Planejamento municipal e urbano

Os projetistas costumam ver a obra como um fim em si mesmo e não como instrumento de transformação urbana

  • Foto do(a) author(a) Waldeck Ornelas
  • Waldeck Ornelas

Publicado em 14 de fevereiro de 2021 às 16:00

- Atualizado há um ano

As atividades de planejamento têm, nos municípios, uma dupla dimensão: uma é o planejamento físico-territorial, urbanístico, associado ao controle da ocupação e uso do solo; outra é o planejamento governamental geral, do conjunto das responsabilidades e atividades que cabem à Prefeitura. Entre essas duas dimensões há um ponto de contato, cuja fusão geralmente encontra dificuldades: é a articulação entre o uso e ocupação do solo e a promoção das atividades econômicas.

Normalmente prevalece um divórcio, que se apresenta como fratura exposta nos conjuntos habitacionais, os quais, independentemente de sua escala, não contemplam a geração local de empregos, com duas consequências imediatas: obrigam os moradores a gastar com transporte, perdendo horas em longos deslocamentos de ida e volta ao trabalho; e não atendem sequer à demanda local pelo consumo de bens de conveniência, que devem estar necessariamente próximos da moradia.

Isto se reproduz por toda a cidade, em todas as cidades, porque os projetistas costumam ver a obra como um fim em si mesmo e não como instrumento de transformação urbana. É urgente mudar isto, trabalhar com equipes interdisciplinares, para superar os desvios de formação profissional e potencializar o desenvolvimento das cidades. Este é o papel insubstituível do planejamento.

Qualquer que seja o porte do município, é estratégico que exista um núcleo central de planejamento, mas não o planejamento centralizado. Que cada secretaria tenha algum núcleo que domine as normas e a cultura setorial, nas áreas de educação, saúde, assistência social, transporte, meio ambiente, serviços públicos, etc. e o núcleo central possa distribuir as diretrizes e metas, fazendo, ao longo do processo, a compatibilização das ações, para fechar todo o planejamento governamental. Essa área de planejamento, eventualmente uma secretaria que cuida também do orçamento, deve ser o braço direito do prefeito.

É preciso estar sempre atento às políticas públicas e prioridades definidas pelos níveis federal e estadual de governo, e entender que os recursos transferidos – obrigatórios ou voluntários – estão sempre vinculados a procedimentos, resultados e metas, ora para que possam crescer, ora para que não sejam suspensos. Isto exige que a Prefeitura disponha de um mínimo de pessoal qualificado em cada área, reafirmando mais uma vez a necessidade de uma equipe diversificada.

O maior contingente precisa estar na secretaria de Urbanismo, cuja equipe é indispensável que seja multiprofissional e cujas atividades precisam, além dos Planos Diretores – com horizonte de longo prazo –, cuidar do dia-a-dia com eficácia e efetividade, via licenciamento e fiscalização.

Nos municípios de maior porte é indispensável que exista um comitê intersetorial de análise e avaliação de projetos, para atestar sua interdisciplinaridade e validar sua conformidade com o programa de governo, suas diretrizes e prioridades.

Olhando para os pequenos municípios, que são a imensa maioria, além de sua equipe administrativa, formada por secretários e ocupantes de cargos em comissão, que tocam o dia-a-dia do governo, os prefeitos precisam contar com um staff qualificado, capaz de monitorar as políticas públicas estaduais e federais, identificar as oportunidades e possibilidades do município, analisar as perspectivas e os problemas econômicos, avaliar os cenários e como o município neles se insere, dedicar-se, em suma, ao planejamento governamental. Esta é uma estrutura que vai variar de porte e composição conforme as características socioeconômicas, demográficas, físico-territoriais e ambientais do município, mas que será muito pequena em inúmeros deles e, diante da inexistência local de quadros qualificados, poderá ser constituída ad-hoc, formada por servidores temporários, ainda que isto provoque riscos de descontinuidade. Mas é melhor do que não existir.

A missão é permitir que as Prefeituras possam dar um salto na melhoria da qualidade dos seus serviços e os Municípios possam avançar no rumo do desenvolvimento.

Waldeck Ornélas é especialista em planejamento urbano-regional.