Óleo: Ufba questiona liberação de consumo de peixes feita pelo governo federal

Pesquisador diz que dados são insuficientes

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  • Da Redação

Publicado em 12 de novembro de 2019 às 08:38

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Arquivo CORREIO

O Ministério da Agricultura  Pecuária e Abastecimento (Mapa) divulgou nesta segunda-feira (11) que os peixes recolhidos nas praias baianas que foram atingidas pelo óleo estão "próprios para o consumo". Em entrevista ao CORREIO, o diretor do Instituto de Biologia da Universidade Federal da Bahia (Ufba), Francisco Kelmo, afirmou que as informações divulgadas pelo governo fedreal são insuficientes para confirmar ou refutar a liberação para o consumo de pescado. Ele cobrou mais transparência da União na difusão dos dados.

“Eles não dizem em que parte do corpo do animal eles fizeram avaliação, se foi nos músculos ou se foi na bile, por exemplo. Eles não dizem quantos peixes foram avaliados. Não dizem como foi a coleta. Não revelam as concentrações que eles encontraram para dizer que os valores foram baixos, nem o método utilizado. A informação é muito vazia e não traz segurança. Não há dados suficientes para concordar ou refutar”, afirmou o pesquisador que coordena estudos relacionados ao assunto.  Pescados estão liberados para consumo, segundo Ministério (Foto: Arquivo CORREIO) O professor e pesquisador pediu que essas e outras informações sejam mais detalhadas. “Estamos falando da saúde das pessoas. Não sabemos as consequências que isso pode ter. O governo precisa ser mais transparente”, disse.

A afirmação do Ministério da Agricultura veio após um estudo da PUC-Rio encomendado pela pasta, que mostrou que os frutos do mar não oferecem risco de contaminação. Mas o professor Renato Carreira, coordenador do laboratório que participou da pesquisa, afirmou ao Uol que os dados não permitem dizer que a pesca esteja liberada, nem que não haja animais contaminados.

Conforme o portal, os pesquisadores analisaram 21 amostras de peixes e lagostas coletados em Bahia, Ceará, Pernambuco e Rio Grande do Norte. O resultado de 12 dessas amostras já foi divulgado - o que resultou na nota do ministério -, e conclusões sobre as outras 9 são aguardadas para amanhã. "Nunca, em momento algum nosso laudo serve para dizer que a pesca está liberada", disse o pesquisador ao Uol.

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Ele trabalhou com mais nove pessoas no estudo. "[A forma como eles divulgaram o estudo] pode levar a interpretação que não é a que eu acho mais correta", afirmou ainda. No acordo firmado entre a universidade e o ministério, ficou estabelecido que o estudo ficaria a cargo do laboratório, enquanto a divulgação seria competência exclusiva da pasta.

"A gente fez um retrato, um primeiro esboço de divulgar níveis de contaminantes. Fizemos isso sem cobrar, como um esforço para divulgar a qualidade do pescado", diz o pesquisador.

Para chegar a essa conclusão, o laboratório analisou os níveis de Hidrocarbonetos Policíclicos Aromáticos (HPA) nos animais, que são indicadores para contaminação por derivados de petróleo. Os resultados revelam níveis baixos dos HPAs detectados em peixes e lagostas, não representando riscos para o consumo humano. 

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As amostras foram coletadas em estabelecimentos registrados no Serviço de Inspeção Federal (SIF). A pesquisa não especifica as espécies de peixe analisadas, nem se são animais que vivem em maior ou menor profundidade.

O Projeto Tamar também fez um levantamento extraoficial com oceanógrafos, biólogos e veterinários e analisou 61 amostras de peixes de 18 espécies diferentes, entre os dias 15 e 31 de outubro de 2019. O estudo foi apenas para detectar se havia ou não petróleo cru nos estômagos dos animais, mas não há uma avaliação química que informa se eles estão aptos ou não para consumo.

Os peixes foram coletados em diversos pontos da região da Praia do Forte, como porto da vila de Praia do Forte; recifes submersos (cerca de 20 metros de profundidade); talude continental ou parede, como é conhecido pelos pescadores (cerca de 700 metros de profundidade); região pelágica. É do talude, inclusive, que são provenientes cerca de 90% dos peixes comercializados.

"As amostras foram de diferentes níveis tróficos, de mais baixos como sardinha a mais altos, como tubarões. Não encontramos óleo nos estômagos analisados", disse o Tamar, por meio de nota. 

As notícias surgem como um alívio para quem tem a pesca como sustento. Só em Salvador, após o aparecimento das primeiras manchas de óleo, o preço do pescado caiu 25% devido à baixa demanda de consumidores.

No início do mês, o secretário de Aquicultura e Pesca, Jorge Seif Júnior, afirmou em live nas redes sociais, ao lado de Jair Bolsonaro, no dia 31 de outubro, que o consumo de pescados no litoral do Nordeste, poluído por manchas de petróleo, não oferece riscos à saúde. De acordo com o secretário, os peixes são “bichos inteligentes” que estão fugindo da contaminação.

Antes, uma pesquisa feita pelo Instituto de Biologia da Universidade Federal da Bahia (Ufba) apontou a presença de óleo dentro de caranguejos, mariscos e peixes. Mais de 30 animais foram analisados. “Todos eles têm óleo dentro do corpo”, adiantou, à época, o professor e pesquisador Francisco Kelmo, diretor do Ibio e que estava à frente do estudo.

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A Bahiapesca, empresa vinculada à Secretaria de Agricultura, Pecuária, Irrigação, Pesca e Aquicultura da Bahia (Seagri), também conduz uma análise. O levantamento, que já passou pelo Conde, no Litoral Norte, deve coletar peixes e mariscos ainda nas cidades de Jandaíra, Entre Rios, Camaçari e na praia de Itapuã, em Salvador. 

Outros serão coletados em Santiago do Iguape, em Cachoeira, para servir como grupo de controle. Segundo a assessoria da Bahiapesca, cerca de 60 indivíduos seriam selecionados em cada uma das praias. Depois, a empresa deve enviar um relatório para a Diretoria de Vigilância Sanitária e Ambiental, que deve avaliar se o pescado é próprio para consumo. O prazo para a conclusão das análises é no próximo dia 22.