Patinha amada: Camaleão completa 41 Carnavais de abadás esgotados

Na série 'Quarentões de Sucesso' conheça a fórmula que mantém acesa a chama dos foliões do bloco que já vendeu 25% dos abadás para o Carnaval de 2020

  • Foto do(a) author(a) Priscila Natividade
  • Priscila Natividade

Publicado em 20 de maio de 2019 às 05:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Divulgação
. por Divulgação

O adesivo da patinha, um abadá guardado de lembrança e uma carteirinha certificando oficialmente a condição de chicleteiro. Que o Bloco Camaleão é o templo de uma legião de fãs que acompanharam a banda Chiclete com Banana e o voo solo do cantor Bell Marques, todo baiano bom de colar na corda, sabe. Mas a história por traz do sucesso deste negócio que começou numa roda de amigos, ele só vai conhecer agora, na terceira reportagem  da série especial Quarentões de Sucesso, em comemoração ao aniversário do CORREIO, que completa em 2019 quatro décadas de circulação.  

E haja Mugegê, Cabelo Raspadinho e Cara Caramba Caraô pra marcar os 41 anos do bloco que resistiu às transformações que o Carnaval de Salvador passou durante todos esses anos e a própria crise do entretenimento que exigiu que o Camaleão bloco, assim como o camaleão bicho, se camuflasse. 

“O planejamento é essencial na estratégia do negócio. Buscamos sempre inovar tendo em vista o próprio fluxo mutante que é o Carnaval. Isso sempre nos guiou e nos desafiou”, afirma o sócio e um dos fundadores do bloco, Joaquim Nery. 

Ao ocupar as primeiras posições na fila do desfile nos circuito oficiais junto a outros blocos tradicionais, como Os Internacionais (Inter) e o Eva, o Camaleão se destacou por profissionalizar o Carnaval de Salvador, tornando o trio não somente um item indispensável para fazer a muvuca toda acontecer, mas também um negócio promissor. 

“Muitas decisões foram tomadas buscando a melhoria nos processos. Não vendemos um bloco, entregamos sonhos, alegria e tratamos tudo com muita responsabilidade”, acrescenta Nery.

Amor perfeito

E o Camaleão ganhou a selva. O primeiro desfile foi em 1979 com o trio Maragós, de Maragojipe, com uma banda do próprio trio. No inicio da década de 1980, o Camaleão montou a Banda Salamandra, por onde passou nomes como Carlinhos Brown e Sarajane. Em 1985, Luiz Caldas chegou ao comando do bloco, bem no auge no fricote.  

[[galeria]]

Em 1989, o Camaleão se apaixonou. O Chiclete com Banana tocava no Bloco Internacionais e no último dia do carnaval recebeu um recado pedindo para que a banda não renovasse  o contrato antes de conversar com a diretoria do Camaleão. É o que conta o tecladista, Wado Marques. 

“Dito e feito. Marcamos um jantar num restaurante no bairro da Graça e lá recebemos a proposta.  Foi meio problemático porque a diretoria dos Internacionais não admitia a nossa saída. Mas com jeito e sem briga fomos ajustando as coisas e daí passamos para o Camaleão”. 

A parceria deu muito certo, como destaca Wado: “Uma grande parte dos associados dos Internacionais migraram para o Camaleão que também já tinha uma boa quantidade de associados. Foi o primeiro passo para uma longa parceria que se transformou em amizade e objetivos comuns. Naquele Carnaval o mundo conspirou a nosso favor”. 

O Bloco se tornou um sonho de consumo entre os foliões. Os abadás eram os mais caros e disputados da folia. A patinha do Camaleão grudou feito tatuagem e no corpo de alguns acabou se tornando tatuagem mesmo.   

“O Camaleão entrega sensações difíceis de descrever, só quem participa do bloco é capaz de sentir e se emocionar. E a paixão vicia”, analisa Nery, que pontua também a importância da marca na construção do vínculo: “O publicitário Pedrinho da Rocha foi genial ao  criar uma marca que comunica a força e ao mesmo tempo a leveza que é o Camaleão. A identidade visual foi essencial para estabelecer o vínculo emocional. Somos apaixonados pelo que fazemos e isso transparece para o folião”.

