'O Bahia me deu a chance de ser quem eu sou hoje', diz Daniel Alves

Lateral foi convidado do primeiro episódio do 'Segundou', nova live do CORREIO

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  • Da Redação

Publicado em 14 de julho de 2020 às 05:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: PEDRO MARTINS/ MOWA PRESS

Boas histórias, irreverência, posicionamentos fortes e até cantoria. Assim foi o bate-papo entre os baianos Daniel Alves e Joca Guanaes, que é publicitário, na estreia do “Segundou”, live semanal realizada no perfil do CORREIO (@correio24horas) no Instagram toda segunda-feira, às 19h. Ao todo, 109 mil pessoas acessaram o conteúdo. Confira parte da entrevista:

Como foi a sua infância na roça e como ela te moldou? Tive uma infância bem feliz, apesar das dificuldades. Tive pais que suavam na roça para não deixar faltar nada e a partir daí fui vendo as dificuldades que eles estavam passando e decidi me aventurar. Desde pequeno tinha a sensação de que seria algo diferente na vida. Tentei sei figurante de filme, não adiantou, tentei ser garçom, muitas coisas, até que veio o futebol.

Seu sonho era a música e você diz que o futebol é o hobby. Como saiu dessa infância jogando com meia improvisada e chegou ao esporte? Montava a minha bandinha com baldes que meu pai usava para adubar as plantas, mas vi que não estava dando muito certo (risos). O meu pai, como é apaixonado por futebol, me levava para jogar nos torneios. Eu fazia gol para caramba, ia me destacando, e foi quando ele tomou a decisão de tirar a gente da roça e morar em Juazeiro para poder estudar e ter a chance de ir em uma escolinha. Ele foi muito assertivo nessa decisão. Graças ao futebol consegui melhorar a vida dos meus pais. Sou uma pessoa realizada, mas também tenho a minha essência e dinheiro nenhum pode comprar.

É verdade que assinou contrato com o Bahia dentro do ônibus ao sair de Juazeiro? Como os meus pais moravam na roça, eles só vinham uma vez na semana visitar a gente. Nesse período, meu pai veio na sexta-feira e tinha recebido uma proposta que era viajar no domingo. Disse a ele que não ia perder essa oportunidade e ele mandou eu meter o pé e ir embora. Só que não tinha contrato de profissional e para chegar no Bahia e ganhar minha ajuda de custo tinha que ter o contrato. Aí dentro do ônibus o pessoal do Juazeiro fez a papelada e assinei.

Depois de sair do Bahia você foi para o Sevilla e disse que deixou de ser menino e virou um homem. Como foi tudo isso para você? Eu não conhecia a cidade, não conhecia o idioma, mas fui bem recebido. Mas também tive muita dificuldade. No Bahia eu me destacava, mas não ganhava muito. Quando cheguei no Sevilla, o salário era baseado no que eu ganhava no Bahia, então passei muita dificuldade, mas que não tenho vergonha. Essas coisas ensinam, só quem vive sabe. Costumo dizer que não conto essas coisas para as pessoas sentirem pena de mim, mas com muita honra para as pessoas entenderem que as coisas não são fáceis, mas são alcançáveis. Eu sou roceiro com muito orgulho e conseguir tocar o nível mais alto de realização.

Você viveu muito tempo fora do Brasil. Diante de tudo que viveu, em qual lugar você acha que tem mais racismo, aqui ou lá fora? Aqui no Brasil existe racismo em um grau super elevado. Existe preconceito com nordestino, com quem mora na favela, com os gays. A gente convive com o preconceito. Parece que é mais bonito comprar uma briga lá de fora. Vou comprar uma briga porque lá no Estados Unidos estão fazendo isso. Mas aqui do seu lado está acontecendo. Eu acho que nós deveríamos nos organizar para defender causas ou então vão ser só gritos ao vento que não resolvem nada. 

Em 2018 você teve uma lesão no joelho e ficou fora da Copa do Mundo. Como foi esse momento? Esse foi o pior momento da minha carreira. A única coisa que impede um atleta de ser é quando ele se lesiona. Quando machuquei, sou ser humano, não tenho demagogia, senti o baque. No dia seguinte, os meus amigos, minha família, estavam muito tristes com a situação. Eu falei para eles que sabia que tinha dado ruim, mas não poderia me queixar da vida. Olha tudo que Deus me proporcionou. A única coisa que eu acreditava era que a vida estava me testando com a minha força. Não vou me adentrar ao problema, vou me adentrar a solução. Coloquei o objetivo e fui construindo.

Quais são os seus planos para os próximos anos? Primeiro o meu objetivo era realizar o meu sonho. Tinha feito tanta coisa no futebol e não poderia passar sem jogar no São Paulo. Quando veio essa possibilidade eu sabia que era o momento de realizar o sonho e hoje me sinto realizado por fazer uma coisa que era desejo de criança. Meu objetivo agora é chegar na Copa do 2022 e lutar com os meus companheiros por um título. O objetivo está lá e a gora é a hora de colocar os tijolos para alcançar. Esse é o meu objetivo, mas não me frustraria se não conseguisse alcançar esse objetivo. 

Tem plano de voltar ao Bahia? Desde que eu saí do Bahia sempre disse que se um dia fosse acabar a minha carreira no Bahia, seria por gratidão porque o Bahia me deu a oportunidade. Eu me considero uma pessoa grata para quem me abriu as portas.O Bahia é o clube do meu coração também, tudo começou lá. Foi de lá que eu fui para a Seleção, fui para a Europa, as pessoas começaram a me conhecer. Esse seria o sonho perfeito antes de parar: passar por lá para agradecer. Não prometo jogar muito, mas uns dois meses dá pra jogar. Estamos no pico da pandemia de covid-19. Como vê a volta do futebol? Penso sempre no ser humano, mas infelizmente na vida não podemos controlar tudo. Quando você é empregado chega um momento que tem que acatar ordem. As pessoas que trabalham em restaurantes correm risco, as pessoas que prestam serviço estão correndo risco. Acredito que as pessoas devem se cuidar, tomar as precauções necessárias para não deixar de viver. A única coisa que impede as pessoas de serem felizes é o medo. Temos que tomar todos os cuidados, mas não podemos deixar de viver. A única coisa que eu acho que não devemos fazer é um carnaval. A saúde é essencial para vida do ser humano e temos que cuidar dela seja com o coronavírus, seja com outra enfermidade. Isso não pode ser o motivo de uma resistência da vida. Não podemos instigar as pessoas de que não acontece nada, porque acontece. Mas vamos ser saudáveis, aumentar as nossas defesas e tentar passar por isso ilesos.

Você sempre diz que quer deixar um legado dentro e fora do futebol. Qual o seu?  É inspirar quanto mais pessoas eu puder. Não só dentro de campo, mas fora também, a nível educacional. O Dani vai se posicionar quando ele achar que vai fazer alguma diferença com as palavras dele.

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