Obras do Hotel Fasano recuperam aspectos do prédio histórico

Restauração de edifício do Centro recebeu investimento de R$ 85 milhões para unir modernidade e tradição

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  • Victor Lahiri

Publicado em 6 de dezembro de 2018 às 06:24

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Marina Silva/CORREIO

Salvador já entrou na contagem regressiva para a inauguração do Hotel Fasano, que acontece nessa sexta-feira (7). A bandeira hoteleira ocupará o imponente edifício conhecido por ter sido sede do antigo jornal A Tarde, na Praça Castro Alves. O prédio passou por uma minunciosa restauração, com a adição de novas tecnologias que o adptaram às demandas modernas, fator que tem alimentado a curiosidade de quem passa pelo local desde o início da obra, em 2015. A Prima Empreendimentos Inovadores, responsável pela recuperação do edifício, revelou, com exclusividade, ao CORREIO os detalhes da intervenção que elevou o imóvel histórico a padrões internacionais de qualidade e modernidade, sem perder o charme tradicional.

O imóvel, com característica de art déco, teve sua construção iniciada em 1921, sendo um dos primeiros a contar com a então inédita tecnologia de concreto armado, segundo o historiador e arquiteto  Francisco Sena. A proposta inicial era abrigar o jornal A Tarde e salas comerciais e escritórios, e nos dois últimos andares, o hotel Wagner. Porém, em 1975, o periódico mudou de sede e deu espaço a novas salas comerciais e, ao longo dos anos, o local foi sofrendo um processo de esvaziamento. Junto à tendência de diversos edifícios do parque imobiliário do centro de Salvador, acabou em estado de abandono. 

O jogo apresentou sinais de mudança a partir de 2006, quando a Prima adquiriu o prédio e começou a buscar bandeiras hoteleiras que tivessem interesse em explorar a atividade ali. O escolhido foi o Fasano, e as obras iniciaram em agosto de 2015. De lá para cá foram investidos R$ 85 milhões na intervenção, que envolveu o reforço da estrutura e modernização dos sistemas internos, além da restauração das características históricas do imóvel.“Foi um trabalho realizado com muito cuidado, justamente por se tratar de um prédio antigo, com características históricas e que estava sem uso por muitos anos”, explica Luciano Carneiro, diretor executivo da Prima.Ele mesmo complementa: “Realizamos estudos e fizemos uma série de intervenções que modernizaram a estrutura e a tornaram apta para receber um empreendimento da magnitude da rede hoteleira Fasano”.

70 quartos Após a finalização da obra, o local passa a contar com 70 quartos e 2.603m² de apartamentos de alto luxo, 245m² de restaurante com dois ambientes, 495 m² de áreas de piscina e SPA/academia e 140 m² de business center com duas salas para uso, além de todas as áreas de apoio e serviço.

“Tivemos a preocupação de trazer para o projeto o que há de melhor na construção civil, tanto no sentido da estrutura como no acabamento, pois entendemos que o cliente da bandeira Fasano é exigente. Estamos entregando um empreendimento no mais alto padrão, que certamente vai superar expectativas”, diz, confiante, Luciano.

A prova da cautela impressa na obra é o tempo de execução, cuja conclusão era prevista para 18 meses, mas acabou levando quase três anos. E um das características que tornam a estrutura do Fasano única em Salvador é a tecnologia de tratamento acústico aplicado nas janelas e portas. São mantas acústicas e materiais nobres, como a madeira de lei maciça e vidros especiais duplos, para dar maior conforto aos hóspedes. “"É algo que a estrutura antiga não possuía e que tivemos muito critério na hora de montar, pois se trata de um sistema de tratamento acústico muito acima dos padrões exigidos pela construção civil. Com essa tecnologia, o hóspede poderá tirar um cochilo, mesmo com o trio elétrico passando aqui pela frente durante o Carnaval”, apontou o diretor da Prima. Um outro aspecto que busca a valorização do imóvel  para agregar à experiência dos hóspedes é o terraço, que possui vista privilegiada da Baía de Todos os Santos, um dos cartões-postais da capital baiana. O espaço oferece deck em madeira, com piscina revestida em granito azul bahia. E na lista de espaços úteis, o empreendimento ainda conta com Fitness Center e Wellness SPA com três salas de massagem e sauna úmida.

