Ricardo Fagundes celebra 25 anos de teatro com grande atuação

Ator está de volta com o monólogo Das Coisa Dessa Vida, dirigido por João Miguel

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  • Roberto Midlej

Publicado em 10 de agosto de 2022 às 06:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: foto: Caio Lírio/divulgação

Até o final da adolescência, o ator baiano Ricardo Fagundes, hoje com 46 anos, praticamente não tinha contato com a arte. Não era um leitor assíduo e nem a música lhe tocava de maneira especial. Cinema, pouco conhecia. E o teatro, que hoje é seu ofício, passava longe de sua rotina. Ele não sabe exatamente com que idade assistiu à primeira peça de sua vida, mas lembra que foi Josefina, a Cantora dos Ratos, com direção de Márcio Meirelles. Já devia ter 18 ou 19 anos de idade.

Em vez de ir ao teatro ou ao cinema, como fazem crianças privilegiadas da classe média, Ricardo precisava vender geladinhos nas feiras, para ajudar a mãe, Maria Francisca, no orçamento doméstico. Mas nada disso o impediu de se apaixonar pela arte de interpretar. Ao contrário:"A experiência na feira popular era meio teatral. Eu tinha que fazer uma performance para vender", diz Ricardo lembrando da infância em Canápolis, no oeste baiano.E, ainda que só tenha descoberto o teatro tardiamente, ele revelou um impressionante talento nestes 25 anos de carreira, que se completam em 2022. Tanto que venceu o Prêmio Braskem de melhor ator em 2019, pelo monólogo Das Coisa Dessa Vida, que voltou a cartaz na semana passada, no Teatro do Sesi, no Rio Vermelho. Muito justo, porque sua atuação é mesmo muito tocante.

E Ricardo já se entrega ao seu personagem, Nalde, antes mesmo de pisar no palco. Na entrada do teatro, é o ator que recepciona o público. Ele monta um mercadinho improvisado, onde vende cafezinho, balas até um pacotinho de biscoito por vinte e cinco centavos. Isso é para o público já ir entrando no clima do espetáculo, que se passa numa bodeguinha típica do interior. 

Dentro do teatro, mais uma surpresa: os jarrinhos de flores que estão no palco também são vendidos por oito reais. O espectador paga, mas só pode pegar depois que a peça termina, porque as flores fazem parte do cenário. O personagem de Ricardo, Nalde, que um dia foi chamado de Naldo, é um artista que compartilha suas memórias com o público, enquanto se prepara para uma performance. Nas suas lembranças, Nalde fala do preconceito que sofreu por causa de sua orientação sexual, dos amores que teve e da avó, com quem tinha uma relação muito próxima e repleta de afeto. 

O texto é de Gildon Oliveira e a canção-tema foi composta para o espetáculo por Luisão Pereira e Rebeca Matta. A direção é de João Miguel, ator baiano que participou de longas como Estômago e Cinema, Aspirinas e Urubus, além de séries como 3%, da Netflix.

O texto não é de Ricardo, mas há nele alguns pontos em comum com a vida do ator. A avó, por exemplo, foi fundamental para o personagem e para o artista:"Minha avó foi a patrocinadora de meus estudos. Eu havia estudado em escola pública, mas quando o vestibular se aproximou, ela pagava escola particular. Depois, pagou a faculdade de publicidade. Mais tarde, me dava uns cheques para pagar um curso de mímica corporal dramática. Ela foi a patrocinadora da minha formação letrada", lembra-se, falando de Dona Antonieta."Mas foi o teatro que me deu a minha formação de cidadão ", ressalta.

Mas Ricardo abandonou a faculdade de publicidade no terceiro ano, perto da conclusão. Conversou com Antonieta, explicou que, estudando algo que não o realizava, não podia enganar a ela nem a si mesmo. "Faço teatro por uma questão de saúde. No teatro, eu experimento diferentes possibilidades de criação de almas humanas e isso me proporciona autoconhecimento", afirma o ator. Depois de deixar a faculdade de comunicação, Ricardo decidiu estudar interpretação teatral na Ufba.

Concluiu o nível superior na Ufba e logo emendou mestrado e doutorado também em teatro. Hoje, é professor na Ufob (Universidade Federal do Oeste Baiano), no curso de audiovisual e também em propaganda. Se divide entre Salvador e Santa Maria da Vitória - a 16 horas da capital -, onde ensina. Toda semana, vai e volta, para se dividir entre a sala de aula e os palcos. 

E quando está no interior, aproveita para dar voluntariamente aulas de teatro a mulheres idosas, na zona rural. "Muitas delas nunca ouviram sequer a palavra teatro. São senhoras de 58 a 97 anos. Batizei o grupo como Aroeiras". O nome é referência a uma planta medicinal, usada como remédio caseiro."Este universo das pessoas que vieram antes de mim me permeia. Quando Gildon me entregou a parte do texto que fala da avó de Nalde, eu chorei muito", diz Ricardo.O começo da carreira dele foi em Um Tal de Dom Quixote, dirigido por Márcio Meirelles. Passou também por A Bofetada, Capitães da Areia e dançou com a Companhia VilaDança, em Da Ponta da Língua à Ponta do Pé. Depois de um tempo atuando nos bastidores, em funções como assistência de direção e preparação de elenco, Ricardo decidiu que era hora de pisar no palco de novo. Ganha o público baiano, que novamente vê-lo em cena.

Serviço Das Coisa Dessa Vida Local: Teatro Sesi - Rio Vermelho Quando: 13, 14, 20 e 21 de agosto, às 20h Ingressos - R$ 30 | R$ 15, no Sympla e na bilheteria do teatro