Operários que retiraram fios de cobre se apresentam voluntariamente à polícia

Grupo foi ouvido na 1ª Delegacia Territorial, que já intimou a Pejota para prestar mais esclarecimentos

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  • Daniel Aloísio

Publicado em 2 de outubro de 2020 às 06:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Nara Gentil/CORREIO

Uma parte dos 10 operários que trabalharam na retirada de fios de cobre da Rua Direita do Santo Antônio, na manhã do último domingo, foi voluntariamente nesta quinta-feira (1º) até a 1ª Delegacia Territorial da Policia Civil, nos Barris, para prestar esclarecimentos. O grupo tinha sido acusado de furtar os cabos elétricos subterrâneos que já estavam desativados, mas alegou que foi contratado por um funcionário da construtora Pejota para realizar o serviço.  

Essa empresa ganhou a licitação do Governo do Estado para realizar obras nas ruas do bairro, que já duram sete meses. “Viemos para esclarecer os fatos. Nós jamais estaríamos mentindo, pois não temos necessidade disso. Se nos escondêssemos, a polícia viria atrás da gente, como se fôssemos os culpados. Não roubamos e sim fomos contratados pelo funcionário de nome Thailan”, conta um dos operários, que se identificou apenas como Marcelo, de 33 anos. 

No total, foram seis homens ouvidos pela delegada Rogéria Araújo, que acompanha o caso. Ela não quis falar com a imprensa sobre o inquérito que foi aberto. Os detalhes da investigação da polícia também não foram divulgados, para evitar interferências no curso das apurações. “A gente está sendo vítima nessa história e queremos que isso fique claro no inquérito”, disse Marcelo.  

Dessa vez, tanto Marcelo como outros quatro funcionários que prestaram depoimentos não tiveram vergonha de mostrar o rosto. Apenas o líder do grupo preferiu permanecer no anonimato, pois disse que sua imagem está associada à sucata em que ele trabalha e não quer prejudicar o nome da empresa. “Eu também tive a sorte de não ter meu rosto exposto nas imagens que viralizaram nas redes sociais nessa semana. Foram os meninos que apareceram”, disse o líder.   Líder do grupo não quer ser identificado (Foto: Nara Gentil/CORREIO) Na quarta-feira, sem se identificar, parte do grupo já tinha revelado a sua versão dos fatos em entrevista exclusiva ao CORREIO e à TV Bahia. Dessa vez, o grupo permaneceu na 1ª DT das 10h30 até as 17h da quinta. “Tivemos que perder um dia de trabalho, mas é importante que tudo fique claro. Outros funcionários não puderam vir hoje, pois estavam com compromissos já marcados”, explicou o líder do grupo.  

Depoimentos  Rodrigo Conceição, 27 anos, foi um dos que falaram com a delegada. “Eu passava no bairro e o povo me chamava de ladrão, o que era muito ruim. Agora, eu e minha família estamos mais aliviados, pois tudo está sendo esclarecido. Eles sempre acreditaram em mim, pois sempre fui trabalhador e nunca algo do tipo aconteceu comigo”, disse o jovem, que trabalha como diarista em operações como essa. “Recebemos R$ 50 por dia de trabalho, R$ 100 aos domingos”, disse.  “Quando tudo aconteceu, minha filha pequena disse que eu estava passando na televisão. Fiquei dois dias sem dormir, tive medo de ir preso por algo que não era culpa minha. Fui fazer um serviço, ganhar R$ 100 para levar para dentro de casa. Eu só peço que esse engenheiro apareça na delegacia e esclareça tudo. Não quero passar essa vergonha mais”, completou A advogada Marcela Nascimento acompanhou o grupo durante todo o dia e explicou que eles não iam abrir uma queixa nesse momento. “Eles vieram esclarecer, se defender, explicar que foram contratados por um suposto engenheiro da Pejota. Inclusive, eles tiveram nas dependências da construtora e pegaram materiais. Viemos ajudar a delegada nesse inquérito policial”, disse.  

Marcela também explicou que não havia um contrato escrito que estabelecia um vínculo entre as duas partes e sim um acordo verbal voltado para a retirada dos fios. “No início, eles queriam prestar uma queixa contra o suposto engenheiro e a empresa, mas vamos avaliar isso mais ao final desse inquérito. O importante agora é cooperar com o inquérito policial e esclarecer que eles não sabiam que se tratava de um furto. No momento, a culpa é do engenheiro, que precisa prestar esclarecimentos”, disse.  

O primeiro a ser ouvido pela delegada foi o lider do grupo, que conversou com o suposto engenheiro por mensagens de Whatsapp. “Ele nos falou que a empresa queria ‘se cobrir’, ou seja, se isentar da responsabilidade e disse que teria feito a denúncia por pressão da Conder. Eu falei que ele teria que ter nos explicado que o serviço era algo ilegal, pois assim a gente não iria fazer. Disse que estávamos chateados e ele nos bloqueou no whatsapp. Entrei em contato com a administração da Pejota, enviei os prints para eles e até agora não recebi nenhum retorno”, afirmou.   Trabalhador mostrou conversa que manteve com Thailan (Foto: Reprodução) O grupo afirmou que atua há 10 anos no mercado e que é comum eles serem chamados por construtoras para retirarem sucata de obras. “Se fosse de noite, eu iria estranhar. Mas era no domingo, um dia comum de trabalho para a gente. Bem, a empresa emitiu uma nota que se isentava da responsabilidade, mas eu quero que eles esclareçam legalmente que o funcionário deles contratou a gente, o que foi a verdade”, disse o líder.  