Restauração Entre os pontos mais comemorados por historiadores e arquitetos soteropolitanos está o processo de restauração, que buscou preservar a linguagem arquitetônica e a riqueza cultural e histórica do prédio. O trabalho foi chefiado pelo restaurador Eubaldo Gomes, que atuou, com uma equipe de quatro profissionais, ao longo de sete meses, seguindo exigências apresentadas por órgãos como Ipac e Iphan. A fachada revestida com argamassa de pó de pedra foi um dos principais desafios, garante Eubaldo. “Encontramos aqui um belíssimo trabalho arquitetônico que foi descaracterizado por anos de abandono. Pinturas que removeram a expressão do acabamento original e até mesmo a vibração provocada pelos trios elétricos que prejudicou bastante o estado da fachada. Por isso tivemos que fazer um trabalho muito cuidadoso para devolver essas características que acabam sendo comercializadas como um diferencial do empreendimento”, explica. 

O lobby também foi restaurado mantendo o revestimento original das paredes e o piso reproduzido fielmente em mármore Carrara e Granito verde alpe, carregando o status luxuoso típico do art déco, com estilo modernista e materiais ricos. “Os tacos de madeira, que já tinham perdido o brilho, foram retirados um por um, restaurados e devolvidos no mesmo desenho que estavam dispostos no projeto original. Sancas de gesso e paredes da década de 1930 também foram recuperadas”, relata. Restauração da fachada do Fera Palace Hotel também atraiu elogios de arquitetos e historiadores (Foto: Arquivo/Correio) Historiadores comemoram restauração de imobiliário

A união do moderno ao tradicional nos projetos de engenharia do Centro de Salvador é uma tendência comemorada por historiadores e arquitetos. A proposta de “retrofit”, que requalifica os edifícios para novas utilizações preservando a identidade histórica, tem se apresentado como solução para o parque imobiliário da região que sofria uma gradual degradação, mesmo possuindo edificações de grande valor cultural, que é trunfo para investidores. 

Para Márcio Campos, arquiteto, urbanista e professor da Uneb, a região do Centro vinha pedindo iniciativas desta natureza há muitos anos, e os casos ainda são poucos para o volume de imóveis em situação de degradação do espaço. “Temos uma lista de prédios que foram edificados naquela região, a partir da década de 1920, já trazendo a proposta do concreto armado, que permite uma maior flexibilidade nesse processo de atualização. São projetos de arquiteturas e fachadas muito bonitas que renovados trarão uma nova vida para a região”, afirma. Ele diz, porém, que o trabalho deve ser conduzido com cuidado, já que assim como o Palace e o Fasano são exemplos de sucesso, Salvador já teve tentativas não tão felizes de retrofit. “O prédio do Banco do Brasil, no Comércio, é um exemplo. O envidraçamento realizado descaracterizou por completo a fachada original, projetada por Bina Fonyat”, aponta.

O arquiteto e historiador Francisco Sena também comemora as iniciativas de recuperação dos imóveis que agora abrigam o Fera Palace e o Fasano. “Essas intervenções são dignas de louvor, pois estão, inclusive, tirando do papel obras públicas que tinham sido prometidas há décadas”, afirma. “Torço para que esses casos de sucesso sirvam como estímulo para outras iniciativas, já que temos um patrimônio se degradando em toda aquela região. O Comércio está correndo o risco de se tornar um bairro de ruínas, como era o Pelourinho no passado”, completa.

Vontade Francisco Sena destaca que um esforço conjunto entre poder público e iniciativa privada deve ser feito para pensar finalidades para o parque imobiliário da região. “Empreender uma obra de recuperação com tantas especificações de órgão de salvaguarda do patrimônio histórico não é uma tarefa simples, nem barata. É necessário uma ousadia muito grande para consolidar um projeto como esse, por isso um trabalho coordenado entre as duas partes é fundamental para o sucesso dessas iniciativas. Há um enorme potencial na região que está sendo desperdiçado”, diz. 

Já Márcio Campos afirma que a atualização do imobiliário do Centro é, também, uma questão de segurança. “Temos imóveis que ainda preservam e funcionam sob as mesmas normativas de quando foram construídos, essa atualização é fundamental para prolongar a vida útil do prédio e colaborar com a preservação da história arquitetônica da cidade”, comenta.