Para fabricar um Fórmula 1, Renault utiliza impressoras 3D e um supersimulador

CORREIO passou um dia na fábrica de carros de Fórmula 1, na Inglaterra; conheça curiosidades

Publicado em 16 de março de 2019 às 10:32

- Atualizado há um ano

. Crédito: Fotos: Renault

O dia começou cedo na França, antes das 5h da manhã. Às 6h, saímos do Aeroporto Charles de Gaulle, em Paris, com direção a Heathrow, em Londres. O voo é curto, mas, diferente do que acontece em outros países da União Europeia, é preciso passar pela imigração e justificar a entrada na Inglaterra. 

De lá, mais uma hora na estrada para chegar até Enstone, cidade onde fica a sede da Renault Sport F1. No caminho, depois de um trecho de rodovia, um percurso mais sinuoso cercado de fazendas - a impressão era que o motorista havia errado o caminho. Enfim, às 10h30, chegamos ao quartel geral da escuderia, passamos pela entrada principal até chegar em um portão de acesso - parecido à entrada de uma Batcaverna.

Nessa recepção estava exposto um Lotus, antiga dona desta fábrica, com o leiaute que a Renault usou na temporada 2018. Depois de conferir, e pegar no bólido, fui até o canto direito. Lá estava o troféu  da temporada 2006. Neste momento, o pessoal da organização nos chamou para uma apresentação. Foi o momento do fã de corridas se concentrar no trabalho.

Presente e Futuro Enstone voltou a ser a sede da Renault F1 no fim de 2015, depois de passar alguns anos abrigando a Lotus. Atualmente, a fábrica conta com aproximadamente 700 colaboradores - de mais de 20 países -, que cuidam de todas as operações relacionadas ao monoposto: desenho dos chassis, da suspensão e do câmbio. O motor continua sendo responsabilidade da unidade francesa de Viry-Châtillon.  Algumas partes do F1 são moldadas manualmente Diversas peças são produzidas em impressoras 3D A primeira impressão ao começar a conhecer o local é que estamos em um laboratório. Mas não foi apenas uma associação ao acaso. Depois de utilizadas em testes e corridas algumas das 14 mil peças que compõem o carro passam por raio x e ressonância. O objetivo é acompanhar a resistência e verificar se sofreram alguma fissura ou desgaste prematuro.

Em vez de faíscas, comuns em linhas de montagens de carros de passeio, muita cola. Mais de 80% de um carro de F1 é colado! Isso acontece porque a maior parte do bólido é formada por fibra de carbono, um  material leve e resistente. Em vez de soldado, ele é colado formando uma estrutura única.

Para criar, moldar e aperfeiçoar cada peça, a impressão 3D é muito utilizada. Uma máquina (são quatro na fábrica) imprime cerca de 600 peças por semana. O desenho é feito por um laser, que seca e endurece no formato desejado, em camadas de 0,4 milímetros. A maioria é utilizada para testes de aerodinâmica, mas já há entre 100 e 120 peças que são impressas e usadas diretamente no F1. 

“Com a impressão 3D, não há mais limites para a criação. As máquinas conseguem fazer desenhos com formas e precisão antes impossíveis na usinagem de metais”, explicou Rod White, diretor de operações da fábrica da Renault Sport Racing.

A empresa limita a captação de imagens em diversos setores e em alguns momentos é preciso esperar para entrar em determinado ambiente. Um dos mais protegidos é o túnel de vento, uma instalação que tem por objetivo simular para o efeito do movimento de ar sobre ou ao redor do carro. Com orçamento de 300 milhões de euros, o equivalente a R$ 1,3 bilhão, a Renault poderia até construir um equipamento em tamanho real.

No entanto, para limitar os custos e permitir que equipes menores também tenham um túnel destes, a Federação Internacional do Automóvel (FIA) estabeleceu que seja usado um carro em escala 60% do real. A entidade máxima do automobilismo, também impõe algumas regras: nele se aplica um fluxo de ar a 50 km/h para verificar a aerodinâmica do carro, a altura do veículo e a deformação dos pneus, entre outras análises. 

O túnel não pode ser utilizado a qualquer momento: seu uso é limitado a 65 testes por semana de até 15 minutos cada. O ambiente é controlado por câmeras e auditado pela FIA. Para ampliar os conhecimentos sobre aerodinâmica, a Renault e a Boeing são parceiras em estudo e desenvolvimento.

Real e virtual Para simular as pistas dos circuitos onde vai correr, a Renault utiliza  um supervideogame e alguns equipamentos físicos. Para ajustar a  suspensão, por exemplo, o carro fica posicionado sobre apoios móveis que são capazes de simular as condições do asfalto de cada autodrómo, do piso de rua de Mônaco  até o circuito de Interlagos.  No simulador, que conta com volante, pedais e câmbio, os engenheiros podem reproduzir diversas situações Assim são recriadas situações tendo como referência sempre a melhor volta de um piloto da escuderia. É um ponto estratégico para o desenvolvimento por antecipar todos os esforços aos quais a suspensão será submetida. 

Em outro setor fica um supersimulador. Nele, a parte do carro onde o piloto viaja é instalada em frente a uma tela gigante. É uma fusão entre o real e o virtual. O objetivo deste equipamento ultrarrealista não é somente o treinamento do piloto. Ele é idêntico ao de um F-1 de verdade: volante, câmbio e pedais respondem da mesma forma. Os engenheiros podem programar diversas situações (tanque cheio ou vazio, pista molhada etc.) e até testar virtualmente novos aerofólios – sem precisar fabricá-los. Sob o carro, ficam 12 braços mecânicos que movimentam o cockpit em todas as direções, para reproduzir a sensação que o piloto tem ao acelerar, frear e fazer curvas. As funções do volante são ajustadas para cada piloto  O equipamento pode chegar a 50 mil euros (Foto: Acervo Pessoal) Por fim, outro local que impressiona é o Race Control, uma sala onde 25 pessoas acompanham em tempo real os treinos e a corrida desde a quinta-feira até o domingo de corrida. Por meio de visores e rádios, eles têm acesso à comunicação do piloto com os boxes e recebem os dados do carro pela telemetria. Várias telas exibem imagens de diversas câmeras do autódromo e as do próprio F1 da Renault. Assim, a distância, os técnicos desenvolvem estratégias e sugerem mudanças para os engenheiros que estão no circuito.

A temporada 2019 começou neste final de semana e às 2h da manhã a TV Bahia mostra ao vivo a etapa da Austrália, que acontece em Melborne. Este ano, a Renault manteve o alemão Nico Hülkenberg e contratou o australiano Daniel Ricciardo. “Trata-se de um laboratório para as tecnologias de nossos futuros carros de rua. Estamos entrando em uma fase realmente fantástica de nossa participação na categoria”, explica Jérôme Stoll, presidente da Renault Sport Racing, confirmando o compromisso da empresa com a F1. Alguns componentes passam por máquinas de raio X  Na fábrica, os técnicos acompanham os F1 na pista * O jornalista viajou a convite da Renault