Medo e incerteza: como o Bolsa Família acabou sem que a maioria dos beneficiários soubesse

Depois de 18 anos, programa foi extinto em outubro; em seu lugar, virá o novo Auxílio Brasil

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  • Thais Borges

Publicado em 13 de novembro de 2021 às 05:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Paula Fróes/CORREIO

Aos 18 anos, o filho de uma família beneficiária do Bolsa Família deixa de fazer parte do programa. Era a idade limite. Pode não ter sido planejado, mas foi com esse mesmo número de anos, quando atingiu a maioridade, que o Bolsa Família foi extinto, no final de outubro, em meio à pior inflação dos últimos 20 anos e ao desemprego recorde no país. 

Em seu lugar, o governo federal promete implementar outro programa a partir da próxima quarta-feira (17) - o Auxílio Brasil, que deve chegar a pagar R$ 400 por família, enquanto os valores do Bolsa Família iam de R$ 89 a R$ 178. Mas a sensação que ficou para muitos beneficiários foi a de um funeral sem velório. Para alguns, é quase uma situação em que os parentes só ficam sabendo o que aconteceu com o morto depois do enterro. Por isso, nem a chegada do novo auxílio tem amenizado a apreensão de parte das famílias, diante da mudança. 

Leia o relato: 'A gente precisa, sim, do Bolsa Família, mas não precisa só dele'“Estou com medo porque, sem o Bolsa Família, que é uma renda fixa, como é que a gente fica? A gente precisa ter uma coisa segura, porque é um recurso de emergência. A gente está correndo na rua para trabalhar, mas se for um caso de doença, como eu e meus filhos estamos agora? De onde vou tirar esse recurso, ainda mais que está tudo caro? Medicamento caro, comida cara, gás caro”, desabafa a dona de casa Tamires Rosado, 28 anos, que vive no bairro de Rio Sena com um adolescente de 13 e uma menina de 9. Há cerca de duas semanas, os três têm sintomas de gripe. Pela pandemia da covid-19, não podem sair.Só na Bahia, 1,8 milhão de famílias recebiam o auxílio em outubro passado. Quando o benefício começou a ser concedido, há 18 anos, eram 519 mil. Era o estado com o maior número de beneficiários do país. No Brasil, eram pouco mais de 3,6 milhões em janeiro de 2004, chegando a 14,6 milhões agora. 

A preocupação de Tamires é como a de tantas outras famílias que vivem a desigualdade social acentuada pela pandemia. Diariamente, a Central Única das Favelas (Cufa) Bahia tem atendido pessoas que ainda não sabem que o Bolsa Família acabou, segundo o presidente da entidade, Márcio Lima. "As pessoas não esperavam que isso acontecesse. Elas ainda estão esperando o Bolsa Família. A maioria não tem noção de como essa mudança vai impactar diretamente na vida delas", diz Lima. 

Pouco antes de conversar com a reportagem, ele havia visitado duas casas. Numa delas, a mãe recebia R$ 89 do benefício e essa era sua única fonte de renda. Para cozinhar, usava álcool e tinha sofrido uma queimadura nos últimos dias. O botijão de gás, que está custando, em média R$ 95, segundo a Agência Nacional de Petróleo (ANP), na Bahia, ficou inviável. "O Bolsa Família não é um valor significativo, mas é algo que a pessoa podia contar mensalmente. Ela faz planos em cima daquele recurso, porque era algo que podia administrar. Pode parecer pouco, mas para quem não tem nada, representava a esperança de que pode contar com aquele recurso no mês que vem", explica. 

Renda certa Era o caso da auxiliar de cozinha Maira Ferreira, 32, que vive com três filhas (uma de 16 anos, uma de 10, outra de 3) na Lagoa da Paixão, em Valéria. Desde que ficou desempregada, há quatro anos, não consegue um trabalho fixo. O aluguel de R$ 200 da casa onde mora, na Lagoa da Paixão, é pago pela mãe dela. 

