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Da Redação
Publicado em 3 de maio de 2017 às 07:04
- Atualizado há 2 anos
O Ministério da Educação (MEC) determinou a abertura de sindicância para apurar suspeita de fraude na seleção de uma instituição privada para oferecer curso de Medicina na Bahia, por meio do Programa Mais Médicos, durante o governo de Dilma Rousseff. A decisão foi tomada pelo ministro Mendonça Filho, após o jornal O Estado de S. Paulo questionar a pasta sobre possível troca de pareceres na concorrência para Guanambi, a 800 quilômetros de Salvador. >
A substituição, denunciada à reportagem por uma fonte que trabalha no MEC, teria alterado a classificação das participantes, beneficiando uma entidade do ex-ministro do Turismo Walfrido Mares Guia. A estimativa é de que, em pleno funcionamento, um curso desses renda ao menos R$ 26 milhões/ano. >
O governo Dilma lançou em dezembro de 2014 chamamento público com vistas a escolher instituições de ensino superior para instalar novos cursos de Medicina em municípios pré-selecionados. O objetivo anunciado foi o de reduzir a carência de profissionais no País em médio prazo. O edital chegou a ser alterado, com inversão de fases de avaliação, além da inclusão de novos critérios de análise, mesmo após o início do processo, o que causou polêmica e levou o Tribunal de Contas da União (TCU) a paralisar a seleção por nove meses, entre outubro de 2015 e julho de 2016. >
A classificação final, que envolveu a análise das condições apresentadas pelas instituições em três etapas, foi divulgada pelo MEC em 10 de julho de 2015. Naquela data, foi anunciada como primeira colocada para montar o curso em Guanambi a Sociedade Padrão de Educação Superior, mantenedora das Faculdades Integradas Pitágoras de Montes Claros (FIPMoc), com sede na cidade do Norte de Minas. A entidade tem como um dos sócios a Samos Participações, de Walfrido. >
Oficial O resultado oficialmente anunciado mostrou que o Centro de Educação Superior de Guanambi - entidade controlada por empresários baianos, mantenedora da Faculdade de Guanambi - havia sido desclassificado por não cumprir critérios de capacidade econômico-financeira e de regularidade jurídica e fiscal. A avaliação consta de parecer da Coordenadoria-Geral de Processos de Chamamento Público, órgão integrante da Diretoria de Regulação da Educação Superior do MEC. >
A análise desses aspectos foi feita com base em metodologia da FGV Projetos. O Estado obteve um outro parecer, supostamente produzido pelo mesmo setor, que coloca a mesma instituição em primeiro lugar. O informante, que conversou com a reportagem sob a condição de anonimato, afirmou que até 9 de julho de 2015, véspera do anúncio da classificação, o Centro de Educação Superior de Guanambi constava do processo aberto internamente pelo MEC como a primeiro colocado, com 23,1 pontos somados em três fases de avaliação, ante 16,6 da Sociedade Padrão de Educação Superior, descrita como segunda colocada. >
Contudo, explicou o informante, naquela data o parecer que embasava essa classificação foi substituído pelo que sustentou o resultado divulgado pelo MEC. Oficialmente, acrescentou, só esse documento foi incluído no sistema eletrônico do ministério. A fonte não indicou quem teria sido o responsável pela suposta troca. >
Vencedora conclui sede; perdedora abriu curso com liminarO jornal O Estado de S. Paulo questionou o Ministério da Educação sobre o caso e enviou os dois pareceres divergentes. Em nota, a pasta alegou que Mendonça Filho tomou conhecimento do assunto “apenas com a informação” apresentada pela reportagem, “uma vez que se trata de processo iniciado e concluído no governo Dilma”. “O assunto foi entregue à Consultoria Jurídica do ministério para abertura de sindicância”, informou o MEC, acrescentando que os resultados serão enviados à Controladoria-Geral da União (CGU). >
Em Guanambi, a entidade que venceu o processo de seleção está construindo sede própria. Aguarda a conclusão da primeira etapa das obras, prevista para junho deste ano, e o cumprimento de algumas etapas burocráticas, previstas pelo MEC, para fazer seu vestibular e funcionar com o nome Faculdades Integradas Padrão. A concorrente desclassificada conseguiu montar seu curso de Medicina graças a uma liminar obtida na Justiça, mas ainda confia numa reviravolta no processo de seleção do Mais Médicos para conseguir autorização definitiva de funcionamento. >
RespostaA Sociedade Padrão de Educação Superior informou que seu conhecimento e participação no processo seletivo do Mais Médicos se deu pelas formas previstas no edital. “Fomos habilitados de acordo com os documentos apresentados e classificados em razão de nossa melhor proposta para a cidade de Guanambi, com as melhores contrapartidas que podíamos oferecer”, afirmou, em nota, a diretora executiva da entidade, Maria de Fátima Turano. >
A instituição alega ter sabido da classificação em primeiro lugar “no momento em que o fato se tornou público” e “desconhece a existência” de pareceres que divergem do resultado. Sustenta também que, durante o processo de seleção, “jamais solicitou” revisão de avaliações feitas pelo MEC. “Jamais tratamos dessa nem de qualquer outra questão similar com nenhum servidor ou autoridade do governo”, informou a diretora. “Como participantes do processo licitatório, temos interesse em conhecer o referido 'parecer' e outros fatos relacionados”, acrescentou.>
Também em nota, o diretor para Assuntos Jurídicos da FIPMoc, Élio Soares Ribeiro, afirmou que a habilitação se deu pelos exclusivos esforços da instituição, que tem interesse em demonstrar a “segurança” e “lisura” de seus atos. Ele disse que denúncias contra o resultado do processo têm sido recorrentes e são fonte dos “esperneios” da segunda colocada, por não ter tido êxito na seleção ao apresentar projeto sem “sustentação financeira”. >
“A autorização do curso da referida concorrente ainda está se sustentando mediante liminar judicial e quem corre algum risco é a própria concorrente”, acrescentou. A assessoria de Walfrido informou, em nota, que não é “dono”, mas “apenas sócio minoritário” da Sociedade Padrão de Educação Superior e “não participa da administração” da entidade. “Walfrido jamais realizou 'gestões' junto a autoridades governamentais para tratar de temas envolvendo a instituição.” >
A FGV Projetos explicou que sua participação na seleção, “eminentemente técnica, cingiu-se ao desenvolvimento de metodologia” que permitisse ao MEC “a análise da capacidade econômica/financeira das proponentes”. >