ficava na saudade. Porque o Itaigara não tinha tantas padarias quanto a Pituba e as poucas eram “mal localizadas e não funcionavam aos domingos”.

Naquele ano, o bairro ainda não tinha uma das mais conhecidas delicatessens que, mais tarde, se estabeleceriam nas redondezas. A Pão&Mais, que encerrou as atividades na semana passada na Rua Guilhard Muniz, foi criada em 1999 e tinha de tudo que o luxo do bairro exigia, além de pão quentinho: bolos, salgados, pizzas, doces, produtos saudáveis e funcionais.

Interesse imobiliário Se o bairro não tinha lá muitos serviços, o interesse imobiliário era grande, principalmente pela proximidade com o mar e com a Avenida Octávio Mangabeira, recém-construída.“Foi inaugurado o Shopping Itaigara em 1980 e na mesma década construídos o Pituba Parque Center e o Max Center, já sinalizando o interesse imobiliário no entorno. Interessante frisar que a inauguração de outras vias, como a Juracy Magalhães em 1978, e o loteamentos com centenas de casa nos anos seguintes, ajudaram no adensamento populacional dos bairros”, explica o historiador Rafael Dantas, que estuda a iconografia de Salvador e as transformações da cidade nos séculos XIX e XX.Em 2010, data do último Censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Itaigara tinha uma população de 10,8 mil habitantes. Segundo dados do livro O Caminho das Águas em Salvador, lançado em 2010, mais de 53% dos chefes de família que moravam no bairro tinham uma renda de mais de 20 salários mínimos e mais de 15 anos de escolarização.