Antes da pandemia, Maira recebia R$ 212 do benefício. Até o mês passado, porém, recebeu o auxílio emergencial de R$ 375. Mas a inflação nos últimos meses tem feito o valor ficar ainda mais defasado. "Tudo está muito caro, então, mesmo que seja um valor a mais, acaba sendo menor. O gás está R$ 110 por aqui", desabafa.  Maira completava a renda vendendo lingerie, mas as vendas andam devagar na pandemia (Foto: Paula Fróes/CORREIO) Em casa, o Bolsa Família era destinado, principalmente, à alimentação das filhas. Servia para comprar uma merenda, mas também era usado para comprar gás. O resto das despesas vinham com ajuda da mãe e com a venda de lingerie pelo bairro. Por mês, Maira chegava a vender cerca de R$ 200 de mercadorias de lingerie."Não existe dizer que alguém passa a vida com o Bolsa Família. Ajuda, porque é a certeza que vai ter aquele dinheiro, mas não passa o mês todo", reforça.   Já a dona de casa Ana Carla Bispo, 32, mora com a filha de seis anos em Paripe. Quando a menina nasceu, ela recebeu o benefício por um ano. Depois, conseguiu um emprego como atendente de telemarketing e saiu do programa. Há quase três anos, porém, voltou a receber depois de ficar desempregada.  "Só tenho Bolsa Família e ajuda de parente, porque está difícil achar emprego na pandemia. Eu já vendi perfume, das revistas da Natura, do Boticário. Mas nesse momento, a renda das pessoas é pouca, ninguém tem como ficar comprando isso", lamenta. 

A reação dela, ao saber do fim do programa, foi a mesma de outras mulheres, que são prioritariamente designadas como as responsáveis pelo benefício. "Quando soube, foi aquela coisa, aquela tristeza. É tão incerto que não tenho nem certeza se vou receber. Se estão desde o começo do ano falando que queriam acabar, que se planejassem. Mas chega em cima da hora, fazem isso, o povo fica como? É um governo de surpresas, só que as surpresas nunca são muito boas para nós que somos de classe mais baixa", diz. 

Ana Carla se acostumou às escolhas no mercado. Se decidir levar dois quilos de arroz, sabe que não vai conseguir nenhuma proteína. Feijão com carne virou luxo em casa. Por isso, ela diz nem ter certeza dos valores que virão. "Sei que muitas mães também se perguntam: será que estou na lista? Será que vou receber? Será que vou passar meu cartão e vou receber alguma coisa? Não é ficar às custas do governo, é porque é o único benefício que a gente tem. Até para procurar um emprego, você precisa pegar um transporte, imprimir um currículo. Isso tem custo". Criação O Bolsa Família foi criado em 2003, no primeiro governo do presidente Lula. A ideia era unificar, como um programa de transferência de renda, auxílios que foram criados pelo seu antecessor, o presidente Fernando Henrique Cardoso, a exemplo do Bolsa-escola e do Auxílio-Gás, e o Fome Zero, também de 2003. 

Na época, o então novo programa foi coordenado pela pesquisadora Ana Maria Fonseca, do Núcleo de Estudos de Políticas Públicas da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), que morreu em 2018. Há quem diga que houve inspiração de programas internacionais, como o Progresa, do México (hoje chamado Oportunidades), mas o Bolsa Família foi formatado especialmente a partir de experiências locais de cidades do interior de São Paulo, a exemplo de Campinas e Ribeirão Preto, como explica a pesquisadora Natália Sátyro, doutora em Ciência Política e professora do programa de pós-graduação em Ciência Política da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). "Houve um momento em que vários municípios no próprio Brasil fizeram iniciativas, cada uma com um nome. Em 2001, veio FHC com o Auxílio Gás, o Bolsa Escola, e, quando Lula entra, ele unifica, porque tinha famílias recebendo vários benefícios e a maior parte não recebia nada. Esse conjunto de pedaços é transformado em um só e ganha escala real, a partir da própria experiência que a gente já tinha no Brasil", afirma.Segundo ela, o Bolsa Família foi considerado bem-sucedido porque tem várias características. Além de ser bem focalizado - é destinado às camadas mais pobres -, tem uma cobertura muito ampla. Ao mesmo tempo, o programa se tornou eficiente porque conseguia fazer isso apenas com o investimento de cerca de 0,5% do Produto Interno Bruto (PIB) do país. "Claro que para fazer milagre em termos de desigualdade de renda, tem que fazer reforma tributária e ter crescimento econômico, emprego formal. Mas isso não é tão elementar", pondera. 