Voa voa

Sintonia entre o bloco e a banda, abadás esgotados meses antes do Carnaval. Não era um amor de verão. A coisa tinha ficado séria. Até que no final de 2013 o então vocalista do Chiclete com Banana - e não por um acaso ícone do Camaleão - Bell Marques decidiu sair em carreira solo. 

“Eles tinham duas opções e escolheram a que acharam melhor. Imagino. Apenas imagino, que eles não gostariam que tivesse acontecido. Mas foi muito bom viver os carnavais que vivi com o Camaleão”, opina Wado Mar ques, que permaneceu no Chiclete, assim como boa parte dos músicos da formação original da banda. 

Entre as duas opções que o bloco tinha ficou com o cantor Bell Marques, que completou 30 anos puxando o Camaleão. “O bloco soube se manter relevante, sem baixar a cabeça e nem se assustar com as mudanças. Isso é muito bacana”, considera o artista, que reconhece a importância da agremiação para a sua carreira. “É uma grande responsabilidade entregar minha música como garantia da diversão de quem compra o Camaleão todo ano”, diz. 

Para Nery, o poder está na bandana. “O casamento do Camaleão com o cantor Bell Marques, que tem dentre as inúmeras qualidades carisma e competência na condução do desfile, foi essencial para destacar o Camaleão no cenário baiano e nacional”. 

Seja Chiclete sem Bell ou Bell sem Chiclete, fato é que o Camaleão segue no circuito por mais 40 anos. O bloco chega a vender aproximadamente 3 mil abadás por dia de desfile. Cerca de 25% das fantasias para a folia de 2020 já estão vendidas. “Quem fez e faz a história do Camaleão é o folião. E a gente vai chegar a mais 40 anos com muito trabalho, capital humano competente, respeito e muito amor pelo que se faz”, enfatiza Nery. 

Este conteúdo faz parte do projeto Correio 40 anos, que tem oferecimento do Bradesco, patrocínio do Hapvida e Sotero Ambiental, apoio institucional da Prefeitura Municipal de Salvador e apoio de Vinci Airports, SESI, Salvador Shopping, Unijorge, Claro, Itaipava Arena Fonte Nova, Sebrae, Santa Casa da Bahia. 

SEGREDO DO SUCESSO 'O folião/ cliente é a prioridade', afirma Joaquim Nery (Foto: Evandro Veiga/ CORREIO) O Camaleão foi criado por Joaquim Nery e seus irmãos Marcelo e Adolfo, além de Geraldo Albuquerque, e eles precisaram de muito mais que animação para colocar o bloco no circuito. “Fomos o primeiro bloco de Carnaval a planejar e fazer as contratações do desfile do ano seguinte logo após a Quarta-feira de Cinzas, a criar espaços publicitários no trio, a possuir uma estrutura de segurança organizada”, afirma Joaquim Nery. 

Segundo ele, é justamente nesta profissionalização que está o segredo do Camaleão. O bloco adquiriu em menos de dois anos de fundação o seu primeiro trio, criou marca, fez carnê de pagamento para os associados e também criou os comissários para divulgarem o bloco. “Para muitas pessoas, viver a experiência que é o Carnaval de Salvador é viver pelo menos um dia de Camaleão e isso só foi possível através de muito trabalho, pioneirismo e decisões inovadoras, essenciais para a construção da marca”. 

Enquanto muita gente segue ali atrás do trio como se não houvesse Quarta-Feira de Cinzas, o desafio do bloco está em proporcionar todo ano uma experiência nova. “A principal inspiração é a inovação. Como fazer um desfile diferente a cada ano, com o mesmo formato e no mesmo local, proporcionando uma experiência diferenciada, onde o folião termine o Carnaval com o desejo de participar no ano seguinte? É isso que nos dá o fôlego para trabalhar o ano inteiro. O folião/cliente é a prioridade”, completa. 

