Relato: ‘Me sinto num labirinto fugindo da covid-19’

Advogada e acompanhante de luxo, Frida Carla conta como se reinventou com a pandemia. Clientes sumiram, mas ela se diz privilegiada, mesmo com todas as dificuldades

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  • Da Redação

Publicado em 3 de abril de 2021 às 07:30

- Atualizado há um ano

. Crédito: Paula Fróes

Garota de programa, advogada e estudante de mestrado, Frida Carla quebra qualquer tipo de tabu e defende a profissional do sexo, principalmente neste momento de pandemia. Apesar das dificuldades de 2020, assegura que o mundo virtual abriu seu leque e diminuiu o risco durante a pandemia. Enquanto seu programa presencial gira em torno dos R$ 300, por uma hora e meia, uma chamada de vídeo erótica custa R$ 100, por até 20 minutos. Foi o que manteve o padrão de vida e a possibilidade de ficar isolada em casa no ano passado. Também teve ajuda financeira de alguns clientes assíduos e que ajudam até hoje. Ativista, Frida tenta quebrar os tabus e condenação moral da profissão mais antiga do mundo.

Contudo, Frida está longe de estar segura do coronavírus. Ela tenta minimizar os riscos, mas sabe que um beijo na boca pode ser o suficiente para ter a covid-19. Por enquanto, os cuidados estão surtindo efeito, pois ainda não pegou. Confira o relato completo de mais um seguimento da sociedade que está sofrendo com a pandemia. Como oferecer prazer onde é necessário o distanciamento social?

Leia a matéria principal: 

(Paula Fróes / CORREIO) "Minha renda depende de minha produção diária. Sofri e continuo sofrendo significativamente com esta pandemia. A maioria dos meus clientes são homens mais velhos, idosos e muitos não estão podendo se arriscar. São casados que não podem dar uma desculpa para sair de casa.  Eu perdi muitos clientes bons, de renda certa. Mesmo assim, no primeiro semestre de 2020 eu consegui me manter em casa, sem atender ninguém. Foi um privilégio. Foi aí que comecei a produzir e vender conteúdo erótico na internet e fazer vídeo chamada. Com ajuda financeira de alguns clientes antigos, consegui me manter. Mas minha despesa é alta. No final de 2020, voltei a atender presencialmente.

Me sinto num labirinto fugindo da covid-19. Voltei a atender clientes presenciais. Depois que botei o pé na rua, atendo em motéis, hotéis e até na minha casa para os mais íntimos. Tento manter a higiene, mas sabemos que não tem como evitar o contato físico, um beijo na boca. Uma vez tinha um atendimento com um cliente bem fiel. Ele não foi, não me ligou, estranhei. Me deu um bolo. Algum tempo depois, descobri que ele testou positivo para covid-19 e estava em tratamento. Imagine se ele tivesse ido? Teria pego também. A cada atendimento, fico com mais pavor e medo. Será que foi hoje, será que desta vez peguei? Meu trabalho está sendo assim. De todas.

Tento manter o máximo da higiene pessoal. Quando chegamos no local, peço ao cliente que tome um banho, separe suas roupas, além de higienizar o local com álcool em gel. Mas, sabemos que o contato físico é inevitável. É o meu trabalho. Como toda profissional autônoma, entendi que é um risco necessário que preciso correr. Não tem como deixar de trabalhar, assim como não tem como evitar o medo. Cada atendimento eu fico com um pouco mais de pavor, procuro distrair a mente, estudar para esquecer que existe a possibilidade de ter pego a covid-19 no último trabalho. Os dias passam, vou me acalmando.

Eu não tive covid-19 e espero que continue assim. No primeiro semestre de 2020, senti dores no corpo e febre. Fiz o teste, mas deu negativo. Era Chikungunya. É uma corda-bamba.  Eu faço algumas lives e uma pessoa me perguntou se eu estava usando máscara no programa. Não, não estou.  Sem máscara e com contato normal, com beijo na boca e vias respiratórias. Carinho e tudo mais. Tenho medo de pegar e transmitir. Mas, pra mim, é um risco para pagar os boletos. Eu preciso me manter em equilíbrio, mesmo com o medo.

Meu faturamento diminuiu, claro. Tenho uma cartela de clientes assíduos, que já me fazia colocar na minha agenda uma renda mensal fixa. Estes clientes certos são justamente os mais velhos, que não quer se arriscar. Mesmo com a diminuição da quantidade, mantive meu valor. Foi aí que eu fui para o meio virtual.

Claro, nem todo mundo gosta de uma vídeo chamada. Preferem pessoalmente. Mas, tem uma parcela que gosta, como um fetiche. Eu agendo com o cliente e, naquele momento, deixo tudo ao meu alcance, vibrador, brinquedinhos virtuais, tudo que eu possa chamar atenção do cliente e despertar seu prazer. O objetivo final é o orgasmo dele. Eu cobro por até 20 minutos. Se gozou antes, acabou a vídeo chamada. O pagamento é adiantado, via pix. Gosto também de me fantasiar, danço, me masturbo, tudo. É interessante. São muitos fetiches. Teve um cliente que começou no vídeo, mas disse que preferia apenas ouvir minha voz. Existem diversas plataformas que facilitaram esta renda extra e minimiza os riscos da covid-19. Produção de conteúdo erótico por assinatura digital. Esta é mais uma renda para manter as profissionais do sexo trabalhando"