Para a professora, a estrutura do programa fez acabar com o clientelismo que acontecia quando prefeitos e vereadores pelo Brasil prometiam benefícios aos eleitores. Não era possível prometer inclusão no Bolsa Família porque existia uma espécie de ranking nacional entre as famílias que mais precisam. Isso é possível porque, assim como existe o Sistema Único de Saúde (SUS), há também o Sistema Único de Assistência Social (Suas). "A pobreza é um fenômeno multidimensional. As pessoas que têm problema de renda vão ter uma série de outros problemas". 

Transferência Os programas de transferência de renda são comuns até mesmo em países desenvolvidos, como grandes economias como a França e a Alemanha. A França é um dos países que mais investe em programas de transferência de renda, que incluem auxílio aluguel, gás e até ajuda para comprar material escolar. 

Já na Alemanha, há uma bolsa chamada Kindergeld que vale para qualquer família com filhos menores de 18 anos, independente da condição econômica ou de a criança ter nascido ou não no país. Atualmente, o valor é de 219 euros para cada um dos primeiro e do segundo filhos, passando a 225 euros no terceiro filho e 250 euros para cada filho adicional.  Mesmo depois que os filhos completam 18 anos, é possível estender o benefício até os 25, se a pessoa ainda estiver estudando. 

Só que, no Brasil, por muito tempo, o Bolsa Família foi alvo do que a professora Natália Sátyro chama de 'julgamento moral'. Havia desde quem dissesse que pessoas queriam passar a vida inteira sendo sustentadas pelo governo quanto quem parecia acreditar que mulheres tinham mais filhos para ganhar mais R$ 41 no programa. "Ninguém fala por aí que o desconto no Imposto de Renda faz com que as pessoas tenham mais filhos por isso. Então, não faz sentido achar que a pessoa, por estar na pobreza, não tem capacidade de raciocínio de entender que aquele benefício não justifica ter mais filhos. A classe média tem um julgamento equivocado em relação à transferência de renda, mas não consegue ver a transferência de renda que está vindo para ela", critica a professora. Para o economista Isaías Matos, professor da Rede UniFTC, o Bolsa Família era a principal política de renda no Brasil, ao lado da manutenção do salário mínimo. Esse tipo de política tem impacto na economia, especialmente na dos pequenos municípios. O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) identificou que, a cada R$ 1 transferido aos beneficiários do programa,  o Produto Interno Bruto (PIB) municipal ganhava um acréscimo de R$ 1,78.

"Ele é o garantidor da renda local. É um impacto não só para quem recebe, mas para toda a movimentação e circulação do dinheiro. Se você pega os pequenos municípios, vai ver que eles vivem do dinheiro do Bolsa Família, de funcionários públicos e aposentados", explica o economista. 

Programas de transferência de renda acabam garantindo que as camadas mais pobres tenham poder de compra. "As pessoas em situação de pobreza e extrema pobreza não têm como poupar, é óbvio. Então, 100% dos valores destinados ao Bolsa Família vão para o comércio. Quando entra, a padaria vende mais, o mercadinho vende mais, o açougue vende mais", acrescenta. 

Migração imediata  O governo federal promete uma migração imediata e automática dos beneficiários do Bolsa Família para o Auxílio Brasil. No entanto, boa parte das famílias ainda não sabe disso. Assim, nas últimas semanas, filas diárias têm sido registradas nos locais onde é possível fazer o CadÚnico, cadastro universal que permite a inclusão nos programas sociais do governo federal. 

