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Relato: ‘Pessoas com oxigênio e mantas... Um paciente morreu ao lado de minha mãe’

Confira uma das histórias de famílias que lutaram por um leito de covid-19 na Bahia

  • Foto do(a) author(a) Thais Borges
  • Thais Borges

Publicado em 20 de março de 2021 às 06:40

 - Atualizado há 2 anos

. Crédito: Reprodução

Desde abril do ano passado, a jornalista Marília Simões, 52 anos, acompanha a rotina de pacientes internados com covid-19 e de suas famílias. Como assessora do Hospital Espanhol, ela viu muita coisa. Mas, este mês, viu sua mãe, a enfermeira Stella Aquino, 87,  professora aposentada da Escola de Enfermagem da Ufba, sofrer para encontrar um leito de UTI na rede privada. Atualmente, ela está internada no Hospital Português e se recupera bem.  Stella Sena é professora de Enfermagem aposentada da Ufba. Ela se recupera bem depois de ter tido dificuldades para conseguir um leito na rede privada (Foto: Acervo pessoal) “Minha mãe nunca teve um problema de saúde mais grave, mas tem um histórico de embolia pulmonar e pneumonia pulmonar. Ela teve a embolia pulmonar há um ano, em janeiro do ano passado, e ia desmamar do anticoagulante em março. Mas o médico manteve. 

Leia a reportagem principal: 'Não tem vaga': entenda como funciona a fila da regulação para covid-19 na Bahia

No dia 16 de março de 2020, a gente trancou minha mãe em casa. Ela tinha um ano dentro de casa. No dia 8 de março deste ano, tomou a segunda dose da vacina, um mês depois de ter tomado a primeira dose. Mas no mesmo dia que tomou, ela começou a ter os sintomas de falta de ar. No terceiro dia, a gente fez o teste PCR expresso e deu positivo. Ela estava bem ruim de saturação e chamamos a Vitalmed às 2h da tarde. O médico fez o diagnóstico e disse que precisava internar. Nós ficamos 3h30 com a Vitalmed com oxigênio da ambulância, tentando uma vaga. Não tinha leito, não conseguia vaga em nenhum lugar. Depois dessas três horas na ambulância, a gente conseguiu uma vaga para entrar na emergência do Hospital Português, mas não tinha leito. A ambulância pressionava, porque precisava atender outros pacientes. A ambulância tinha se tornado leito de covid pelo oxigênio. 

No hospital, ficamos em uma sala improvisada, um corredor por 24 horas. Só conseguimos subir para um apartamento maravilhoso na sexta-feira, dia 11, no final da tarde. Qual é minha sensação? Vi toda boa vontade do mundo dos heróis da saúde. Gratidão não expressa o que senti. Estou trabalhando há 11 meses no Espanhol, eu convivo com essa realidade há um ano, com terceiros. 

Mas é muito diferente quando é na pele, você só sente quando é com você. Eu estava lá dentro impotente, queria fazer as coisas e não podia. Os profissionais exauridos. Eu trabalho há mais de 30 anos no jornalismo de saúde e nunca vi aquilo em minha vida. 

Eram pessoas sentadas em cadeiras no corredor, literalmente em cadeiras de reunião de 90 graus, enroladas numa manta, com oxigênio. Eram cenas dantescas. Minha mãe estava com uma fralda e eu pedi para trocar. A enfermeira falou ‘já vou, já vou quando terminar de tentar reanimar esse paciente’.Ao lado de minha mãe, um paciente veio a óbito, depois de 25 minutos tentando reanimar. A filha jovem estava no corredor, na madrugada, sozinha, vendo o pai morrer. Eu abracei a menina, porque nessa hora você esquece. É uma guerra. Eu parei para pensar: entre a fralda de minha mãe e o coração do cara que está ali parando, claro que tem que atender ele. Nós somos uma família privilegiada, temos plano de saúde, mas não adianta. Estamos todos iguais, na mesma guerra, e a empatia, a solidariedade e a compreensão têm que prevalecer. 

Já tem uma semana e ela está bem do quadro da covid-19, com oxigenação ok, mas extremamente debilitada e fragilizada pela idade. Acho que ela ter vencido foi uma superação e uma surpresa pra todos. Realmente, tenho que dar graças a Deus. 

Em termos de serviço, não tenho queixa. Eles conseguiram fazer tomografia às 10h da noite de uma quinta. O povo se vira como pode mas é uma coisa desumana para quem está cuidando e quem precisa ser cuidado. É um esforço de tirar o chapéu, mas há um limite. Não tenho queixa da assistência humana, mas o hospital não tem culpa de não ter estrutura física. E quando eu digo que é uma guerra é porque o oxigênio pode faltar para qualquer um - pode ser o empresário muito rico ou o Zé do Picolé da esquina. O vírus é imprevisível e sua única arma é a prevenção".