PIB ganha força e cresce 7,7% no 3º trimestre

Desempenho da economia, porém, não eliminou as perdas com a pandemia de covid

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  • Da Redação

Publicado em 4 de dezembro de 2020 às 05:00

- Atualizado há um ano

A economia brasileira cresceu com força  no 3º trimestre do ano. De acordo com dados do IBGE, divulgados ontem, o Produto Interno Bruto (PIB) do país avançou 7,7% entre os meses de julho e setembro, na comparação com os três meses imediatamente anteriores, confirmando a saída do país da chamada "recessão técnica". A alta do período foi a maior registrada desde 1996 - início da série histórica - ou seja, o melhor resultado em pelo menos 24 anos, mas ainda assim insuficiente para recuperar as perdas provocadas pela pandemia. Para a equipe econômica do governo, porém, a alta do PIB mostra a economia "voltando em V" e por isso  o auxílio emergencial não será necessário no ano que vem (leia mais ao lado). 

Apesar da alta, os números do PIB vieram mais fracos do que o esperado. A expectativa do mercado era de um crescimento de 8,8% em relação ao trimestre anterior. O próprio   ministro da Economia, Paulo Guedes, admitiu um PIB um pouco abaixo do esperado. 

Não era surpresa que a economia brasileira registraria recuperação   no 3º trimestre. O forte avanço entre os meses de julho e setembro está diretamente relacionado com a base mais fraca de comparação, devido ao tombo histórico registrado entre abril e junho, que foi revisado para uma queda de 9,6%.  As consequências da pandemia também ficam claras no comparativo anual. 

Em relação ao 3º trimestre de 2019, o PIB registrou uma queda de 3,9%, a terceira retração seguida nessa base de comparação. Já no acumulado dos quatro trimestres terminados em setembro, houve queda de 3,4% frente aos quatro trimestres imediatamente anteriores. 

"Houve uma recuperação no terceiro contra o segundo trimestre, mas, se olharmos a taxa interanual, a queda é de 3,9% e no acumulado do ano ainda estamos caindo, tanto a indústria quanto os serviços. A agropecuária é a única que está crescendo no ano, muito puxada pela soja, que é a nossa maior lavoura”, destacou a coordenadora de Contas Nacionais do IBGE, Rebeca Palis.

Ela conta que no trimestre, a expansão do PIB foi puxada, principalmente, pelo desempenho da indústria, com destaque para o crescimento de 23,7% no setor de transformação. Também houve altas em eletricidade e gás, água, esgoto, atividades de gestão de resíduos (8,5%), construção civil  (5,6%) e indústrias extrativas (2,5%).

“Olhando pela ótica produtiva, o destaque foi a indústria de transformação, até pelo fato de ter caído bastante no segundo trimestre (-19,1%), com as restrições de funcionamento. A indústria cresceu como um todo 14,8%, e a de transformação 23,7%, mas voltamos ao patamar do primeiro trimestre”, analisa Rebeca.

O crescimento do PIB da construção no 3º  trimestre frente ao segundo foi ocasionado pela manutenção dos canteiros de obras abertos durante os oito primeiros meses da pandemia e pela realização de reformas e obras domésticas alavancadas pelo auxílio emergencial, de acordo com avaliação do vice-presidente de economia do Sindicato da Indústria da Construção (Sinduscon-SP), Eduardo Zaidan. "Hoje, a atividade do setor praticamente voltou ao nível existente antes da pandemia", afirmou.

Serviços  Outro destaque foi o setor de serviços, que têm o maior peso na economia, e apresentou crescimento em todos os segmentos: comércio (15,9%), transporte, armazenagem e correio (12,5%), outras atividades de serviços (7,8%), informação e comunicação (3,1%), administração, defesa, saúde e educação públicas e seguridade social (2,5%), atividades financeiras, de seguros e serviços relacionados (1,5%) e atividades imobiliárias (1,1%).

“Os serviços caíram 9,4% no segundo trimestre e agora cresceram 6,3% no terceiro trimestre. Mas não recuperou o patamar do primeiro trimestre, porque houve uma queda tanto na oferta quanto na demanda. Mesmo tendo sido retiradas as restrições de funcionamento, as pessoas ainda ficam receosas para consumir, principalmente os serviços prestados às famílias, como alojamento, alimentação, cinemas, academias e salões de beleza. O desempenho melhorou em relação ao segundo trimestre, mas ainda não voltou aos patamares antes da pandemia”, destacou.

Quanto à variação negativa de 0,5% na agricultura, Rebeca diz se tratar de um ajuste de safra. “O destaque é o crescimento de 2,4% no acumulado do ano, ante uma queda de 5,1% a indústria e 5,3% dos serviços”, diz Rebeca.

