Mercado informal de Salvador tem mais mulheres que homens

Veja como informais podem se regularizar e garantir aposentaria

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  • Eduardo Dias

Publicado em 7 de novembro de 2019 às 05:20

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto de Arisson Marinho

Depois de quatro anos como proprietária de uma loja de confecções na Barra, quando os filhos ainda eram pequenos, a agora aposentada Maria Leitão, 62 anos, moradora do bairro de Dom Avelar, mudou o segmento de trabalho e entrou para o grupo dos trabalhadores informais de Salvador, para complementar a renda da família. 

Ela não é a única. De acordo com a Síntese de Indicadores Sociais (SIS) 2019, divulgada ontem pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), com dados relativos a 2018, a taxa de informalidade no mercado de trabalho na capital baiana atingiu a marca de 40,3%. As mulheres representam 40% desse universo, 2,7% a mais que os homens (37,7%). 

Dona Maria faz parte dessa estatística há 27 anos, quando deixou de comandar a loja de confecções para se tornar vendedora em uma barraca de frutas e verduras, junto com os irmãos, no Itaigara.

Pensando em ter uma carga horária mais flexível, com tempo de sobra para se dedicar à saúde e aos filhos, ela, que deixou de pagar o aluguel da loja e gerir funcionários, agora atende, confere mercadorias e faz entregas das compras dos clientes nos condomínios da região. Maria Leitão fechou loja de confecções e agora vende frutas com os irmãos: "Mais tempo de fazer outras coisas" (Foto: Arisson Marinho/CORREIO) “Eu tinha funcionários, despesas com impostos, mas ainda assim dava para sobreviver. Mesmo assim, decidi vir trabalhar com meu irmão, ter mais tempo de fazer outras coisas, ir ao médico sempre que pudesse. O aluguel era caro, meus filhos eram pequenos na época, não dava mais para manter”, conta.

Perfil Segundo a supervisora de disseminação de informações do IBGE, Mariana Viveiros, os perfiis dos trabalhadores informais da Bahia e de Salvador são semelhantes aos encontrados no restante do país, com algumas ressalvas, pois os estados possuem características diferentes.

Ela acrescenta que os setores com os principais índices de informalidade tanto no país quanto no estado são as áreas domésticas, agropecuária, alimentação, alojamento e construção.

“No Brasil, os trabalhadores informais que não possuem tanta instrução, ou seja, não concluíram o segundo grau escolar, representam cerca de 60,8%. Já os que possuem nível superior completo representam 22,1%. Não dispomos de dados específicos para a Bahia, mas como no resto do país, esses são setores que tem os principais índices de informalidade”, pontua.

Domésticos e agro

Ainda segundo os dados da SIS 2019, na Bahia, a taxa de informalidade no mercado de trabalho é de 56,7%. Entre as áreas específicas, os trabalhadores de serviços domésticos representam 72,2% dos informais; enquanto na  agropecuária, são 66,9% de informais. Neicifran largou a Contabilidade para empreender vendendo hortifrutis: "Hoje eu ganho mais" (Foto: Arisson Marinho/CORREIO) Formado em Contabilidade, Neicifran Nascimento, 24, conseguiu um trabalho na área logo que conseguiu a graduação. No entanto, há dois anos ele foi demitido da empresa onde trabalhava e decidiu trabalhar por conta própria. Mas, ao contrário do que muita gente costuma fazer, ele não empreendeu na própria área de formação, montou uma barraca de hortifrutis no Vale das Pedrinhas, onde mora. Apesar de seguir na informalidade, Neicifran garante que consegue faturar mais do que quando tinha carteira assinada.

"Fui demitido e para não ficar parado, montei essa banca e decidi vender frutas aqui no bairro. Hoje eu ganho mais, dá para tirar um dinheiro bom e manter a casa e o funcionário que tenho aqui. Gostei de trabalhar dessa forma e não sei se quero voltar a trabalhar numa empresa novamente. Muitas das coisas que consegui conquistar hoje em dia, não era possível antes”, conta o comerciante, que trabalha de segunda a sábado no local.

Assim como Neicifran, a ex-auxiliar administrativa, Ivete dos Reis, 49, que trabalhou numa empresa durante cinco anos, desistiu de correr atrás de emprego e montou o próprio negócio em casa. Ela contou que, ao ser demitida, seguiu o conselho dos amigos e familiares que costumavam incentivá-la a expandir suas encomendas de abarás. Hoje, com sua única fonte de renda, afirma que já fatura mais e consegue sustentar a casa sozinha onde vive com a mãe.   

“Eu comecei há dois meses, já fazia abarás para os familiares e amigos. Devido ao desemprego, eu quis transformar isso num negócio, as pessoas me pediam. Recebo encomendas, entrego para festas, eventos e comemorações. Hoje sustento a casa sozinha, ajudo a minha mãe, estou ganhando mais do que quando eu era contratada. Penso em expandir meu negócio, aumentar ainda mais minhas encomendas”, afirma Ivete, que costuma receber cerca de 15 a 20 encomendas nos finais de semana.    Ivete faz abarás de encomenda desde que foi demitida: "Hoje sustento a casa sozinha" (Foto: Arisson Marinho/CORREIO) Especialista explica porque informais devem contribuir com a Previdência Social

Mesmo trabalhando no mercado informal, é preciso contribuir com a Previdência Social para garantir a aposentadoria. Ao CORREIO, a advogada, professora de direito previdenciário e doutoranda pela Ufba explica o que os trabalhadores informais podem fazer para garantir os benefícios da previdência social. Confira:

Como um trabalhador informal pode se programar para garantir uma aposentadoria?

