Pesca e turismo começam a sofrer impactos do óleo em Abrolhos

Atividades são fundamentais para a economia da região

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  • Da Redação

Publicado em 5 de novembro de 2019 às 04:30

- Atualizado há um ano

. Crédito: Ibama/Divulgação

Apesar do óleo causar efeitos visíveis no mar e nas praias, os impactos da chegada do petróleo cru se expandem por toda uma cadeia produtiva. Na região de Abrolhos, a vida marinha depende dos bancos de corais e mangues. Com a chegada do óleo, a biodiversidade da região pode ser afetada.

Segundo o professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro e coordenador da rede abrolhos, Rodrigo Moura, Abrolhos é a região que mais produz pescado no Nordeste. Essa grande produção é relacionada justamente aos recifes de corais e mangues na região.

“Uma parte da diversidade dos recifes de corais depende dos mangues. Muitos dos peixes do recife de coral ocorrem no mangue quando estão jovens. Eles não podem ser visto como uma entidade isolada”, disse o coordenador.

Junto com o turismo, a pesca é uma das atividades mais importantes para o sustento da região. Em Caravelas, de onde saem os barcos para o Parque Nacional Marinho de Abrolhos, as operadoras do passeio estão paradas desde o último domingo (3), quando as visitações ao arquipélago foram suspensas.

Os resíduos devem ser removidos rapidamente para não contaminar progressivamente o ecossistema, disse o coordenador. Para ele, a população corre risco de perder a principal atividade econômica. “Isso [a contaminação] coloca sob risco o setor pesqueiro. Se o peixe se torna inadequado para o consumo, não tem outro meio de vida. Sem falar no turismo, que é muito importante para a região”, afirmou.

A secretária de turismo de Caravelas, município no Extremo Sul do estado, Leila Borges, afirmou que cerca de sete operadoras oferecem a visita ao parque. Mesmo sem saber os valores reais, ela acredita que o prejuízo é grande. “As embarcações são grandes e têm todo um atendimento, até com comida. E tem as pessoas que trabalham nas empresas”, relatou.

O superintendente do Ibama, Rodrigo Alves, informou que as praias foram limpas de prontidão desde que as primeiras manchas apareceram no arquipélago, no último sábado (2). Ainda de acordo com Alves, novas manchas não atingiram na região nos últimos dois dias.

Já o coordenador da Rede Abrolhos afirmou que vários fragmentos de óleo chegaram à região. Moura informou que a limpeza se concentra nos fragmentos maiores, entretanto, ainda não foram feitas medidas de mais refino para impedir a contaminação do ecossistema, afirmou o coordenador.

“Isso deve ocorrer num segundo momento. Não temos notícias de outras manchas chegando, mas a tendência é que fragmentos continuem chegando nos próximos dias. O evento ainda está em andamento”, pontuou.

O coordenador geral do projeto Baleia Jubarte, Eduardo Camargo, afirmou que em toda região foram identificados pequenos fragmentos de 2 a 10 cm. “Tem uma equipe enorme lá para retirar o óleo. Comparado com o litoral norte, tem muito pouco óleo. Nossa apreensão é com a dúvida do que pode vir”, disse. 

Banco de Abrolhos Apesar da mancha de óleo ter chegado no Arquipélago de Abrolhos no sábado, a região do banco de Abrolhos, que é conhecida como uma área chave para a proteção da biodiversidade, foi atingida na quinta-feira (31).

Por isso, o coordenador da Rede Abrolhos aponta que é necessário proteger todo a região, não apenas concentrar as ações no Parque Nacional. “O Parque é muito importante, mas ele é conectado com outros ecossistemas. É necessária a integração de ações para não ficar só no parque”, disse.

Mesmo com a preocupação com o Parque, Moura acredita que o governo pode tomar outras decisões para conter a contaminação. Segundo ele, foi instalada apenas uma barreira no estuário de Caravelas. “Deveriam ter sido colocadas barreiras de contenção em todas as bocas de rios”, ressaltou.

O Parque Marinho é o maior do Brasil e é na região que fica a maior reserva de corais mais importante da América do Sul, segundo o diretor do Instituto de Biologia da Universidade Federal da Bahia, Francisco Kelmo. Para ele, as atividades de pesquisa também podem ser afetadas pela chegada do óleo. 

“É um ambiente que, embora já conhecemos bastante, ainda falta muito a ser estudado. A região tem características únicas, o que torna ele diferente dos recifes do resto do mundo. O local é um tesouro nas águas do brasil”, pontuou. Segundo o diretor, os corais em formato de cogumelo, chamados chapeirões, só ocorrem na região e tornam o local único.

Estes raros corais de cerca de oito mil anos podem estar em risco. A professora do Instituto de Geociências da UFBA, Zelinda Leão, explicou que os corais da região já estão fragilizados após serem vítimas de branqueamento, devido ao aumento da temperatura da água com o fenômeno do El Niño.

“Aqui teve um branqueamento muito forte, entre março e abril, mas não teve mortalidade em massa até hoje. Quando os corais estão branqueados, eles estão frágeis. Em Abrolhos, eles sofreram branqueamento, o que pode vir a causar um mortalidade em massa”, explicou.

A professora ressalta que os corais formam a estrutura dos recifes de corais, que abrigam muitos organismos. “É comparado com a biodiversidade das florestas tropicais”, apontou Leão. Para ela, o óleo vai atacar um ecossistema que é vivo e se relaciona com uma grande cadeia de seres vivos - desde microalgas até o homem.

A baleia jubarte é um dos animais que recorre ao Banco de Abrolhos para se reproduzir. Normalmente, estes mamíferos estariam na região, mas, neste ano, as baleias se adiantaram e poucos animais permanecem em Abrolhos. “Ainda tem uma ou outra baleia por aí, mas bem menos. Elas optaram por sair mais cedo, então hoje, o óleo não apresenta risco para as baleias”, afirmou o coordenador geral do projeto Baleia Jubarte, Eduardo Camargo.

Nova Viçosa Voluntários da cidade de Nova Viçosa, a penúltima cidade do Extremo Sul da Bahia com litoral antes da divisa com o Espírito Santo, relatam a chegada de pequenas manchas de óleo nas praias de Barra Velha e Pontal da Barra, no município. Desde o último sábado, equipes de limpeza retiram uma pequena quantidade do petróleo cru da costa. O CORREIO tentou contato com a prefeitura do município, mas não obteve sucesso.

Do outro lado da divisa, a cidade capixaba de Conceição da Barra já começou o monitoramento das praias e se prepara para uma possível chegada do óleo. São realizadas capacitações e atividades técnicas para a praias e estuários em todo Litoral do Município.

A Defesa Civil do Estado da Bahia confirma apenas 30 cidades atingidas pelo óleo na Bahia. Segundo eles, a cidade mais ao sul seria Caravelas, que fica antes de Nova Viçosa. Até o momento foram retiradas mais de 400 toneladas das praias da Bahia. De acordo com o Ibama, foram cerca de 4.200 toneladas de resíduos de óleo retirados das praias nordestinas.

*Com orientação da chefe de reportagem Perla Ribeiro