R$ 20 milhões deixam de circular em Feira com suspensão da Micareta

Evento seria realizado entre os dias 23 e 26 de abril

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  • Mario Bitencourt

Publicado em 13 de março de 2020 às 19:34

- Atualizado há um ano

. Crédito: Valdenir Lima/Divulgação

A suspensão da Micareta de Feira de Santana, anunciada nesta sexta-feira (13) pelo prefeito Colbert Martins Filho (MDB), devido ao alto risco de transmissão do novo coronavírus (Covid-19), fará com que R$ 20 milhões deixe de circular na cidade entre 23 e 26 de abril, quando ocorreria a festa.

Até o momento, Feira de Santana registrou quatro pacientes infectados: uma mulher de 34 anos que adquiriu o vírus em viagem a Roma e Milão, na Itália, a empregada doméstica dela, de 46, e os pais da funcionária, que são idosos. Com exceção da patroa, que já cumpriu o período de quarentena, todos os demais pacientes estão em isolamento domiciliar e são monitorados pela Secretaria Municipal de Saúde.

O anúncio da suspensão da Micareta ocorre um dia após a Secretaria de Saúde da Bahia (Sesab) fazer essa recomendação em documento enviado ao Ministério Público da Bahia (MPBA), que na segunda-feira passada abriu processo administrativo para acompanhar as providências tomadas para evitar a propagação da doença.

No documento, que contém um relatório com um panorama da doença na cidade e contextualiza com os casos nacionais, a Sesab manifestou “entendimento de que a Micareta de Feira de Santana aumenta exponencialmente o risco de transmissão do novo coronavírus na Bahia”.

A Micareta de Feira tinha previsão de reunir 1 milhão de pessoas e, de acordo com a Sesab, a data do evento seria justamente na 16ª semana epidemiológica do ano (23 a 27 de abril), “coincidindo com a curva ascendente exponencial de casos previsto para ocorrer no país”. Em maio, a Sesab ainda prevê pico da doença no estado.

Em Feira de Santana, tanto a prefeitura, que deixará de arrecadar até 5% da renda gerada com o evento, quanto o setor privado entraram em consenso sobre a suspensão da Micareta - a festa já deixou de ser realizada outras vezes desde o seu início, em 1937, quando nasceu com o nome de “Mi-Carême”, festa popular francesa.

“Ela ficou suspensa pela primeira vez de 1940 a 1945 por conta da Segunda Guerra Mundial, voltou em 1946 meio tímida, somente em clubes sociais, e em 1964 não foi realizada por conta do Regime Militar que se iniciava no Brasil”, disse o jornalista Girlânio Guirra, pesquisador do tema.

Guirra também concorda com a suspensão da festa: “Em primeiro lugar deve vir a nossa saúde”, acredita. Ele diz ainda que se o evento ainda for realizado neste ano, só deve ocorrer depois de outubro, quando são realizadas as eleições municipais: “Se não houver mais risco, seria bom ela ser realizada em novembro, porque já chama para o Verão e Carnaval de Salvador”.

Além da Micareta, o prefeito Colbert Martins suspendeu também o apoio da Prefeitura a todos os eventos coletivos ou de massa, até que sejam restabelecidos no Brasil condições de controle do novo coronavírus. Com isto, a prefeitura deixa de conceder licenças de funcionamento a estes eventos ou ceder estruturas de palco, som, etc.

Emergência O decreto de suspensão da Micareta e demais eventos, de número 11.484, foi publicado numa edição extra do Diário Oficial do Município, nesta sexta-feira. Ele também coloca o município em situação de emergência e estabelece medidas para enfrentamento do coronavírus.

Com a situação de emergência de saúde pública, a prefeitura de Feira de Santana poderá adotar as seguintes medidas: isolamento; quarentena; determinação de realização compulsória de exames médicos, testes laboratoriais, coleta de amostras clínicas, vacinação e outras medidas profiláticas ou tratamentos médicos específicos.

