Mais da metade dos casos de covid-19 na Bahia são entre pessoas de até 39 anos

Casos entre pessoas de 20 e 29 anos não param de crescer e já representam 17,88% dos infectados no estado

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  • Daniel Aloísio

Publicado em 19 de fevereiro de 2021 às 05:15

- Atualizado há um ano

. Crédito: Divulgação

A pandemia de covid-19 tem avançado cada vez mais, na Bahia, sobre a população com até 39 anos de idade. São cerca de 340 mil pessoas nessa faixa etária que contraíram o novo coronavírus, em todo o  estado, o que equivale a 53% das contaminações notificadas pela Secretaria da Saúde da Bahia (Sesab). Em maio passado,  este índice era de 43%.    Os que possuem idade entre 30 e 39 anos foram os mais acometidos pelo vírus. São 155 mil infecções, o que equivale a 24,18% de todas as contaminações. Isso acontece mesmo com o fato de as pessoas dessa idade só corresponderem a 15% da população do estado, segundo o censo de 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Proporcionalmente, a incidência é de 6,7 mil casos para cada 100 mil baianos.  

Já as pessoas entre 20 e 29 anos representam, atualmente, 17,88% dos casos no estado. Esse índice não para de crescer desde maio, quando era apenas 12,16%, o que demonstra o crescimento na contaminação entre jovens.  

Para a médica infectologista Jacy Andrade, professora da Universidade Federal da Bahia (Ufba), os dados mostram que a população com esse perfil etário está mais exposta ao vírus e se cuidando menos. “A gente está vivendo um momento crítico de falta de consciência do que é importante. Os cuidados de prevenção são importantes, mas estamos assistindo muita gente jovem saindo para festas, aglomerando, com um comportamento perigoso”, diz.   Doença  Mesmo só saindo de sua casa no Cosme de Farias para o trabalho, em uma farmácia da cidade, Juliana Costa da Silva, 33 anos, foi em junho uma das infectadas pela covid-19 na Bahia. “Eu não estava saindo justamente por causa desse vírus. Não faço ideia como posso ter pego”, afirma. Para lidar com a doença, ela decidiu passar o período de isolamento na sua casa da Ilha de Itaparica.  

“Fiz o teste rápido no mutirão que a prefeitura fez no final de linha do meu bairro. Tive febre e perdi o olfato e paladar. Até hoje não recuperei completamente o paladar. Escolhi ficar na Ilha, pois lá eu estaria mais isolada, longe dos pais e do meu irmão, que são grupo de risco”, conta a jovem, que garante não participar de aglomerações. “Deus me livre, não quero ser reinfectada. Meu lazer é em casa mesmo”, completa.   

Já o doutorando em engenharia aeronáutica Mateus Mota, 30 anos, descobriu que esteve com covid-19 em dezembro de 2020. “Eu fiz o exame, que apontou que eu já tive o vírus. Porém, antes desse teste eu já tinha ficado em isolamento em casa, pois outras pessoas da minha casa tiveram a doença. Fui assintomático”, explica o rapaz, que continua trabalhando em home office e focado em atividades virtuais nessa fase. “Quando tem que sair para rua, não deixo de botar a máscara e manter distância das pessoas”, diz.  

Cuidados  Ainda para a infectologista Jacy Andrade, por mais que nem todos as pessoas dessa faixa etária e os mais jovens façam aglomeração, os casos de falta de cuidado com as medidas de segurança é um fator que contribui para o espalhamento geral do vírus. No final, todos acabam pagando o preço e com o risco de ficar doente.  “Não há uma vigilância genômica muito bem estruturada na Bahia, mas a gente sabe que tem variantes do vírus no estado e com capacidade de transmissão maior. Isso certamente está ajudando em tanta contaminação. É possível também que essas variantes tenha uma gravidade maior em jovens, algo que está sendo estudado”, disse.  Em entrevista ao CORREIO, Miguel Nicolelis, neurocientista e coordenador do comitê científico do consórcio Nordeste, disse que está sendo observado no país que a distribuição de casos migrou para os mais jovens. “Estamos vendo crescimento de complicações graves em crianças, por exemplo. Isso muda a dinâmica da pandemia no Brasil. As festas clandestinas ocorreram, principalmente com jovens, o que aumenta o risco de eles serem infectados”, argumenta. 

Não há um levantamento nacional dividido por faixa etária da quantidade de pessoas com covid-19 em todo o Brasil. Mas em outros estados, essa taxa de casos em pessoas de até 39 anos é próxima aos 53% da Bahia. No Distrito Federal, por exemplo, é de 51%, enquanto São Paulo tem 47%. Nesse último estado, o número de jovens entre 10 e 29 anos contaminados pela covid-19 explodiu nos 12 primeiros dias de janeiro, o que levou o próprio governo a emitir um alerta, lembrou Nicolelis. (Clique aqui e confira a entrevista completa com o cientista) 

Salvador  A capital baiana também apresenta índice de contaminação entre jovens similar ao que foi observado no estado. No total, são cerca de 65 mil pessoas de até 39 anos infectadas pela doença, o que representa 47% do total: 139 mil casos. A maioria dos casos registrados na cidade também são entre as pessoas que tem 30 e 39 anos. São 34 mil casos, o que representa 24% do total de infectados.  

Para ambos os cientistas, o toque de recolher das 22h às 5h, determinado pelo Governo do Estado e que começa a valer a partir dessa sexta-feira (19), não é uma medida que vai resolver esse problema. Nicolelis chega a classificar a medida como paliativa. “Onde o toque de recolher foi testado, provou não ser eficaz. Na Europa todos os lugares tiveram que evoluir para um lockdown logo depois. Isso é uma questão de dias. Essas medidas paliativas não tem efeito”, defende. 

Menos crítica, a professora Jacy Andrade lembra que o toque de recolher pode servir para tentar diminuir as aglomerações, mas outras medidas devem ser necessárias. “Não é só em estabelecimentos que as pessoas aglomeram. A rigor, a gente deveria ter um conceito de cidadania nas pessoas a ponto de não precisar de uma medida dessa. Mas o lockdown geral é uma possibilidade. Não é o ideal para a economia, mas é o necessário para as pessoas contribuírem com o bem comum. Se todo mundo aderisse as medidas preventivas, não fizesse festas clandestinas, teríamos números bem menores”, diz.  

Em nota, a Sesab explicou que o toque de recolher não é o método de controle primário do vírus, mas sim uma medida que visa sinalizar e avisar à população que é preciso sair de casa apenas para atividades essenciais e, assim, reduzir a transmissão de casos. “Buscamos uma situação sustentável em que tenhamos controle adequado deste vírus sem suspender inteiramente as atividades. Cabe esclarecer que as medidas mais eficientes e já conhecidas, que é o uso de máscara, distanciamento social e higiene frequente das mãos, precisam ser tomadas por todos até que grande parte da população esteja vacinada. Além disso, é preciso união de toda a sociedade para evitar que haja um colapso da rede assistencial. A irresponsabilidade de alguns afeta muitos, sobretudo, os mais idosos. É necessário cuidar de si e dos outros”, escreveram. 

* Com orientação da chefe de reportagem Perla Ribeiro.