Pedra de Xangô é símbolo de luta pelo direito à cidade para população negra

Monumento tombado pela Fundação Gregório de Mattos foi tema de live nesta quarta (24)

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  • Vinicius Nascimento

Publicado em 24 de fevereiro de 2021 às 20:49

- Atualizado há um ano

Xangô é Justiça. Justiça, respeito, reconhecimento e direito à memória são pautas pelas quais o povo de santo luta há anos. A Pedra de Xangô, patrimônio de Salvador tombado em Cajazeiras, ´eum dos símbolos desta luta. Nesta quarta (24), ela foi tema da edição 2021 do evento "Patrimônio É..." da Fundação Gregório de Mattos, que discutiu a importância do espaço, de sua preservação e como toda essa batalha por reconhecimento simboliza a busca pelo direito à cidade por parte da população negra e religiões afro em Salvador.

O evento virtual teve a participação de Ìyá Márcia d'Ọ̀gún, Ìyalọ̀ríṣá do Ìlẹ̀ Àṣẹ Ẹwà Ọ̀lódùmarè, Professora Mestra e conselheira do Conselho Municipal de Política Cultural; de Leonel Monteiro, presidente da AFA – Associação Afro-Ameríndia; de Pai Barosi de Ode, líder religioso do Ilê Axè Ode Aty Ya Re, em Cajazeiras XI; Fábio Velame, Doutor e Mestre em Arquitetura e Urbanismo pelo PPGAU-UFBA; e do vereador e ex-secretário da SECIS - Secretaria Municipal de Sustentabilidade, Inovação e Resiliência e André Fraga. Todo esse time foi mediado por Gabriella Melo, historiadora e gerente de Patrimônio Cultural da FGM.

O professor Fábio Velame declarou que falar de ireito à cidade é falar de direito à memória, existencia e presença negra na cidade de Salvador. De acordo com Velame, a história de Cajazeiras sofre de um apagamento histórico cruel. Ignora-se todas as tribos indígenas, principalmente tupinambás, e quilombos de escravizados fugidos instalados naquele lugar e toma-se os anos 1970 como ponto de partida de sua história, quando o local foi apropriado pelo governo do Estado para se transformar no ‘Plano Urbanístico Integrado Cajazeira/Fazenda Grande’, construído como um grande último programa habitacional com cerca de 20 mil unidades para famílias de baixa renda da época.

"Essa é uma perspectiva extremamente eurocêntrica e que precisa ser revista. Iniciativas como o tombamento da Pedra de Xangô e a construção do seu Parque dão aos povos de matriz africana, aos negros e indígenas o direito de estar ali na história daquele lugar", afirmou.

A Pedra de Xangô, símbolo sagrado e elemento cultural afro-brasileiro, localizada na Avenida Assis Valente, em Cajazeiras, tem recebido cuidados constantes através de ações promovidas pela Prefeitura. Tombada em maio de 2017, por meio da Fundação Gregório de Mattos (FGM), a pedra é patrimônio cultural do município.

Por meio da Secretaria de Sustentabilidade, Inovação e Resiliência (Secis), o local passou a fazer parte da Área de Proteção Ambiental (APA) do Vale da Avenida Assis Valente e Parque em Rede Pedra de Xangô, que criou o projeto Parque Pedra de Xangô, fruto de uma antiga demanda da comunidade de Cajazeiras e das religiões de matriz africana. A ordem de serviço para a execução da obra de implementação foi assinada em fevereiro de 2020. 

Para Leonel Monteiro, presidente da Associação Afro-Ameríndia (AFA), uma das entidades que solicitaram o tombamento da Pedra de Xangô, o reconhecimento como patrimônio cultural do município é o principal instrumento para preservação dos sítios religiosos, arqueológicos e culturais da cidade. 

“Por isso solicitamos à Prefeitura o tombamento da pedra e de todo seu entorno. Isso ajuda a preservar o patrimônio natural, religioso e cultural da nossa cidade. Até porque para que seja realizado o tombamento precisa ser traçado uma poligonal. Dentro dela, tudo que ali estiver contido, nós e o poder público temos a obrigatoriedade de preservar na sua originalidade. Como é um monumento natural, entendemos e fizemos esforços para que toda a área que ainda há algum manancial aquífero e de vegetação se transformasse em uma área de proteção ambiental através do parque”, detalhou.

Atualmente, a Pedra de Xangô, que é um importante símbolo cultural e religioso de Salvador, está envolvida por uma vegetação remanescente de Mata Atlântica. Com a construção do parque, o objetivo é que a estrutura seja preservada. A obra é um pedido antigo de estudiosos e adeptos das religiões de matriz africana.

No novo espaço, haverá exposições com elementos simbólicos das religiões de matrizes africana e indígena, trilhas a céu aberto e anfiteatro, tudo feito com materiais de baixo impacto ambiental e alto valor ecológico. Também estão previstos auditório, área administrativa, sanitários e estabelecimentos comerciais voltados para o parque. Além disso, o projeto propõe trazer de volta o espelho d’água que ficava ao redor da pedra.

A área das intervenções urbanísticas envolvem 67.163,06m² e contemplam a  criação da via de monitoramento e o desvio da Avenida Assis Valente. Estão previstos também serviços de terraplanagem, drenagem, pavimentação do sistema viário e da praça, paisagismo, construção de arquibancadas, escadas, pontilhões e vertedouro, além da instalação de equipamentos e mobiliários urbanos.

O Parque foi criado no Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano (PDDU) de 2016, por sugestão da Secretaria Municipal de Sustentabilidade, Inovação e Resiliência (Secis). Ex-titular da pasta, o vereador André Fraga afirma que desenvolver um parque é um projeto muito complexo e lembrou que foi um dos grandes desafios de sua gestão por conta do pouco tempo que teve para encaixar o projeto no PDDU. Concluído o processo, o vereador acredita que o espaço cumprirá um papel cultural e ambiental importante para Salvador.

Assista à roda de conversa na íntegra logo abaixo: