Pacientes e médicos denunciam falta de remédio para epilepsia em PE

Doença acomete cerca de 131 mil pessoas no estado

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Publicado em 27 de abril de 2019 às 19:35

- Atualizado há um ano

. Crédito: Leo Mota/JC Online

Pacientes e médicos de Pernambuco denunciam que, há meses, a Farmácia do Estado está sem oferecer remédios essenciais para tratar uma enfermidade que, só no estado, acomete cerca de 131 mil pessoas, tomando como base a estimativa de 1,5% como prevalência da epilepsia. Doença neurológica caracterizada por descargas elétricas anormais e excessivas no cérebro, a epilepsia pode se manifestar com alterações da consciência ou abalos motores, como crises convulsivas – o sintoma mais conhecido de uma doença que requer tratamento adequado e contínuo. 

Diagnosticado com a síndrome de West (condição epiléptica severa), o pequeno Mikael, 7 meses, mora em Jatobá, município do Sertão pernambucano, e precisa da medicação vigabatrina para manter esse tipo de epilepsia sob controle. Nunca recebeu o medicamento pela Farmácia do Estado.“Desde novembro, vou atrás da vigabatrina. Até agora, conto com a ajuda da minha família para comprar o remédio, que custa R$ 318. Meu filho, que começou a ter convulsões no quarto dia de vida, precisa tomar duas caixas por mês. Meu pai, pedreiro, minha mãe, que faz faxina, e minha prima, que é servidora pública, fazem uma cota e compram o medicamento”, relata a dona de casa Raylla Loren da Silva Pontes, 19, mãe de Mikael.O neuropediatra Lucas Alves critica o cenário da falta da medicação. “Sem esse tratamento adequado, a criança evolui com sequelas graves e irreversíveis, como deficiência intelectual, problemas motores, transtornos de linguagem e autismo. Não dá para entender como um medicamento passa tanto tempo sem ser oferecido. Estamos falando de uma falta que chega a mais de oito meses. Isso causa indignação.”

Também neuropediatra, Adélia Henriques Souza acompanha crianças com epilepsia diariamente e lamenta assistir a essa situação crônica de desabastecimento de medicações. "Os pacientes com epilepsia têm recebido (de medicação) praticamente nada. Estamos falando de uma situação bastante grave. É um problema de saúde pública que causa muita angústia. Por outro lado, o Estado tem disponibilizado infusão de medicamentos, cujo gasto chega a 3 milhões de reais por ano para tratar outras doenças. Não dá para entender", frisa a neuropediatra Adélia Henriques Souza.

A pequena Maria Giovanna, 3, que nasceu com a síndrome congênita do zika, é mais uma criança que não consegue ter acesso à medicação que lhe é de direito: o clobazam. Gleyse, mãe de Giovanna, que nasceu com síndrome congênita do zika, tem até 20 crises por dia sem medicação. Clobazam não chega há 8 meses (Foto: JC Imagem/Leo Motta) “Já faz oito meses que está em falta e sem previsão de chegar. Como Maria Giovanna não pode deixar de tomar, eu compro. São três cartelas por mês. Quando não tenho (como comprar), só dou um comprimido, mas o efeito não é o mesmo. Ela toma outros três remédios, mas percebo que, sem esse quarto (o clobazam), não fica muito bem. Se ela não toma, chega a ter 20 crises por dia”, conta a dona de casa Gleyse Kelly Cavalcanti, mãe de Maria Giovanna.Ainda sobre o déficit de medicamentos, Lucas Alves reforça, com base na Constituição, que a saúde é direito de todos e dever do Estado. "Mas hoje vemos famílias, que nem um salário mínimo ganham, terem de se desdobrar para comprar os medicamentos. O governo precisa considerar que o gasto posterior com esses pacientes, que não recebem medicações adequadas, torna-se mais elevado por internações e invalidez", destaca o neuropediatra.

Resposta do governo Em nota, a Secretaria Estadual de Saúde (SES) resume que “o clobazam está em processo de aquisição. O Sabril (nome comercial da vigabatrina) está com entrega atrasada pelo fornecedor”. A reportagem do JC também questionou a SES sobre outras medicações em falta que fazem parte do tratamento da epilepsia. A carbamazepina está em estoque só em xarope (20 mg/ml).

“Sobre a segunda apresentação (comprimido 200 mg), a SES esclarece que uma compra já foi realizada, e a entrega está atrasada. O fornecedor foi notificado e, em paralelo, segue um processo de licitação para aquisição do medicamento. Também há processo em andamento para aquisição do clonazepam (2 mg)”, informa a nota.