Em Salvador, a Secretaria Municipal de Promoção Social, Combate à Pobreza, Esportes e Lazer (Sempre), que era responsável pela gestão local do Bolsa Família, tem repetido que não é necessário que os beneficiários ativos vão até os postos, mas não tem sido suficiente.  Nos últimos filas, tem havido fila e tumultos nos postos do CadÚnico, em Salvador (Foto: Marina Silva/CORREIO) O problema maior, para especialistas, é o momento dessa mudança. Para a pesquisadora Dandara Ramos, doutora em Saúde Pública e professora do Instituto de Saúde Coletiva (ISC) da Universidade Federal da Bahia (Ufba), esse período específico - considerando as crises política, econômica e sanitária - não é ideal para uma ruptura tão brusca nas políticas sociais. 

“A gente sempre fica pensando quais foram as evidências usadas para justificar a extinção (do Bolsa Família). Ainda que tivessem, essa mudança teria que ter sido feita por um processo de transição muito mais suave do que está sendo feito agora, que aumentou o empobrecimento das famílias e a insegurança alimentar”, diz. Este ano, diferentes índices apontam que a insegurança alimentar tem crescido no Brasil. O principal indicador é que o Brasil voltou ao Mapa da Fome da Organização das Nações Unidas, de onde havia saído em 2013.  

Na avaliação de Dandara, que é autora de um estudo publicado em setembro sobre o impacto do Bolsa Família na redução da mortalidade infantil no Brasil, não era hora de “arriscar” com os programas sociais.“Se havia um momento de fazer isso, não era 2021. Esse era o momento de fazer a manutenção do programa existente, uma transição lenta e parcimoniosa. Não é da forma como está sendo feito, que está gerando filas imensas nos Cras (Centro de Referência da Assistência Social). A estrutura do CadÚnico está muito precarizada, sem estrutura suficiente para dar conta de novos cadastros. Criou-se uma crise desnecessária na assistência social, que era totalmente evitável”, reforça. Ao longo desses 18 anos, os números do Bolsa Família acompanharam os indicadores da saúde justamente por algumas obrigações para que os beneficiários continuassem no programa. Entre elas, estão as necessidades de manter a carteira de vacinação das crianças em dia, assim como que elas continuem frequentando a escola. Trabalhar a atenção social com a saúde e educação pode ter sido o trunfo para que o programa tenha sido considerado o maior do mundo, além de um dos mais avaliados pela comunidade científica internacional. 

Outra pesquisa do ISC, publicada no ano passado, mostrou a relação entre o programa e a queda dos casos de tuberculose no Brasil. “Nós temos um sistema de saúde muito capilar, que consegue alcançar as famílias. Isso não é a realidade em outros países. O programa faz esse exercício de quebra do ciclo da pobreza ao mesmo tempo que aumenta a escolarização das crianças", diz Dandara. 

PEC dos Precatórios  O Auxílio Brasil ainda não tem financiamento garantido. O programa promete atender o mesmo público do Bolsa Família e ir além. Em outubro, o total de famílias atendidas foi de 14,6 milhões, mas o governo federal diz que pretende chegar a 17 milhões em dezembro. De fato, existe uma demanda reprimida já conhecida pelos gestores locais. Essa ampliação conseguiria zerar a demanda e alcançar 50 milhões de pessoas, de acordo com o Ministério da Cidadania. 

Só em Salvador, há 35 mil pessoas listadas no CadÚnico que estão ‘na fila’, por se encaixarem nos critérios, além dos 188 mil beneficiários que já estavam ativos no Bolsa Família. O prazo para que esse outro grupo seja incluído seria um mês após o início do programa. Tem, ainda, pessoas que sequer estão cadastradas mas que passaram a se encaixar nos critérios da política social na pandemia. Só que, hoje, não há nem mesmo estimativa de quantas pessoas estejam nesse grupo, segundo o titular da Sempre, Kiki Bispo. “A promessa é que a fila vai ser zerada, ou seja, que essas pessoas serão inseridas. Mas existem, sim, pessoas que nunca estiveram no cadastro, mas passam por dificuldades nesse momento de pandemia. O impacto econômico foi real. Muitas perderam sua renda e estão buscando entrar no CadÚnico”, diz o secretário. Haverá reajustes nos benefícios que já faziam parte do Bolsa Família, como o valor básico (passará de R$ 89 a R$ 100), parcelas variáveis (de R$ 41 para R$ 49) e o benefício vinculado ao adolescente (de R$ 48 para R$ 57). Além disso, deve existir um valor extra - de R$ 400 -, cujo financiamento se tornou um imbróglio. O desafio inicial era porque o governo corria o risco de furar o teto de gastos, aprovado em 2016. 