A previdência é contributiva, se a pessoa trabalha ela deve contribuir. Naqueles casos em que a pessoa trabalha para uma pessoa jurídica - como um médico ou dentista para um plano - ou serviços gerais, os chamados autônomos, ou contribuintes individuais têm as contribuições descontadas e repassadas. Mesmo que ela esteja trabalhando eventualmente.

E quando o trabalhador exerce atividade não vinculado a uma empresa?

No caso daquelas pessoas que trabalham para outras pessoas físicas, a legislação dá a elas o dever de recolher 20% do total da remuneração alcançada no mês. O valor mínimo é de 20% do salário mínimo.

E quem não tem condições de recolher 20% do mínimo, o que deve fazer?

Para os trabalhadores que não têm condição de recolher 20% de um salário mínimo, existe a chamada alíquota diferenciada. É o chamado contribuinte individual de baixa renda. Essas pessoas recolhem 11% ou 5% de um salário. Com isso, o indivíduo garante o direito a benefícios básicos.

Como escolher essa porcentagem? 

Geralmente, a escolha acontece se a pessoa participa ou não de benefícios sociais, como vale gás ou bolsa família. Nos casos em que ela está cadastrada nesses programas, recolhe 5%.  Quem não tem cadastro, recolhe 11%.

Quais os direitos para quem recolhe nessa modalidade? 

Os benefícios básicos ficam garantidos: salário maternidade, aposentadoria por invalidez, aposentadoria por idade, pensão por morte e auxílio reclusão. Todas no valor de um salário mínimo.

Existe alguma diferença dessa contribuição para a de 20%?

Esse tempo não conta como tempo de contribuição para, por exemplo, levar para um concurso, ou para se aposentar por tempo de serviço. Para que passe a valer nesses casos é necessário que a pessoa realize o complemento do pagamento para atingir os 20% 

Essa previsão legal é, então, positiva para os trabalhadores informais?

A finalidade dessa regra é permitir que a pessoa que esteja temporariamente numa situação de precarização não perca a proteção básica. Mas, no cenário atual, com a crise, não há indícios que essa condição do trabalhador de baixa renda seja transitória. É preocupante.

Dicas do SEBRAE: MEI é caminho para sair da informalidade:Vantagens - O empreendedor que se formaliza tem inúmeras vantagens em relação à pessoa que trabalha na informalidade. O MEI (microempreendedor individual) tem acesso a previdência social e a crédito bancário; além de benefícios como: venda para outras empresas, emissão de notas fiscais, acesso ao alvará de funcionamento, direito a aposentadoria, salário-maternidade, auxílio-doença e oportunidade de vender para a administração pública.

CNPJ - Quando você é formalizado como MEI passa a ter um CNPJ, ou seja, tem facilidades com a abertura de conta bancária, pedido de empréstimos e emissão de notas fiscais; além de ter obrigações e direitos de pessoa jurídica.

Como formalizar? - Todo processo de formalização é feito pela internet, noPortal do Empreendedor (portaldoempreendedor.gov.br). O empreendedor deve verificar se a sua atividade pode ser MEI, pois, algumas não podem ser enquadradas nesta modalidade e é importante saber quais são elas antes de realizar a formalização.

Quais os limites? - O MEI deve trabalhar por conta própria, ou ter no máximo um funcionário, faturar até R$ 81.000,00 por ano e não ter participação em outra empresa como sócio ou titular.

Pode diversificar? - O MEI pode ter até 16 atividades diferentes cadastradas em seu CNPJ MEI, uma como atividade principal e outras 15 atividades secundárias. Para saber se a sua atividade pode ser enquadrada como MEI, acesse a lista completa no Portal do Empreendedor(http://www.portaldoempreendedor.gov.br/temas/quero-ser/formalize-se/atividades-permitidas).

Quais são as obrigações?  - O MEI deve realizar o pagamento mensal do boleto através do Documento de Arrecadação do Simples Nacional (DAS). No quesito nota fiscal, MEI não tem obrigação de emitir o documento quando vende ou presta serviço para pessoa física. No caso de fornecimento para pessoas jurídicas, é preciso emitir a nota de serviço ou de venda, de acordo com a atividade exercida. 

MEI se aposenta? - Ao formalizar o negócio, o empreendedor terá acesso ao benefício da aposentadoria por idade, desde que tenha atingido o tempo mínimo de contribuição exigido por lei, que é de 180 meses, a contar do primeiro pagamento em dia do DAS. O empreendedor formalizado também conta com cobertura de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez. Via de regra, o tempo mínimo de contribuição para usufruir desses benefícios é de 12 meses, já para o benefício do salário-maternidade são necessários 10 meses de contribuição, todos a contar do primeiro pagamento em dia.  *Com supervisão do chefe de reportagem Jorge Gauthier*