'Pensaram que era tiro', conta passageiro após estouro em trem do Subúrbio

Veículo teve um princípio de incêndio na manhã desta quarta

  • D
  • Da Redação

Publicado em 4 de setembro de 2019 às 17:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Marina Silva/CORREIO

O que era para ser uma simples viagem pela linha férrea de Salvador se transformou em pânico para os passageiros de um dos trens do Subúrbio Ferroviário, que sofreu um princípio de incêndio na manhã desta quarta-feira (4). A bordo de um dos vagões, estava o agente marítimo Walter Santos, de 64 anos.

Ele, que tinha ido visitar um amigo no bairro de Periperi, pegou o trem no próprio bairro e seguiu para a Estação Calçada, onde pretendia pegar um ônibus para o bairro de Brotas, onde mora. Só que, ao chegar na Estação do Lobato, a viagem virou um grande transtorno, após um forte estouro no veículo.

“O trem deu dois sinais de que estava com algum tipo de problema. Ele tentou sair da plataforma duas vezes e não conseguiu, aí na terceira ouvimos um estouro, ficou todo mundo desesperado. Muitas pessoas pensaram que era tiro, foi uma gritaria, parecia que o mundo estava acabando”, contou.

Walter estava no vagão da frente quando sentiu um forte cheiro de fumaça vindo dos vagões de trás. Quando o trem deu os dois sinais de que estaria com algum problema, ele ainda tentou sair da estação, sem sucesso. Na terceira falha, o passageiro ouviu o pipoco. 

“O trem estava cheio, socado de gente como sempre. Não cheguei a ver o fogo, mas vi a fumaça e ouvi toda a gritaria. Todo mundo começou a descer correndo, aí eu desci também”, relatou.

Ao CORREIO, Walter contou que essa já é a segunda vez que ele passa por um problema desse tipo dentro de um trem do Subúrbio Ferroviário. Há dois meses, entre as estações de Coutos e Paripe, o vagão em que estava apresentou as mesmas falhas e ele foi obrigado a descer depressa do trem.

“Nessa situação o trem também parou, as pessoas começaram a pular no meio do caminho. Foi um susto, muita gritaria. A mesma coisa que aconteceu hoje”, lembrou o passageiro, que revelou já estar acostumado com esse tipo de situação, que segundo ele é esperada pelo mau estado de conservação dos trens.

"Já me acostumei com isso, mas acho que deveria ter uma melhora nesses trens. Sempre tem alguma coisa diferente, é um sufoco para os passageiros", desabafou.

Não bastasse o susto que Walter tomou, a família dele também ficou desesperada. Depois do princípio de incêndio, Walter notou que estava com o celular descarregado e não havia avisado aos parentes que estava bem. Ele só conseguiu ligar para os familiares quando embarcou em um ônibus para retomar seu itinerário.

Não bastasse o susto que Walter tomou, a família dele também ficou desesperada. Depois do princípio de incêndio, Walter notou que estava com o celular descarregado e não havia avisado aos parentes que estava bem. Ele só conseguiu ligar para os familiares quando embarcou em um ônibus para retomar seu itinerário.

Preferência pelo trem Desempregada, Antônia Denise, 62, recorre ao trem para poder ir até as Obras Sociais Irmã Dulce para fazer fisioterapia duas vezes na semana. Por ter mais de 60 anos e possuir gratuidade, ela tem que usar o modal para se locomover.

“Eu não posso pagar R$ 8 de ônibus por dia. Eu não tenho condições de pagar o ônibus, senão não viria fazer fisioterapia na Dulce. Eu venho de trem e vou andando até as obras porque não posso pagar transporte”, explicou.

É por esse motivo que Antônia usa o trem, mesmo sabendo que o modal pode quebrar durante a viagem. “O serviço não está bom. Às vezes, a gente nem pode contar com ele porque o trem quebra. Às vezes, está no meio do caminho quando quebra”, contou.

