Novo major assume companhia da PM após onda de violência na Barra

A decisão acontece após uma série de violências, como assassinatos e tiroteio no bairro

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  • Da Redação

Publicado em 12 de setembro de 2021 às 10:42

- Atualizado há um ano

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O novo comandante da 11° Companhia Independente (Barra), major Uildnei Carlos do Nascimento, tomará posse na próxima quinta-feira (16). Segundo o Departamento de Comunicação Social da PM (DSC), o horário da solenidade ainda não foi definido. 

O nome do major Uildnei foi publicado no Diário Oficial do Estado (DOE) desta sexta-feira, 10, substituindo o major Jailton Carvalho de Santana, que estava à frente da unidade que atende o bairro da Barra, palco de recentes de violência. 

Praia do Porto da Barra: de "terceira melhor do mundo" a "nosso pior lugar"

A decisão acontece após uma série de violências, como assassinatos e tiroteio no bairro. Policiais militares estavam na região do Porto da Barra em base móvel neste domingo (12) - Foto: Paula Fróes/CORREIO No dia 16 de agosto, um casal em situação de rua foi atacado por um indêndio criminoso no Porto da Barra e acabaram mortos por complicações provocadas pelas queimaduras.

No ultimo domingo (5), dois homens e uma mulher foram baleadas durante um tiroteio no Porto da Barra.

No dia seguinte, o corpo de um homem, que tinha seus pés amarrados, foi encontrado boiando no Porto da Barra, às margens da praia.

Entenda onda de violência na Barra

A escalada da violência em um bairro que é cartão-postal da cidade tem chamado a atenção. Moradores e comerciantes contam que o Porto da Barra, uma das regiões mais famosas de Salvador e frequentada até por artistas, vive uma rotina de medo, com furtos, assaltos e, agora, homicídios.

No domingo (5), Rodrigo Cerqueira de Jesus, 29 anos, morreu depois de ser baleado na Rua Barão de Sergy, a menos de 100 metros da praia. A mãe dele e o amigo também ficaram feridos. Rodrigo estava sendo investigado por envolvimento no tráfico de drogas, e a polícia suspeita que esse seja o motivo do crime. Foram pelo menos cinco disparos, e como a região estava movimentada, houve correria.

No dia seguinte, os moradores ainda estavam se recuperando do susto quando correu a notícia de que um corpo foi encontrado boiando na praia. Os mais curiosos foram até a balaustrada para confirmar o fato. O homem estava com os pés amarrados com corrente e ainda não foi identificado. Homem estava com os pés acorrentados (Foto: Arisson Marinho/ CORREIO) É por conta de situações como essas que os moradores e comerciantes estão temendo pela vida deles, dos funcionários e dos clientes. Nessa segunda (6) pela manhã, o comércio abriu as portas e os moradores saíram de casa, mas o movimento foi fraco, e a maioria das pessoas ouvidas pela reportagem pediu para não ser identificada, por medo.

O gerente de uma loja de roupas que fica em frente à praia contou que instalou um novo portão, na frente do primeiro, para tentar se proteger dos bandidos. Mesmo assim, a loja já foi vítima de furtos. “A gente pode esticar o expediente até mais tarde, a prefeitura autorizou, mas eu não fico. Quando o movimento está pequeno, com pouca gente na rua, eu fecho a loja, independentemente do horário”, contou.

A proprietária de uma loja de costuras e biquínis, que também pediu anonimato, contou que está encerrando o expediente antes do horário com medo da insegurança. A loja dela foi assaltada no ano passado.

“Coloquei três trancas novas, instalei alarme e estou trabalhando em alguns momentos com a porta fechada. No ano passado, pouco antes da segunda onda da pandemia, cheguei para trabalhar e a loja estava arrombada. Prestei queixa, porque o prejuízo foi de quase R$ 7 mil. Até agora espero resposta da polícia”, desabafou.

O crime desse domingo aconteceu no cruzamento entre as ruas Barão de Sergy e César Zama - a 200 metros à direita fica a 14ª Delegacia (Barra) e a 200 metros à esquerda fica a 11ª Companhia Independente da Polícia Militar (CIPM/ Barra). Esse cenário preocupa ainda mais os moradores, como contou uma mulher que mora próximo ao local.

“Eles [bandidos] estão tão descrentes do poder público que se sentem à vontade para praticar os crimes ao lado das unidades policiais. Isso diz muito sobre em que nível está a nossa segurança. São situações que acontecem à luz do dia, sem nenhum pudor. Eu já estava pensando em me mudar e esses episódios só reforçam ainda mais essa decisão”, disse, em anonimato. Em agosto, casal foi incendiado enquanto dormia (Foto: Nara Gentil/ CORREIO) Brigas Os moradores reclamaram do som alto e das aglomerações que estão se tornando frequentes no Porto da Barra. Nas duas últimas semanas, a Guarda Civil Municipal precisou fechar o acesso à praia devido à quantidade de pessoas na areia. No calçadão, porém, grupos se amontoaram em festas. Foi nesse momento, no início da noite, que houve o tiroteio que matou uma pessoa e deixou outras duas feridas.

Segundo a Polícia Civil, o homem que foi assassinado mora em Cosme de Farias, e o tiroteio estaria relacionado ao tráfico de drogas. Essa versão ainda está sendo investigada, mas não seria a primeira vez que grupos rivais se enfrentam no Porto da Barra. Em dezembro de 2018, bandidos abriram fogo no meio da multidão. Houve correria, pessoas se machucaram, uma foi baleada e três suspeitos foram presos.

Um idoso desabafou. “Não bastasse os bandidos daqui a gente ainda tem que lidar com os que vêm de fora. A praia fica lotada, como quase toda praia de Salvador, então, como é que vamos saber quem é bandido e quem,não é? No momento em que eles se encontraram é que essas coisas acontecem. A sensação que eu tenho é de que a Barra está abandonada”. Em março, um policial teve um surto e fez diversos disparos no Farol da Barra (Foto: Arisson Marinho/ CORREIO) Reflexo As águas tranquilas do Porto da Barra são queridinhas dos baianos, dos turistas e até de artistas. Em uma tarde ensolarada de verão, em janeiro de 2020, o CORREIO encontrou Caetano Veloso e Liniker aproveitando o sol de 30ºC, cada um com sua turma. Artistas globais também já estiveram naquelas bandas. O receio de quem trabalha com o turismo é de que a violência desmedida afugente o público e provoque reflexos maiores na economia.

Donos de bares e restaurantes da região disseram que orientam os clientes a terem cuidado com aparelhos celulares e outros pertences, mas se queixaram que a violência afugenta o público. Gerentes de hotéis têm a mesma preocupação. Caetano aproveita dia de sol no Porto (Foto: Tiago Caldas/ CORREIO) A Associação dos Moradores e Amigos da Barra (Amabarra) publicou uma nota nas redes sociais em que cobra do poder público medidas concretas no enfrentamento à violência e classificou o caso como “um domingo de praia e de sangue no Porto da Barra: o novo normal”. O diretor de comunicação da instituição, Watson Campos, disse que é preciso mais comprometimento.

“No fim de semana, acontece uma série de irregularidades no Porto da Barra. São adolescentes consumindo álcool, pessoas usando drogas, confusão de ambulantes, poluição sonora, entre outras. Essa desordem somada ao baixo efetivo de policiais facilita essas ações. É preciso um trabalho de inteligência das polícias e o fim dessa desordem, com fiscalização, ou a situação vai piorar”, disse.

