Papai Noel índio

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  • Nelson Cadena

Publicado em 20 de dezembro de 2019 às 09:34

- Atualizado há um ano

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No Brasil da ditadura Vargas dois movimentos fracassados tentaram jogar no lixo as figuras de Papai Noel e do Rei Momo para substituí-los, em nome de uma suposta ideologia nacionalista, o primeiro pelo Vovô Índio, o segundo pelo Zé Pereira, que nem brasileiro era, ao Rei Momo arranjaram-lhe até uma esposa, Frederica, coroada ela também e destronada pelos próprios súbitos sob o argumento de que um homem feliz no Carnaval tem de permanecer solteiro.

A ideia do Vovô Índio nasceu de uma campanha idealizada pelo escritor Cristovam de Carvalho, contemporâneo de Mario de Andrade e Guilherme de Almeida, fundador da revista literária Columbia, próximo ao Natal de 1932. O intelectual pregava o fim dos estrangeirismos, refletia sobre o absurdo do imaginário das neves siberianas, das renas do bom velhinho e do pinheiro da árvore que na sua opinião deveria ser substituído por uma mangueira ou um abacateiro.

O movimento não passou de um debate estéril entre jornalistas e escritores, com argumentos a favor e contra, esqueceram-se de avisar as crianças, e se algum mérito teve foi o de comprovar a popularidade do Papai Noel, naqueles idos a Coca-Cola repaginava a imagem nórdica de São Nicolau e lhe conferia um aspecto bondoso. O que Cristovam de Carvalho e seus seguidores não entenderam é que não bastava um Vovô Índio, seria preciso criar um contexto, incluindo músicas pertinentes e apagar as lembranças de infância de várias gerações de adultos.

A ideia precisava de uma imagem e foi promovido um concurso. Três projetos foram selecionados pelo júri, os criados por Euclides da Fonseca, Henrique Cavalleiro e Humberto Nabuco. Dos três prevaleceu o de Euclides que desenhou um índio não tão bondoso, nem tão velho, quanto o Santa Claus, descalço, com figurino de tanga, cocar, tornozeleiras e braçadeiras de penas, carregando nas costas um jamaxin (cesto) contendo presentes, na mão um cavalinho de madeira.   

Essa “viagem” do Vovô Índio durou um par de anos, mas, perdurou nas colunas dos jornais e revistas por duas ou três décadas, volta e meia alguém lembrava do Vovô Índio, cada vez mais desacreditado pelo rádio e pelo comércio.

O ilustrador e caricaturista baiano Cicero Valladares refletia: “É melhor continuar o Papai Noel o seu domínio do mundo infantil. Deixemos o bom velhinho em paz” e sugeria que o Vovô Índio poderia ser um substituto do Rei Momo: “Um Deus baco brasileiro, ébrio de vinho, de tanguinha com os olhos alucinados de sátiro e a boca espumando lascívia”. A também baiana Edith Mendes de Gama Abreu considerou a ideia de Carvalho uma estultice e indagava:  “Trocar o velhinho encanecido na semeadura da bondade... por um índio que sonhará...os festins canibalescos de sua mocidade?”.  

A escritora Raquel de Queiroz entrou no debate sugerindo resgatar algumas tradições natalinas, “sem chegarmos a improvisações xenófobas como aquela bobagem do Vovô Índio, posto no lugar do Papai Noel”. Já, Gilberto Freire se posicionou contra “um agreste” Vovô Índio: “seria uma explosão de nativismo cru, ingênuo e ridículo, semelhante aqueles patriotas dos começos do século XIX que andaram querendo opor ao vinho do porto, o aguardente de cana... O que entretanto é possível fazer, sem ridículo...é abrasileirar-se o velho Noel numa figura que se harmonize com o clima tropical do Brasil”. E concluía: ‘Que continue a tomar corpo entre nós o Papai Noel já que assim o deseja a maioria da gente brasileira”.