Revoltado com preço da gasolina, baiano larga a moto e adota os patins

Gastos mensais com o combustível chegavam a R$ 400

  • Foto do(a) author(a) Gabriel Moura
  • Gabriel Moura

Publicado em 9 de julho de 2021 às 06:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Nara Gentil/CORREIO

Com a gasolina passando de R$ 6, os motoristas arrumam formas de economizar na conta do combustível, como comprar carros mais econômicos e evitar saídas desnecessárias. Os mais radicais chegam a trocar o veículo próprio pelo transporte público ou pelas bicicletas. O professor George Sopa, 38 anos, foi além: ele largou a motocicleta encostada na garagem e passou a andar de patins pela cidade.

Morador da Boca do Rio, George aposentou, no ano passado, a moto que o acompanhava desde 2010, após sentir no bolso o aumento da gasolina. Os gastos mensais dele com o combustível chegavam a R$ 400, pesando no orçamento. Os patins escolhidos por ele foram os mais "potentes", que custaram R$ 800. Em apenas dois meses usando o novo meio de transporte, a economia de combustível já compensou o investimento feito.

Saiba mais: Aumento faz gasolina chegar a R$ 6,19; veja lista de postos mais baratos de Salvador

“Desde 2010 eu andava de moto e sempre coube no orçamento. Com a gasolina aumentando bastante desde 2019, passou a não caber mais no meu orçamento. Foi quando decidi me locomover de patins e deixar a moto encostada. Nem dia de domingo eu ando com ela”, conta o agora patinador, que fez questão de exaltar os benefícios para a saúde provocados por seu novo “possante”. George Sopa economiza na gasolina e malha ao mesmo tempo (Foto: Nara Gentil/CORREIO) Mas, nem tudo são flores. O principal obstáculo para as pequenas rodas dos patins são s calçadas em estado ruim de conservação. Nas ciclovias da orla, George anda sem dificuldade. Quando precisa ir aos lugares mais afastados, ele guarda seu veículo na mochila e vai andando.

Ônibus só em último caso. “Buzu é aglomeração, engarrafamento e, claro, violência”, diz ele, citando a média de quatro assaltos por dia nos coletivos de Salvador.

Cri Levada 

Se George não fica dando sopa quando o assunto é economia, a história se repete quando o assunto é ativismo social. Com formação musical, ele resolveu passar adiante seus conhecimentos no Dia das Crianças de 2014, quando marcou um aulão para a molecada da Boca do Rio.

Ele tinha marcado o rolê com um brother, também músico, e saiu convidando os meninos e meninas para aprender percussão. Na hora H, o colega dele desistiu, alegando que via pouco sentido, principalmente financeiro, naquilo. Só que, no dia marcado para a aula, 12 meninos apareceram na porta de George.

“Quando vi aquelas crianças, lembrei de minha infância, e de que tinha passado por muitas frustrações. Muitas vezes o menino tem talento para a música, mas falta oportunidade e estrutura para ele exercer seu dom. Eu não queria que essas crianças passassem pelo que eu passei”, conta o professor.

George não pensou duas vezes. Saiu catando todos os instrumentos que viu pela frente, passou em um vendedor e comprou um punhado de cachorros-quentes. O sucesso da aula foi tão grande que logo as mães começaram a cobrar uma segunda edição. Nascia ali o projeto Cri Levada.

Em seis anos, a ação social já formou cerca de 300 músicos e chegou a ter 170 alunos no auge. As aulas precisaram ser interrompidas no início de 2020 por conta da pandemia de covid-19.“Além de ensinar a parte musical, a gente se preocupa muito com a questão histórica e social, para formar não só o músico, como o ser humano. Desta forma, mesmo que ele não siga a carreira artística, ele tem mais chances de ficar longe de coisas ruins. Claro que às vezes a gente perde alguns garotos para a criminalidade, mas de 10 que eu tentei, 8 consegui salvar”, comemora.O projeto tem alguns padrinhos na classe artística, como o cantor e compositor Saulo Fernandes, que já convidou os garotos para se apresentarem com ele em alguns shows, inclusive o Festival da Virada, em 2019.

Por conta de toda a repercussão, George, que é formado em pedagogia, recebeu no início de 2020 uma proposta para realizar um mestrado numa universidade alemã. Com passagem comprada, ele teve que adiar o sonho por conta da pandemia.

“Ser músico, principalmente percussionista de rua, é visto como coisa de vagabundo aqui na Bahia. Completa besteira. Graças à arte que eu consigo viver e realizar meus sonhos, e é essa a mensagem que passo para meus alunos”, conclui o mestre.