A passageira disse ter passado por uma situação parecida a que aconteceu no trem nesta quarta. “Há uns dois anos, eu estava no trem e teve muita fumaça, mas não chegou a ter fogo. Parecia que tinha dado um problema no freio, ficou com umas marcas no trilho. Todo mundo desceu na estação”, relembrou. Trem sofreu princípio de incêndio nesta manhã (Foto: Marina Silva/CORREIO) Má conservação De acordo com Manoel Cunha, diretor administrativo do Sindicato dos Trabalhadores em empresas de Transportes Ferroviário e Metroviário dos Estados da Bahia e Sergipe (Sindiferro), após os recentes casos de falhas nos sistemas dos trens a categoria iniciou discussões com o Governo do Estado sobre a situação dos equipamentos. Eles alegam que o mau estado de conservação coloca em risco a vida dos trabalhadores e dos passageiros.

“São trens da década de 50 ou mais antigos, que eram trazidos do Rio de Janeiro para substituir os que estavam aqui. Estão em final de carreira, pois se trata de um transporte precário, muito antigo, que pode colocar a vida de mais pessoas em risco. Situações como essas de hoje são rotineiras e podem ser evitadas com a troca por veículos novos. O povo do Subúrbio merece um sistema de transporte novo”, disse.

Em nota, a Companhia de Transportes da Bahia (CTB/Sedur) informou que houve o estouro de um fusível de alta tensão, que fica na parte externa do trem, ocasionando uma pequena explosão com o trem parado. Em maio deste ano, um fusível já havia explodido enquanto passava pela estação Santa Luzia do Lobato. Em outubro de 2018, o equipamento elétrico de alta tensão estourou ao chegar na estação Paripe.

"A situação assustou os passageiros que saíram do trem, a maioria pela porta com acesso à plataforma, outros pelo lado oposto. Durante o desembarque pelo lado oposto, duas mulheres se machucaram de forma superficial, mas sem gravidade. Outras duas passageiras se sentiram mal recebendo imediato atendimento", informou a Sedur, em nota.

De acordo com informações da Secretaria de Segurança Pública da Bahia (SSP), integrantes do 1º Grupamento de Bombeiros Militar (GBM/ Barroquinha) e da 14ª Companhia Independente de Polícia Militar (CIPM/ Lobato) prestaram os primeiros atendimentos aos feridos e duas viaturas de Auto Busca e Salvamento foram deslocadas para o local.

A Companhia de Transporte do Estado da Bahia (CTB) afirma que a idade dos trens - mais de 50 anos - dificulta a manutenção do sistema. Segundo a estatal, que é vinculada à Secretaria de Desenvolvimento Urbano do Estado da Bahia (SEDUR), as peças de reposição não são encontradas no mercado.

“Ainda assim, a CTB promove a manutenção sistemática dos trens com equipe própria e com empresa especializada contratada mesmo com toda escassez de disponibilidades de peças, o que torna o sistema atual oneroso”, ressaltou a empresa, sem especificar a quantia utilizada para fazer a manutenção dos trens. A CTB ainda informa que o sistema possui 4 trens operando em um sistema de rodízio com dois por vez em operação.

O trem opera de segunda a sábado, sempre com um intervalo de 40 minutos entre os veículos. Com uma média de 10 mil passageiros por mês, o modal ainda sofre com o vandalismo e a deficiência da drenagem pública municipal, aponta a empresa. “Esses e outros problemas contribuem significativamente para a retirada dos trens de circulação e consequente redução de oferta viagens”, afirmou a CTB ao CORREIO. 

Em 2013, a empresa que oferece o serviço passou da tutela municipal para ser vinculada a Sedur estadual. A passagem custa R$ 0,50. O sistema possui 10 estações e um trajeto de aproximadamente 13,5 km entre os terminais finais, localizados nos bairros da Calçada e Paripe.

VLT A Companhia de Transportes da Bahia (CTB) destacou também que realiza cotidianamente a limpeza e manutenção do Sistema Ferroviário do Subúrbio de Salvador. Lembra ainda que o atual sistema será substituído em breve, com a futura entrada em operação pelo Veículo Leve de Transporte (VLT) que já teve o seu projeto conceitual entregue ao Governo do Estado, seguindo o cronograma de implantação do sistema, desenvolvido pelo Consórcio Skyrail Bahia.

O novo modal terá 20 km e 22 estações, ligando o bairro do Comércio, em Salvador, até a Ilha de São João, em Simões Filho. As obras estão previstas para começar ainda em 2019.

* Com orientação da chefe de reportagem Perla Ribeiro