Por isso, a equipe econômica federal chegou à chamada Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 023/21, a PEC dos Precatórios, aprovada na Câmara dos Deputados na última terça-feira (9). A proposta também ficou conhecida como ‘PEC do Calote’, na avaliação de entidades como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB),  já que o objetivo é atrasar o pagamento de dívidas do Estado a cidadãos e empresas.

Se a PEC dos Precatórios não for aprovada no Senado e, posteriormente, a MP do Auxílio Brasil for derrubada pelo Congresso, Bispo acredita que não haverá risco de falta de pagamento. "Provavelmente o governo deve fazer o que fez nos dois meses passados, quando renovaram o auxílio emergencial. Acho que o governo federal deveria ter feito uma campanha publicitária em massa, sobretudo nesse momento da pandemia, para explicar a esse público vulnerável de todo o país que a migração será automática".  

De acordo com Bispo, as famílias atendidas devem ficar "tranquilas", justamente pela inclusão automática. A partir da próxima terça-feira (16), a Sempre pretende dobrar os postos de atendimento do CadÚnico, com o objetivo de descentralizar os serviços. 

"Acho que de governo em governo, é natural que essas nomenclaturas sejam modificadas. O que eu defendo é o fortalecimento do programa, tendo em vista que estamos passando por uma retração econômica. Espero que não seja uma medida eleitoreira e que venha, de fato, mitigar os efeitos sociais da pandemia", afirma. 

O cronograma proposto pelo governo federal para o Auxílio Brasil começa na próxima quarta-feira (17) e vai seguir o calendário do Bolsa Família. Neste mês de novembro, os beneficiários vão receber o valor original do programa anterior com o reajuste de 17,84% - ou seja, um total que pode ir até R$ 217,18. 

O valor extra - necessário para chegar aos R$ 400 - será pago em dezembro, se a PEC dos precatórios for aprovada. Segundo o Ministério da Cidadania, as famílias que estão na folha de pagamento de novembro vão receber o novo valor de forma retroativa. No entanto, ao contrário de outros programas de transferência de renda, o Auxílio Brasil tem previsão de um ano e deve, portanto, chegar ao fim em dezembro de 2022. O governo federal ainda tem debatido, nos últimos dias, se é possível torná-lo permanente após esse período. 

Problemas  O fim do Bolsa Família, assim como o encerramento do auxílio emergencial no mês passado, traz uma nova lógica para as políticas sociais no país. De fato, o Bolsa Família nunca foi perfeito. Ele estava, inclusive, defasado. Não recebia reajuste há três anos. 

Até mesmo o novo valor de R$ 400 já é algo que precisaria de implemento, mas, para o economista Isaías Matos, da Rede UniFTC, é o máximo que o governo pode pagar. 

"Só é possível gastar o que já está definido. Para aumentar o orçamento em determinado tipo de gasto, precisa reduzir de outro. Por que não dá mais? Por trás disso, tem que se analisar as contas públicas, porque deteriorar as contas pode ter efeitos econômicos e legais", explica. 

Segundo ele, é preciso trazer outros elementos que deram certo nos programas europeus, com o incentivo à reinserção das pessoas na economia. "Não estou falando de seguro desemprego, mas de uma assistência à população de baixa renda para se qualificar para se inserir no mercado de trabalho de forma concomitante", completa. 

Para a cientista política Natália Sátyro, professora da UFMG, seria preciso ter mais clareza nas informações sobre o novo programa. Por enquanto, a impressão é de que está se trocando o certo pelo duvidoso - inclusive, um programa permanente por algo temporário. 

"Estamos terminando um programa por um que a gente ainda nem sabe como vai funcionar direito. Ele começa sem dizer qual é a linha de corte e quais famílias estão dentro dos critérios. Eu arrisco dizer que é muito certo que as famílias vulneráveis vão ficar sem cobertura em algum momento", avalia.