'Não sei pra onde vou', diz moradora de casa ameaçada no Alto da Sereia

Retirados de área de risco estão recorrendo a parentes e igreja para se abrigar

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  • Raquel Saraiva

Publicado em 10 de maio de 2018 às 04:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Almiro Lopes/CORREIO

Local onde ocorreu desmoronamento parcial de imóvel na segunda (Foto: Almiro Lopes/CORREIO) Os moradores das casas afetadas por um desabamento, na noite de segunda-feira (7), no Alto da Sereia, localidade do Rio Vermelho que fica praticamente debruçada sobre o mar, ainda não conseguiam dormir na tarde desta quarta-feira (9). A estudante Airá dos Santos, 28 anos, teve o imóvel onde morava com a mãe e os quatro filhos interditado.

“Tá todo mundo sofrendo sem saber o que vai acontecer”, contou ela, ainda abalada pelo susto. O imóvel onde a família sempre viveu e ao menos outras seis casas ao lado correm o risco de ser demolidos.

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Como Airá, a maioria dos moradores da comunidade vive lá desde a infância, em casas herdadas dos pais e avós. “A gente sabia que não era seguro, mas morava porque não tinha jeito”, afirmou ela, que está dormindo na casa da irmã - no total, dez pessoas estão dividindo uma casa de dois cômodos no Alto de Ondina, outra comunidade pobre no bairro vizinho. 

Dalila Antunes, 19, estava em casa quando parte do imóvel desabou. “Segunda eu fui mudar o hack de lugar e vi a rachadura. Sabia que rachadura com dois dedos de largura é sinal de perigo, aí pedi pra meu pai vir olhar”, conta ela.  Moradores retiram móveis de casas ameaçadas (Foto: Almiro Lopes/CORREIO) O pai de Dalila chegou ao local minutos depois do acontecido. “Eu vi que a rachadura tava estranha, o chão rachou… Ainda desci pra pegar o celular porque meu pai tava ligando, e subi a escada correndo quando tudo caiu. Perdemos tudo que tava na sala”, lembra a jovem, ainda tremendo e com ar de cansaço.

Embora sete imóveis estejam interditados, os moradores voltaram ao local do acidente ainda pela manhã para retirar os últimos pertences com a ajuda dos vizinhos. “Ainda tentei trabalhar [na terça], mas não consegui. A cena fica na cabeça, e eu tinha que ajudar o pessoal aqui que tava precisando”, diz o porteiro Wilson Nascimento, 56, que teve a casa interditada. O porteiro Wilson Nascimento teve a casa interditada (Foto: Almiro Lopes/CORREIO) Ele, a filha e a esposa, a diarista Rosa Cristina Ramos, 44, foram dormir em uma igreja.“O importante é que estamos bem. Numa situação dessa, normalmente, ninguém sobrevive. Minha fortaleza é saber que passamos por uma provação e sobrevivemos”,  comenta Wilson.A esposa chegou ao local às 7h para lavar as roupas na máquina que continua na casa. “Tava tudo cheio de lama. Depois vou levar a máquina, que não terminei de pagar ainda”, afirma Rosa. O casal se considera sortudo, principalmente diante da situação dos vizinhos que perderam muitos móveis e eletrodomésticos. A diarista Rosa Ramos, a filha e o marido estão dormindo numa igreja: destino incerto (Foto: Almiro Lopes/CORREIO) “Queria um mutirão pra ajudar quem mais precisa. Se eu te disser que tô precisando de algo, eu seria egoísta. Hoje só quero força e mais fé”, comenta Wilson, enquanto retira os últimos objetos da casa de um dos vizinhos.

Maria Lima, 42, perdeu móveis e eletrodomésticos no desabamento - e não sabe quando vai comprar. A comerciante é autônoma e não tem previsão de quando vai voltar a trabalhar, já que precisa cuidar da mãe de 71 anos e do filho. “Eu quero que minha mãe fique bem, a pressão dela tá alta”, lembra.  A autônoma Maria Lima perdeu móveis e eletrodomésticos em desmoronamento (Foto: Almiro Lopes/CORREIO) Filho de Maria, Hebert tem 25 anos e sofre de esquizofrenia. “Ele tentou voltar pra casa, não entende que não pode ir. Nem tem nada lá, desceu tudo”. Ela conta que tem chorado muito.“Vivi a vida toda aqui, agora não sei pra onde vou”. lamenta Maria. Demolição  Nesta quarta (9), a Defesa Civil de Salvador (Codesal) informou que fará uma inspeção mais detalhada na área onde um imóvel desabou na noite da última segunda (7). Sete imóveis permanecem evacuados e interditados, além da casa que desabou parcialmente. 

O objetivo é verificar a instabilidade da encosta, para saber quais imóveis serão demolidos e quais serão recuperados. A inspeção do local vem sendo realizada cotidianamente, desde o desabamento, de acordo com o diretor-geral da Codesal, Sosthenes Macedo.

Uma equipe de engenheiros e especialistas em geotecnia esteve no local nesta quarta para fazer avaliação da estrutura rochosa onde as casas estão instaladas.“O sobrepeso das casas, que foram avançando no local, além da intempérie, como o mar batendo ou como um spray na rocha e a maresia do local, vão desgastando a rocha no dia a dia e tudo contribuiu para que aquele cenário não desse certo”, disse Sosthenes.Ele ressalta que qualquer tipo de obra, inclusive reformas, deve ser previamente autorizada pela Secretaria Municipal de Desenvolvimento e Urbanismo (Sedur), para não gerar riscos para a própria casa e vizinhança.

“Tem que ter precaução para que não haja problema. E em caso de rachadura, movimentação de terra, deve-se ligar para a Codesal no 199 para fazermos a vistoria”, orienta.

Para fazer as demolições, lembra ele, também é preciso esperar o resultado do estudo. “Nossos técnicos vão continuar fazendo a vistoria para estudar o que fazer e como fazer. Temos que saber tecnicamente e de forma concreta o que deve ser feito”. Não há previsão de quando o estudo será concluído.