'NÓS FOMOS CONSTRUINDO NOSSA HISTÓRIA JUNTOS' 'Sem falsa modéstia, minha carreira sempre teve muita credibilidade', destaca Bell Marques (Foto: Betto Jr./ CORREIO) Bandana na cabeça, shortinho jeans rasgado, uma guitarra na mão e Bell Marques se transformou ema espécie de entidade para a a história do Bloco Camaleão. Há 30 anos no comando do bloco - a maior parte deles com a banda Chiclete com Banana - o cantor tem uma relação simbiótica com o bloco.

“Não conseguiria escolher uma palavra apenas, mas acho que ‘emoção’ é uma que traduz muito meu sentimento quando penso no Camaleão. Vivi muita coisa fantástica puxando esse bloco”, conta Bell, que saiu há 6 anos do Chiclete, mas não desgrudou do Camaleão. 

“Sem falsa modéstia, minha carreira sempre teve muita credibilidade e, atrelada a isso, a credibilidade do Camaleão se fortaleceu”. Bell conversou com o CORREIO  e trouxe mais alguns detalhes desta história ‘raiz’ e ‘das antigas’. Veja na entrevista: 

Quarenta e um carnavais do Camaleão, 30 no comando do bloco. Como o Camaleão chegou até aqui? 

Eu acredito que o comprometimento dos sócios e a seriedade com que levaram o negócio desde sua criação. Por mais que tenha começado de forma mais lúdica entre amigos, os donos do Camaleão sempre prezaram pela qualidade e pelo diferencial que poderiam oferecer. Isso fortaleceu a marca, que passou a ser referência.

O que mais marcou neste período? 

Eu acho que o respeito que sempre tiveram comigo é uma grande marca da minha história com o Camaleão, desde o começo. Somamos um ao outro e isso é resultado de muito carinho nestes 30 anos.Fiz grandes amigos e é como uma grande festa, literalmente, estar no trio do Camaleão todos os anos.Muito já foi dito sobre a crise do entretenimento e do Carnaval na Bahia, o que exigiu reformulações. Como o Camaleão atravessou esse processo, mesmo com a sua saída do Chiclete com Banana?

O bloco sempre foi um dos mais garantidos em termos de qualidade, serviço e atendimento ao folião. Isso conta muito nos momentos de crise.A ligação afetiva com o bloco, uma história sem arranhões, as histórias que fomos construindo juntos, eu e o folião, isso tudo coloca o Camaleão como primeira opção. Acho que o segredo, se é que é segredo, é esse.O Carnaval pipoca cada vez mais ganha  maior espaço nos circuitos. Qual o grande desafio para blocos como o Camaleão chegarem a mais 40 Carnavais?

Como em qualquer empresa, é se destacar e se diferenciar no mercado. O Camaleão não poupa esforços para manter o clima de segurança do folião e para garantir um Carnaval de qualidade, de tranquilidade, com bons serviços e som de qualidade para quem compra o abadá.

Como você enxerga o Camaleão daqui a mais 40 anos?Eu acho difícil que seja comigo, mas quem sabe? (risos). Eu percebo uma renovação muito bacana do público, muitos foliões jovens, em seus primeiros carnavais.Isso é muito bacana, porque prova que o bloco se manteve bem visto, desejado e cria possibilidades reais dele manter um status nos próximos 40 anos. A marca tem uma grande força para isso. 

MUDANÇAS

Até  1988 O bloco adquiriu seu primeiro trio e começou a profissionalizar o negócio Carnaval. 

1989 - 2000  No auge da axé music, a Banda Chiclete com Banana começou a puxar o Camaleão. O bloco  foi o 1º a vender espaços publicitários.  

2001 - 2013  Bell se separa do Chiclete, mas o bloco seguiu esgotando os abadás. 

2014 a 2019  Camarotes e trios sem corda ganham força, mas o Camaleão  mantem a aposta no Carnaval de bloco.