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Marcelo Gentil
Publicado em 12 de fevereiro de 2020 às 09:15
- Atualizado há 2 anos
Nos últimos anos, o termo compliance passou a figurar entre os mais presentes nas organizações brasileiras, sejam elas públicas ou privadas. É esperançoso ver que o país vem experimentando um movimento sem precedentes na luta contra a corrupção, esse fardo que nos atrasa e afasta do desenvolvimento sustentável. Apesar dos avanços experimentados – e também dos retrocessos, especialmente com o debacle provocado na engenharia nacional, um orgulho brasileiro – um fato me chama atenção: o superficial espaço ocupado pela comunicação na implantação e sustentação dos programas de compliance e integridade.>
A frase que mais se lê nos livros da área, geralmente títulos jurídicos, é que compliance é cultura. Verdade, mas não só. Compliance de fato é cultura e cultura é comunicação. Cultura, na prática, é aperfeiçoamento do ser humano, evolução. Comunicação e cultura, portanto, são recursos inseparáveis. Reduzir o papel da comunicação a algo complementar como “informar e treinar” é não compreender a revolução relacional que vivemos hoje, fortemente influenciada pela transformação digital. >
Tenho observado um certo movimento de “comoditização do compliance”, onde pacotes de implantação são vendidos em sites como se fossem produtos de prateleiras, minimizando a cultura empresarial e desprezando a importância do planejamento estratégico de comunicação. É a partir de um diagnóstico bem feito, isto é, de uma leitura minuciosa do micro e do macroambientes, que se definirá a amplitude do programa. Sem isso, ele será um mero faz de contas organizacional.>
Temo que o foco excessivo no instrumental em detrimento do comportamental, que é a experiência em si, acarrete práticas pouco exitosas em curto espaço de tempo, a exemplo do que vem acontecendo no negócio do futebol. Me parece inadequada, por exemplo, a afirmação que existe uma “comunicação de compliance”. Existe comunicação e comunicar é diferente de informar. A dimensão informativa é apenas uma pequena parte de um arcabouço multidimensional e multifacético que é a comunicação quando tratada de forma profissional. Compreendendo isso, empresas perceberão que é através da transformação mútua que avançaremos como sociedade, alterando a realidade dentro e fora do ambiente empresarial. Insisto: trata-se de uma questão de conceitos e não de ferramentas.>
É chegado o momento de alçar a ética ao posto que ela merece, sendo intolerante (a palavra não é boa, mas serve para o objetivo) com a corrupção, inclusive aquela considerada “leve” e que alimenta uma cultura social permissiva, que independe de classe social. É preciso mais higidez, ampliando o espectro dos programas de compliance dentro de uma perspectiva de transformação social efetiva, aliando o tema ao propósito das organizações. O desafio, portanto, é edificar uma cultura de integridade a partir da comunicação.>
A comunicação é o oxigênio que dá vida ao compliance dentro das organizações e ela precisa ser feita sem amadorismos. Em resumo: diga-me como é a sua comunicação e lhe direi como é o seu programa de compliance.>
Marcelo Gentil é relações-públicas pós-graduado em Marketing, professor universitário e ex-diretor do Capítulo Aberje Bahia.>