O racismo brasileiro de cada dia é sem trégua

Três casos mobilizaram o noticiário dessa semana

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  • Andreia Santana

Publicado em 19 de junho de 2021 às 05:30

- Atualizado há um ano

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Um professor de surf de 22 anos acusado de furtar uma bicicleta elétrica que outra pessoa pegou, uma empresária de 24 apontada por roubar um vestido que era dela própria, uma miss de 19 xingada por ter vencido um concurso de rainha da beleza. Os três casos têm em comum o fato das vítimas serem pessoas pretas que sofreram racismo. Os dois primeiros aconteceram no Rio de Janeiro e o último, em Minas Gerais. Durante toda a semana, quem acompanhou o noticiário viu o desenrolar dessas situações. 

No caso do professor de surf Matheus Ribeiro, confundido com ladrão de bicicleta no último final de semana, no Leblon, o autor do furto, preso na quinta, 17, era branco. Assim como também era branco o casal que o acusou sem provas, apenas baseando-se na cor de sua pele. Os dois foram demitidos dos empregos e responderão por calúnia, não por racismo, porque a delegada que cuida do caso não viu injúria racial na falsa acusação de furto. 

A empresária Juliane Ferraz tentava comprar um vestido para a enteada. Levou de casa uma peça da criança para comparar tamanhos, todas as mães de crianças fazem isso, mas uma madrasta preta é suspeita. Uma branca, certamente, não seria. O supervisor da loja Leader de um shopping carioca que acusou a empresária de furto foi demitido e a loja emitiu nota de repúdio e pedido de desculpas. Mas a dor de ser confundida com uma ladra apenas pela cor de sua pele, a vítima já sentiu. Juliane denunciou caso de racismo sofrido em shopping do Rio (Foto: Reprodução/Instagram) A miss Maíza de Oliveira venceu o concurso de rainha de Santo Antônio do Amparo (MG), transmitido pela internet, mas em vez de saborear a conquista, recebeu um viral do WhatsApp. Era o áudio cheio de ofensas raciais de uma moradora da cidade, descontente com o fato de uma preta ser coroada rainha.

Os três casos de racismo que estamparam chamadas de sites e jornais nessa semana representam um pedaço ínfimo de tudo o que pessoas pretas vivem diariamente no Brasil. O fato da polícia e de segmentos da sociedade não conseguirem enxergar racismo nesses casos tem motivo histórico e antigo. 

Por séculos foi construído um discurso para desumanizar corpos pretos e assim justificar a escravidão. O imaginário social foi construído sobre papeis subalternos para pessoas de cor, na TV, na publicidade. A ideia de beleza e perfeição é eurocêntrica, mesmo em um país como o Brasil. 

Ainda assim, no século XXI, esse contexto já é conhecido, o que precisa agora é ser mudado. Brancos, pretos, mestiços precisam é se posicionar. Porque racismo mata, inclusive socialmente.

OUTROS DESTAQUES DA SEMANA

Morte de menina importa menos que namoro aos 11

“Criança não namora” é slogan de campanha de 2017 contra a erotização infantil. Mas, também foi a frase mais dita na semana na internet, para comentar a morte precoce de uma menina de 11 anos, em Jequié, na segunda, 14, por bala recebida em um ‘jogo’ de roleta-russa com adolescentes de 14 anos. 

O fato da vítima ter recebido o tiro disparado por um ex-namorado e dela estar no local da morte acompanhada de outro namorado, chocou mais a internet do que a situação violenta em si: eram cinco pessoas na faixa dos 11 aos 14 anos, com uma arma nas mãos, brincando com a morte de forma banal.  Caso aconteceu em Jequié, a 365 Km de Salvador (Foto: Divulgação/Prefeitura de Jequié) Segundo testemunhas, desde a manhã de segunda, o grupo estava no anel viário de Jequié disparando tiros para o alto com a arma que matou Taila Jesus de Souza. 

O fato da menina já ter ex e atual namorado não é o foco da situação, embora seja preocupante e grave a questão da erotização precoce, mas integra o mesmo contexto que faz com que uma criança tenha acesso a armas ou se envolva em situações violentas. Segundo a polícia, o adolescente que deu o tiro e será enviado para uma instituição, integrava o tráfico de drogas. A vítima, por sua vez, não fazia parte do tráfico, afirmou o delegado que cuida do caso. 

Infelizmente, é como se a vida imitasse o enredo de Laranja Mecânica, livro de Anthony Burgess sobre adolescentes que praticam a violência. O julgamento moral da vítima, no entanto, não vai trazê-la de volta. O que devia chocar é o fato de tantas crianças se perderem para o tráfico.

O mundo sob risco de sede

A escassez de água deve causar estragos em uma escala que rivalizará com a pandemia. E os riscos aumentam à medida que as temperaturas globais se elevam, afirmou, na quinta, 17, a Organização das Nações Unidas. Segundo a ONU, as secas já resultaram em perdas econômicas de 124 bilhões de dólares e atingiram mais de 1,5 bilhão de pessoas entre 1998 e 2017. O aquecimento global intensifica secas no sul da Europa e oeste da África, diz a ONU. O risco de escassez de água é urgente em 130 países.

Aniversário e presente aos fãs Maria Bethânia gravou disco novo no ano passado (Foto: Jorge Bispo/Divulgação) A cantora Maria Bethânia fez 75 anos nesta sexta-feira, 18, e aproveitou a data para anunciar o lançamento de seu novo álbum, chamado Noturno e gravado entre setembro e outubro do ano passado na gravadora Biscoito Fino. A flor encarnada, música de Adriana Calcanhoto, foi escolhida como single do novo trabalho da artista natural de Santo Amaro, no recôncavo baiano.

Quebradeira e luz no Nordeste de Amaralina Ferramenta de mapeamento de vídeo foi usada na transmissão do festival (Foto: Paula Fróes/CORREIO) A primeira edição do Festival Mete Dança Digital, na terça, 15, iluminou com projeções em vídeo as janelas, varandas e lajes do Nordeste de Amaralina. A iniciativa foi contemplada com edital do Prêmio Anselmo Serrat de Linguagens Artísticas, da Fundação Gregório de Matos.

Para refletir... “Não contei para ninguém. Sentia vergonha de dizer que tinha sido expulsa do banheiro por ser trans. Hoje, faria tudo diferente, mas naquele dia me senti silenciada”, Gabriela LoranAtriz e influencer transgênero, em entrevista ao UOL, na sexta-feira, 18, lembrou situação vivida durante sua transição de gênero. Ela também comentou o caso semelhante vivido por outra mulher trans, em Alagoas. No último dia 10 de junho, a Justiça alagoana condenou o segurança que impediu o acesso de Lanna Hellen ao banheiro do estabelecimento por ela ser transgênero. A pena, de um ano e seis meses de reclusão, foi transformada  em prestação de serviços à comunidade e pagamento de 10 salários mínimos. A transfobia foi transformada em crime em 2019 por decisão do Supremo Tribunal Federal.