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O novo desenho familiar na Bahia provocado pelas mortes na pandemia

Com a perda de parentes para a covid-19, relações se reorganizam e mudam a cara de lares baianos

  • Foto do(a) author(a) Fernanda Santana
  • Fernanda Santana

Publicado em 20 de março de 2021 às 06:00

 - Atualizado há 2 anos

. Crédito: arte/Agência Grida

Ao meio-dia, um telefone toca e a voz do médico, do outro lado, transforma o presente em saudade. Antônio, marido de Valdirene, está morto, lamenta o doutor na chamada. Uma ligação, uma vida para trás. Valdirene recebeu cinco delas. “Perdi meus pais, dois irmãos e meu amor, em três semanas”, diz a professora municipal Valdirene Porto, 51, de Brumado.   

As famílias Porto, Santos e Lopes tentam se encontrar no tempo. “Seu marido não resistiu”. “Sua esposa faleceu”. “Sua mãe foi para o céu”. Elas ouviram frases parecidas com essas. Seus parentes morreram vítimas da covid-19, às vezes, em intervalos de poucas semanas de uma perda para outra. Aqui ficaram bebês, viúvos, pais sem os filhos, e novos arranjos familiares.

Agnes, uma bebezinha de quatro meses, está sob os cuidados de duas tias, em Ilhéus. Ela não sabe, mas crescerá sem mãe, avó e bisavó, todas vítimas fatais do coronavírus em 23 dias. O pai da criança ainda  está internado com  covid-19, assim como a neném, acompanhada em casa. 

As tias dão amor a Agnes e fazem as vezes dos pais que não estão ali. “Estamos procurando dar o máximo de amor, cuidar dela, brincar”, conta Maiquele Santos, 26, uma das tutoras. Kelly, a outra, pediu licença do trabalho em uma clínica  do município para cuidar melhor da sobrinha. Uma nova família que surge. 

“A situação de famílias que perdem mais de um parente por vez, e daquelas que precisam se reorganizar completamente depois dessas perdas, precisa ser considerada quanto ao luto”, diz Mônica Venâncio, psicóloga e integrante do Ambulatório do Luto do Hospital das Clínicas, em Salvador. 

O luto, ela define, é um processo que surge diante de uma perda: “É como se abrisse um vazio em quem fica para aquele sujeito que se foi,  e começa um processo de elaboração da perda”. 

Quando a morte é abrupta e leva vários familiares, o luto pode ser ”suprimido”, frisa Mônica. No futuro, essa dor abafada pode aparecer em forma de transtornos psíquicos, como depressão. A impossibilidade da despedida, o caos ao redor e as mortes diárias são agravantes. 

Novos moldes  A maior parte das famílias baianas é de casais com filhos, seguida de mulheres sem cônjuges e com filhos. Doutor em Família na Sociedade Contemporânea pela Universidade Católica de Salvador (Ucsal), Deivid Lorenzo diz que a pandemia evidenciará formatos familiares que já existiam, mas eram silenciados.

Ele cita irmãos sem pais, avós que criam os netos ou tias  responsáveis pela criação dos sobrinhos. Ainda não existem estudos estatísticos sobre  as novas famílias geradas pela pandemia. Mas importa entender, hoje, que não há um molde de família.  “Para ser família tem que haver assistência recíproca, projeto de vida comum que  corta décadas”, explica o pró-reitor da Ucsal.   

A família de Alice, prestes a completar um ano, não é a aquela que seus pais planejaram. Sua mãe, Rafaela, foi a primeira puérpera morta por covid-19 na Bahia, no dia 1º de abril de 2020. Ela faleceu quando a recém-nascida tinha seis dias e cabia num antebraço adulto. O pai, Erisvaldo Lopes , 47, é quem  cria a menina. “A gente é muito ligado”, conta ele, dono de uma agência de Turismo em Trancoso. 

O coronavírus já deixou 16 recém-nascidos órfãos de mãe no estado, segundo a Secretaria da Saúde da Bahia, desde março do ano passado. Em relação à morte de pais de bebês, não há estatísticas. Também não existem estudos conclusivos sobre o impacto do coronavírus no  corpo de grávidas ou puérperas de até  oito semanas. Mas, explica Enny Paixão, doutora em Epidemiologia pela Escola de Higiene e Medicina Tropical de Londres, há possibilidades. Uma delas tem a ver com a coagulação. 

A covid-19 provoca um risco maior de distúrbios na coagulação, assim como a gravidez. “Poderia ter uma plausibilidade, um risco maior de formas graves da doença”, diz. Preventivamente, o Ministério da Saúde enquadra gestantes e puérperas em grupo de risco. 

Confira as histórias dessas famílias reconfiguradas pela pandemia, que tentam seguir diante das perdas. Um pai e um bebê: Clique aqui para conhecer a história. Duas tias, uma nova família: Clique aqui para conhecer a história. A mulher que perdeu pais, marido e irmãos: Clique aqui para conhecer a história. SERVIÇO: Ambulatório do luto, HupesComo ter acesso: Envie um email para [email protected], com o assunto "Ambulatório do luto". O atendimento ocorre preferencialmente online.