Conforme o decreto, na lista das medidas emergenciais consta ainda o estudo ou investigação epidemiológica; a exumação, necropsia, cremação e manejo de cadáver; e a requisição de bens e serviços de pessoas naturais e jurídicas, hipótese em que será garantido o pagamento posterior de indenização justa.

Também médico e professor licenciado do curso de medicina da Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS), na disciplina epidemiologia, o prefeito Colbert Martins disse que, com a suspensão da Micareta, a cidade “está se preparando para evitar um problema maior”.

“Este é um momento decisivo. Diante de uma ameaça real de crescimento dos números de pessoas infectadas, a nossa maior preocupação é com saúde da população. Cuidar de gente é o que fiz a vida inteira, é o que eu sei fazer na minha profissão”, declarou.

Para o gestor, é importante neste momento manter a ordem e a tranquilidade, buscando as orientações corretas sobre os cuidados que se deve tomar. “Informo a todos, que não pouparemos esforços para atender pacientes que venham a ter sintomas e realizar os procedimentos necessários”, disse.

“Como cidadão feirense, lamento termos que adiar a micareta. Tenho a consciência tranquila de que esta é a melhor decisão. Sei que é a nossa maior festa, que seria um momento de felicidade, porém nossa maior alegria é com a saúde de nossa gente”, completou.

O secretário municipal de Cultura Edson Borges disse que os outros eventos da cidade, caso sejam realizados, serão por conta própria dos organizadores. “O que posso garantir é que não terão apoio da Prefeitura”, declarou. Que estavam agendados, são 19 eventos religiosos, culturais e esportivos.  

Com relação à Micareta, Borges disse que a Prefeitura deixará de arrecadar, somente com o Imposto Sobre Serviços (ISS) dos três camarotes privados, cerca de R$ 100 mil. “Não temos a conta de quanto deixará de ser arrecadado por conta da suspensão, mas é muito. Contudo, o mais importante agora é a saúde das pessoas”, ponderou.

Sem pagamentos Na outra ponta, Borges observa, a prefeitura não terá problemas com relação a serviços pagos e não prestados: “Não gastamos nada com a festa ainda, não saiu R$ 1 dos cofres públicos. Estávamos em fase de licitações das estruturas, trios elétricos, etc. Mas sabemos que outros setores, como hotelaria, alimentos e comércio em geral vão deixar de arrecadar sem a realização da festa”.

Entre os organizadores da parte privada da festa, a sensação é de que a suspensão da Micareta ocorre num momento certo. “Foi uma coisa muito acertada que a Prefeitura fez, ninguém pode trabalhar com incertezas e colocar a vida das outras pessoas em risco”, disse o empresário Valter Lima, 54, um dos donos do bloco Lá Vêm Elas, que estava previsto para sair no sábado da Micareta.

Tradicionalmente, o bloco, que imita As Muquiranas, de Salvador, com homens travestidos de mulheres, sai todo ano com cerca de 2.000 foliões. Lima não informou quantas fantasias já tinham sido vendidas este ano, mas disse que se tiver de devolver o dinheiro de quem já pagou por conta do cancelamento definitivo da festa o fará.

A fantasia deste ano do Lá Vêm Elas, que tem 36 anos e é o bloco mais antigo em atividade na Micareta de Feira de Santana, estava sendo vendida por R$ 180 a vista e R$ 200 a prazo. Com fantasia de cigana, o bloco seria animado pela banda Psirico, cuja participação, com a suspensão da festa, ficou em aberto porque dependerá da agenda dos próximos shows. “Se for o caso deles não poderem tocar, vamos contratar outra banda”, disse Valter Lima.

O empresário Marcelo Moreira, 52, gestor do Camarote Central, que reúne cerca de 3 mil pessoas por dia, também prevê devolução do dinheiro de quem já comprou ingresso, caso a festa seja cancelada de vez. “Vamos aguardar mais um pouco e esperar que isso seja resolvido logo, para daí termos uma definição. O foco agora é cuidar da saúde, e é com isso que todos estamos preocupados”, afirmou.

O CORREIO tentou contato com o presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL) de Feira de Santana, Luís Mercês, mas ele estava em viagem nesta sexta-feira.

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