Peça de edital

Por Aninha Franco

  • D
  • Da Redação

Publicado em 6 de outubro de 2018 às 05:00

- Atualizado há um ano

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Como a sociedade está muito distante da vida artística brasileira, explicarei o título da trilha, peça de edital, com a observação de que nem só o teatro está vivendo isso no Brasil contemporâneo. Todas as linguagens artísticas estão submetidas aos editais, mas como teatro é uma linguagem que exige inteligência para dialogar com os espectadores, como a política, a eleição de amanhã se assemelha a um edital cênico.

A redemocratização reuniu artistas e espectadores até a chegada do PT ao poder, em 2003. É só conferir a vida artística do Brasil nos anos 1990. Quando o PT chegou ao poder, impôs aos artistas a armadilha de que era necessário acabar com o “toma lá dá cá” do neoliberalismo de FHC através de editais. Armada a treta, o lulopetismo montou o “só dou aos meus”, um esquema de controle ideológico da produção artística com verba pública, controlando as comissões que selecionam e premiam “os artistas”. O lulopetismo é fortemente stalinista.

Com a colaboração de centenas de artistas que deveriam registrar o espírito da época mas aceitaram participar desse negócio horrível, a coisa está acontecendo. Sem espectadores. As comissões dos editais escolhem, sempre, os “amigos do rei”, aqueles que garantem o figurino de sua nudez, os espectadores afastaram-se dos resultados dos editais e ser artista, no Brasil, voltou ao que Dercy Gonçalves denunciava dentro e fora dos palcos: são quase todos putas.

Saindo dos editais artísticos e entrando no edital eleitoral de amanhã, imposto por uma política controlada por partidos corruptos, e votos comprados por bolsas corrompíveis, os amigos me perguntam em quem votarei. Sem esses partidos horrendos manipulando urnas, seria fácil responder. Voto nesse ou naquele candidato com projetos interessantes para essa ou aquela área e se ele vencer os projetos farão um país melhor. Mas sou brasileira, moro neste país lindo onde se destrói a cultura com verba para fomentá-la, e devo votar amanhã no menos pernicioso à sociedade.

Durante a ditadura, fui presidente de sessão eleitoral nalgumas eleições e nelas votava nulo porque voto e ditadura são ações irreconciliáveis. Numa democracia devo votar e, de antemão, anular os dois protagonistas da eleição de edital. Não posso votar num candidato que nos últimos dias foi quatro vezes à cela do candidato real, preso por corrupção e lavagem de dinheiro, buscar orientação. Votando em Haddad, voto em Lula e na implosão do Brasil, com possibilidade de impeachment. Já posso ouvir Dona Bezerra gritando “é gorpi” e assistir Jaques Wagner fazendo a coreografia de “Lula Live”.

Por isso, não conseguiria votar em Haddad ou Bolsonaro e conviver comigo a partir de segunda-feira. Haddad porque seu partido apodreceu. Bolsonaro porque só temos em comum o antipetismo, por motivos diversos. Não quero Ciro porque Ciro é Haddad e Haddad é Lula e Lula, Haddad, Boulos e essa esquerda de peça de edital pode estragar o resto da minha vida que prefiro agradável, mesmo morando no Brasil. Portanto, neste edital em que o PSDB desminlinguiu, o PMDB desminlinguiu, o PT enveredou pela criminalidade, os piores são candidatos a vencedores. Mas sem o meu voto.

Existem os candidatos, Álvaro Dias, Amoedo, que fariam governos normais, essenciais a um Brasil doente, mas eles não têm chance de ganhar o edital de cartas ensandescidas. Por isso, voto no candidato que expressa melhor o momento em que vivemos, Daciolo, como nós perseguido pelos demônios que sufocaram a política brasileira.