Pela ótica da despesa, o que mais pesa é o consumo das famílias (65%), que teve expansão de 7,6%, num patamar muito parecido com o do PIB, destaca Rebeca. Ela observa que o indicador havia caído 11,3% no segundo trimestre, mas no terceiro o consumo de bens subiu bastante – especialmente bens duráveis e bens alimentícios da cadeia agroalimentar. "O consumo de serviços teve crescimento, mas foi bem menor do que a queda anterior, pois as famílias não voltaram a consumir no patamar anterior à pandemia", disse. 

Os investimentos  cresceram 11%. Mas segundo Rebeca esse desempenho está relacionado à base de comparação com o segundo trimestre em que havia caído 16,5%. "No acumulado do ano, a queda é de 5,5%. E o país ainda tem investimento em equipamentos importados e como o dólar está alto, influencia para baixo", diz Rebeca.

No que se refere ao setor externo, as exportações de bens e serviços tiveram queda de 2,1%, enquanto que as importações caíram 9,6% em relação ao segundo trimestre de 2020. Segundo Rebeca, um dos fatores é o câmbio.  “A importação cai devido à baixa atividade econômica e ao câmbio desvalorizado. Por outro lado, a exportação não cresceu devido aos problemas de parceiros comerciais. Além das quedas na importação e exportação de serviços como viagens internacionais, que despencou assim como transporte aéreo de passageiros”, diz.

Renda Para o  diretor de Estudos e Políticas Macroeconômicas do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), José Ronaldo Souza Júnior, a expansão do PIB dependeu muito das políticas de renda adotadas pelo governo para evitar um colapso maior na pandemia. O problema é que essas políticas não podem ter continuidade por causa da sustentabilidade das contas públicas. 

“E a gente vai ter que reagir a essa mudança que possivelmente virá de política de renda”, afirmou José Ronaldo. Para ele, a própria sustentabilidade das contas públicas deve viabilizar uma instituição mais duradoura.

O diretor do Ipea destacou ainda a questão da própria dinâmica da pandemia que, aparentemente, vem aí com números negativos em termos da disseminação da covid-19. Nesse caso, resta saber como isso vai afetar a atividade econômica, disse José Ronaldo.

"O PIB teve uma recuperação no terceiro trimestre muito melhor do que qualquer um imaginava em previsões anteriores. De fato, é uma recuperação bastante forte, comparativamente ao que se previa anteriormente. Este é um ponto bastante positivo", disse. 

Guedes: ‘A economia  está voltando em V’ O ministro da Economia, Paulo Guedes, negou ontem  qualquer frustração com o crescimento aquém das expectativas do PIB no 3º trimestre.  "O sinal mais importante é de que a economia está voltando em V, realmente está voltando", afirmou o ministro durante participação em encontro promovido pela Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC).

Recuperação em "V" é um termo usado por economistas para relatar uma retomada intensa depois de uma queda vertiginosa na atividade econômica. "Temos bons sinais de volta em 'V'. Só os negacionistas refutam a evidência empírica de que a economia voltou em 'V'. Quem tem familiaridade com números e dados entende que voltou em 'V'", assinalou o ministro.

 Guedes disse que a recuperação da economia está sendo generalizada, destacando o desempenho da indústria e dos investimentos no terceiro trimestre. Ele  disse que o PIB caminha para fechar o ano com queda de 4,5%. Ele sustentou que o país vive uma recuperação "cíclica", que deve levar o Brasil a crescer entre 3,5% a 4% em 2021.

O ministro salientou que a recuperação cíclica deve gradualmente dar lugar a uma retomada sustentável, à base de investimentos, na sequência das atualizações que estão sendo feitas em marcos regulatórios em setores como saneamento e gás.  Fim do auxílio Para a Secretaria de Política Econômica do Ministério da Economia, o resultado do PIB (Produto Interno Bruto) no 3º trimestre mostra que a atividade continuará crescendo no final do ano. O órgão afirma ainda que a economia continuará avançando no 1º semestre de 2021 “sem a necessidade de auxílios governamentais”.

“É importante frisar que a retomada da atividade e do emprego, que ocorreu nos últimos meses, compensará a redução dos auxílios. Outro fator positivo será a melhora das condições financeiras que continuarão impulsionando a atividade, principalmente com a retomada da agenda de reformas”, afirma, em nota.

O texto não menciona diretamente o auxílio emergencial pago pelo governo aos mais vulneráveis durante a pandemia –assim como o fez o presidente Jair Bolsonaro no início desta semana ao dizer que prorrogar o pagamento de benefícios é “o caminho para insucesso“.

O governo é pressionado para estender pelos primeiros meses de 2021 o auxílio emergencial. O custo fiscal é alto. Serão desembolsados R$ 321,8 bilhões até o final de 2020 com o programa. Com o fim do benefício, cedido a 67 milhões de pessoas, o governo teme aumento da pobreza. O Ministério da Economia estuda a criação do Renda Cidadã (ou Renda Brasil) para substituí-lo em 2021.