Houve uma reunião na Amabarra, nessa segunda-feira, para discutir a violência no bairro. O diretor cobrou uma ação conjunta entre Município, Estado e Poder Legislativo para solucionar o problema. Enquanto a solução não vem, a paulistana Ana Gutemberg, 35, lamenta. “Vim à praia na Bahia para descansar. Cadê a tranquilidade?”. Confusão após tiroteio, no domingo (Foto: reprodução) Respostas  Questionada sobre as queixas da população em relação à insegurança no bairro, a Polícia Militar informou, em nota, que realiza policiamento ostensivo em vias públicas e atua no atendimento às solicitações recebidas. “O policiamento é realizado de forma ostensiva e preventiva pela 11ª CIPM, em regime de 24h, através de rondas policiais e abordagens em toda a região, além de duas bases móveis instaladas no Farol da Barra e no Morro do Cristo. O trabalho é intensificado com guarnições do Pelotão de Emprego Tático Operacional (Peto). Nos fins de semana, o policiamento é reforçado com policiais empregados extraordinariamente na Operação Barra”, diz a nota. 

A corporação informa  também que o acionamento das guarnições da PM e o registro das ocorrências na delegacia do bairro são imprescindíveis para que os fatos sejam levados a conhecimento das instituições e que, dessa forma, o planejamento das ações acompanhe as necessidades apresentadas por moradores e frequentadores da região.

Sobre o homicídio de Rodrigo Cerqueira de Jesus, 29 anos, conhecido como Tosta, a Polícia Civil informou, em nota, que o Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) apura o crime e que Rodrigo seria integrante de um grupo criminoso com atuação no bairro de Cosme de Farias e um dos alvos de investigações do DHPP.

“Ainda de acordo com informações preliminares, ele seria o alvo dos criminosos. A disputa pelo tráfico de drogas é a principal linha de investigação para a motivação do crime”, diz a nota. Indagada, a Polícia Civil não informou ontem se os investigadores responsáveis pelo caso tiveram acesso às imagens das câmeras de segurança da região, se identificaram quantos autores participaram do crime, se existe algum suspeito e o que foi encontrado com as vítimas. 

O corpo de Rodrigo foi liberado para sepultamento nessa segunda-feira, no cemitério da Ordem Terceira de São Francisco, na Quinta dos Lázaros. As autoridades disseram que estão investigando o caso. Sobre o corpo que apareceu boiando na praia, a Polícia Civil disse que a 14ª Delegacia (Barra) investiga as circunstâncias da morte e que, de acordo com os primeiros levantamentos, o principal indicativo é de suicídio.

Destaque nacional Nos últimos meses, a Barra tem aparecido nas manchetes dos jornais, mas de uma maneira negativa. Em março, o caso do policial militar Wesley Soares Góes, 38 anos, que teve um surto psicótico e fez diversos disparos na frente do Farol da Barra teve repercussão nacional. Era início da noite de um domingo e o PM dirigiu de Itacaré, no Sul do estado, até Salvador para praticar o ato.

A população acompanhou o desenrolar da história em tempo real, através das redes sociais e dos veículos de imprensa. Foram quatro horas de negociação até Wesley começar a atirar contra os policiais e ser morto em uma ação do Batalhão de Operações Policiais Especiais (Bope).

Em julho, um barco e um helicóptero foram usados para prender dois homens que assaltaram duas pessoas no Porto da Barra. Eles levaram duas correntes, um celular e um relógio das vítimas. Outras pessoas viram que eles não estavam armados e tentaram intervir. Os bandidos correram para o mar e se esconderam em um dos barcos que estavam atracados no porto.

Com apoio do Grupamento Aéreo da Polícia Militar (Graer) e ajuda de um pescador, que emprestou um dos barcos, os policiais fizeram a captura sob aplausos da população. O caso repercutiu por alguns dias.

No mês passado, um homem de 39 anos foi preso depois de atear fogo na barraca em que dormia Edilson Silva Souza e Ana Paula Coreia Franzoni, próximo ao Marco Zero do Porto da Barra. O nome do suspeito não foi divulgado, mas a polícia informou que o crime foi praticado por vingança. As vítimas morreram dias depois.