Relembre  No domingo, pessoas sem máscara, vestidas com uniformes azuis e com maquinários de grande porte, como retroescavadeiras, destruíram 60 metros de extensão de um lado da rua para levar fios de cobre que estavam enterrados no local. A ação se iniciou por volta das 8h30, durou cerca de quatro horas e danificou a rede de tubulação de água, que já foi consertada.  

A Coelba confirmou que os cabos furtados pertencem a uma linha de transmissão desativada, mas que permaneceram no local para uma eventual necessidade. Em nota, ela afirma que acompanha o inquérito policial em curso e seguirá tomando as medidas cabíveis para apuração dos fatos e responsabilização dos envolvidos.   Funcionários da Conder tiveram que consertar os estragos deixados (Foto: Marina Silva/CORREIO) A Conder não quis se pronunciar sobre o assunto. Já a Pejota Construções disse que não tem qualquer relação com os fatos noticiados. “A empresa disponibiliza vigilância para os materiais e equipamentos existentes no canteiro de obras. A construtora reforça que realiza os serviços no horário comercial, de segunda a sábado, e o tráfego de veículos e pedestres é livre e permanente durante toda a semana”, diz nota.  

Foi a prórpria Pejota que prestou queixa na delegacia, após o pedido da Conder, o que teria sido feito numa reunião entre as duas partes realizada na tarde da terça. No entanto, em nota divulgada para a imprensa um dia antes, a Conder já tinha dito que fizera o pedido à Pejota para que registrasse queixa. 

“Internamente, não há nenhum registro de contrato que vincule a empresa a este serviço prestado no dia 27. O funcionário citado não possui nenhum tipo de autonomia para contratação de serviços em nome da empresa sem a prévia autorização, conforme o manual de procedimento interno.  A empresa foi surpreendida com o possível envolvimento do mesmo no ocorrido. Caso seja comprovada sua responsabilidade, este será o único a assumir as consequências de seus atos que diferem do código de conduta da empresa”, afirma a Pejota.  

Confira a nota completa: 

A Pejota Construções, responsável pela execução das obras de pavimentação e requalificação das vias na região do Santo Antônio Além do Carmo, através de contrato firmado com a CONDER, esclarece que não tem qualquer relação com os fatos noticiados. A empresa disponibiliza vigilância para os materiais e equipamentos existentes no canteiro de obras.  A construtora reforça que realiza os serviços no horário comercial, de segunda a sábado, e o tráfego de veículos e pedestres é livre e permanente durante toda a semana. 

A empresa está colaborando com as investigações, em contato direto com a CONDER para apoiar na implantação de novas medidas a serem adotadas. A primeira medida foi o registro de boletim de ocorrência feito pela Pejota, na Delegacia dos Barris. A ação aconteceu após pedido da CONDER feito em reunião ocorrida no dia 29.  

As imagens amplamente divulgadas pela imprensa mostram que o fardamento usado pelos criminosos não possui nenhuma identificação da empresa. Além disso, os fios de cobre e o maquinário utilizado também não pertencem à empresa.  

A construtora reforça que a retirada dos fios de cobre de Santo Antônio Além do Carmo foi praticada por terceiros de forma alheia ao conhecimento da empresa. Após apurações preliminares relativas à denúncia feita à imprensa, a Pejota instaurou uma sindicância para tomar todas as providências legais cabíveis e afastou um funcionário da obra enquanto acontecem as investigações para apurar as responsabilidades.  

A Pejota reafirma que não contratou o serviço para nenhum fim, todos os contratos de empreitadas e serviços são feitos através de processos internos, passando por análises de serviço, cotações e autorização dos setores administrativos da empresa e da diretoria e, só após a formalização do contrato e da ordem de serviço é que o fornecedor executa o que foi contratados. Internamente, não há nenhum registro de contrato que vincule a empresa a este serviço prestado no dia 27. 

O funcionário citado não possui nenhum tipo de autonomia para contratação de serviços em nome da empresa sem a prévia autorização, conforme o manual de procedimento interno.  A empresa foi surpreendida com o possível envolvimento do mesmo no ocorrido, levantado pela mídia no dia 29/09. Caso seja comprovada sua responsabilidade, este será o único a assumir as consequências de seus atos que diferem do código de conduta da empresa. 

Ainda assim, todas as medidas foram tomadas para reparar os danos, evitando maiores prejuízos para os moradores, para a CONDER e para a Coelba – mesmo tendo sido a Pejota também prejudicada, assumindo todos os custos de requalificação e sua imagem atingida. 

Finalizamos reforçando, mais uma vez, que não houve a contratação dos “serviços” e que estamos colaborando com imagens, informações e documentos a fim de apoiar as autoridades competentes na resolução do caso. A partir desse momento, as informações sobre o caso serão dadas pelas autoridades competentes que conduzirão a investigação. 

* Com orientação da chefe de reportagem Perla Ribeiro.