Marcio Luis Ferreira Nascimento: Lendo a natureza, tateando átomos

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  • Marcio L. F. Nascimento

Publicado em 6 de junho de 2016 às 10:36

- Atualizado há um ano

A ideia era muito simples: criar um objeto bem pontiagudo, um tipo de alfinete muito afiado, com ponta tão fina, tão fina, que seria possível contar os poucos átomos em sua extremidade – e com esta sonda especial, fazê-la mover por uma superfície qualquer, literalmente tateando átomos.Este foi o trabalho original escrito há 35 anos pelos físicos Gerd Binnig (n. 1947, alemão) e Heinrich Rohrer (1933 - 2013, suíço), ao trabalharem no Laboratório de Pesquisa da IBM de Zurique em Rüschlikon, Suíça, intitulado “Scanning Tunneling Microscopy” (STM, que pode ser traduzido por “Microscopia de Tunelamento com Varredura”), publicado na Helvetica Physica Acta 55 (1982) 726-735. Tal trabalho foi decisivo na escolha do Prêmio Nobel de Física de 1986, dividido entre Binnig, Rohrer e o idealizador do primeiro microscópio eletrônico, o físico alemão Ernst August Friedrich Ruska (1906 - 1988).Tal artigo cientifico passou a ser a base dos estudos da hoje reconhecida e celebrada área da nanotecnologia – produzindo belas imagens atômicas, além da possibilidade da manipulação direta de átomos. Permitiu inclusive a aplicação de uma técnica especial denominada espectroscopia de tunelamento, um fenômeno quântico bastante curioso, que somente ocorre em diminutas porções de espaço. É este fenômeno que permite a varredura da sonda sem que esta toque a superfície dos átomos, mas ainda assim registrando a rugosidade em escala atômica.

Isto ocorre a partir da medição da corrente de elétrons que migra entre a diminuta (e nanométrica) distância entre sonda e a superfície analisada (ambas condutoras). Os elétrons conseguem assim ultrapassar uma barreira no espaço entre sonda e superfície – algo não esperado pelo senso comum, pois é preciso considerar que um objeto como um elétron às vezes se comporte como uma onda, passando de um material a outro tendo um impedimento (lacuna) entre eles.Basicamente, o STM é um instrumento que permite obter contornos de átomos e moléculas ao nível atômico. Em linhas gerais, o equipamento consegue distinguir dimensões da ordem de 0,1 nanômetro – que é o equivalente ao diâmetro do átomo de hélio. Nano provem do grego, e significa anão. Em outras palavras, um nanômetro corresponde a um milionésimo do milímetro ou um bilionésimo do metro.

Isto representa algo muito, muito pequeno. Para se ter uma ideia, imagine uma praia começando em Salvador, na Bahia, e indo até Natal, no Rio Grande do Norte. Pegue um grão de areia nesta praia. Pois bem: as dimensões desse grão de areia estão para a distância entre as praias como o nanômetro está para o metro.Um STM é um instrumento que pode ser usado não apenas em ultra-alto vácuo, como também no ar, na água e vários outros líquidos ou mesmo diferentes ambientes gasosos. Pode ser ainda utilizado sob condições de baixas ou altas temperaturas, variando portanto do zero absoluto até algumas centenas de graus Celsius, servindo por exemplo para manipular qualquer DNA. Numa comparação simplista, a técnica se assemelha à leitura em Braille que os dedos fazem ao percorrer uma superfície rugosa.A nanotecnologia já é uma realidade, aventada pelo físico norte-americano Richard Phillips Feynman (1918 - 1988), vencedor do Prêmio Nobel de Física em 1963, numa célebre palestra no California Institute of Technology (www.caltech.edu) em 29 de dezembro de 1959. Ela esta aí para auxiliar na leitura da natureza e na compreensão do mundo: do que somos feitos e do que iremos descobrir e fazer, estendendo ao menos um dos cinco sentidos – o tato – até a escala atômica!Professor da Escola Politécnica, Departamento de Engenharia Química e do Instituto de Humanidades, Artes e Ciências da UFBA