São Cristóvão: um bairro maior do que muita cidade baiana

Após escolha dos leitores, o CORREIO conta a história e as curiosidades da região

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  • Hilza Cordeiro

Publicado em 30 de novembro de 2019 às 06:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Marina Silva/ CORREIO

Era tão intenso o movimento para o Aeroporto de Salvador na década de 80 que o comerciante Gildo dos Santos foi praticamente obrigado a abrir na região uma filial do negócio da família, uma loja de autopeças. Antes, o comércio deles era apenas na famosa Baixa de Quintas, e a chegada das locadoras de automóveis no aeroporto foi determinante para a abertura de um novo ponto no bairro de São Cristóvão, que fica próximo ao terminal.

“Meu pai foi a terceira pessoa a ter loja de autopeças na Bahia e ficou ali pela Baixa de Quintas. A gente sempre vinha para São Cristóvão para oferecer serviço para as locadoras de veículos e exigiram que eu viesse para cá porque a Baixa de Quintas era muito distante”, conta Gildo, que há 32 anos tem uma loja no bairro - escolhido, pela maioria dos leitores do CORREIO, para ter a sua história contada no jornal. A enquete é parte das comemorações pelos 40 anos do CORREIO. A família de Gildo saiu da Baixa de Quintas e se mudou para São Cristóvão (Foto: Marina Silva/ CORREIO) Com uma alta demanda por produtos e mão de obra nesse setor, a localidade encheu-se de lojas e virou um ponto de referência para quem busca produtos para motos e carros.

Ainda hoje o fluxo aéreo do aeroporto é grande - ele integra a lista dos dez mais movimentados do país. Só em 2018, mais de 8 milhões de viajantes passaram por lá, segundo dados da administradora Vinci Airports.   Como nada é à toa, a história se conecta: o santo que batiza o bairro é o padroeiro protetor dos motoristas e viajantes. Diz-se que esse nome foi dado por causa de uma missão da Igreja Católica em homenagem a São Cristóvão. Desde então, em todo 25 de julho, a comunidade faz uma festa em homenagem ao santo, na qual é comum pedir a bênção das carteiras de habilitação.

Antes disso, porém, a comunidade era uma enorme fazenda que foi loteada pelos herdeiros quando o dono faleceu e que depois passou a ser chamada de Cascalheira devido à grande quantidade de cascalho que havia na região.

O bairro ainda era conhecido por essa denominação quando o barbeiro Luís da Silva Dias, 71, chegou para morar. Ele lembra que a igrejinha nem tinha o charme de hoje. “Era uma casa pequena de tijolinhos, que uma senhora, moradora do bairro, tomava conta”, recorda. Criança, com uns oito anos, ele não ligava muito para os encontros religiosos e o point mais legal era o “barreiro”, lugar onde a galera se reunia para jogar bola e que hoje deu lugar a um shopping.

Transporte Seu Luís cresceu na comunidade e foi também nela que aprendeu a profissão que hoje exerce. “Meu pai estava muito doente, sem condições de nos dar nada e então eu pedi para um barbeiro da rua me ensinar como fazia e daí eu continuei”, conta ele, que é do tempo que a região tinha só o aeroporto e quase nada de serviços. O morador lembra que só existia uma linha de transporte: uma marinete que fazia o trajeto Portão-Calçada. Hoje, além dos ônibus e topics, são duas estações de metrô (Mussurunga e Aeroporto). Ônibus e topics circulam pelo bairro, onde, no passado, só tinha marinete (Foto: Marina Silva/ CORREIO) Vivendo há mais de 60 anos no bairro, Seu Luís diz que já se acostumou com o barulho das turbinas dos aviões que passam acima de sua casa e que hoje o som é parte da paisagem. “Para mim, não existe bairro melhor do que esse. Tenho uma boa convivência e onde chego só tenho amizade. Aqui é um bairro popular, de pessoas simples e áreas ainda sem sistema de esgoto”, destaca.

Quem assistiu de perto a transformação do cenário foi o estofador Abraão Morais, que foi morar na região em 1981, ano de surgimento do subdistrito Planeta dos Macacos. O nome faz referência à franquia americana de filmes homônimos, lançados a partir da década de 1970 e que retratam ficcionalmente uma disputa territorial entre humanos e macacos.

“Muita gente invadiu o terreno que hoje é o Planeta dos Macacos”, diz Abraão. Natural do interior da Bahia, ele conta que foi parar no bairro depois que seus parentes souberam que famílias estavam invadindo e construindo casas. “Um foi passando para o outro e foram tomando o espaço que tinha, que pertencia à Base Aérea de Salvador. Só existia energia num único ponto e o pessoal foi puxando gatos para as casas que eram de madeira e taipa”, descreve. O estofador Abraão Morais foi para a região em 1981 (Foto: Marina Silva/ CORREIO) Já no limite com o município de Lauro de Freitas, São Cristóvão não tinha mais para onde crescer, e o adensamento populacional levou o bairro a ser reconhecido pelos poderes públicos, e os serviços de energia elétrica e água encanada aos poucos foram sendo implementados. A área total do bairro é de 6,14 km², correspondente a 614 mil campos de futebol.

População Em 2010, no último censo, a população do local era de quase 54 mil habitantes. O aglomerado populacional do bairro pode ser melhor entendido comparando com os dados do próprio estado. A Bahia possui 417 municípios e só 31 deles têm entre 50 a 100 mil habitantes, conforme dados da Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais (SEI).

No ranking dos 10 bairros com maior população em Salvador, São Cristóvão fica em 6º lugar, atrás de Brotas (70,7 mil), Itapuã (66,9 mil), Pituba (65,1 mil), Pernambués (64,9 mil) e Paripe (55 mil).

Quase 25% da população tinha menos de 14 anos, conforme o censo de 2010. Para dar conta de educar a meninada, o bairro conta com 12 escolas municipais, quatro estaduais e três creches.

Na história mais recente, o bairro ganhou um equipamento público importante para a saúde. A Unidade de Pronto Atendimento (UPA) 24h de São Cristóvão, inaugurada há três anos, foi a quinta construída em Salvador e aproximou o serviço que antes era procurado no município vizinho. O local possui ainda Unidade Básica de Saúde (UBS) e Unidade de Saúde da Família (USF).

Comércio Com tanta gente vivendo e passando por São Cristóvão, o comércio varejista se expandiu. São 776 empresas e 4.148 microempreendedores individuais (MEIs), conforme dados da Junta Comercial da Bahia (Juceb). No rol de empresas, a predominância é de mercadorias em geral, sobretudo de alimentos e de artigos de vestuário e acessórios. Dos micros, 293 oferecem serviço de cabeleireiro, manicure e pedicure e 265 são de comércio de vestuário e acessórios.

O comerciante de autopeças Gildo dos Santos conta que é responsável por várias das outras lojas do ramo que surgiram no local. “Tenho uma tradição de peças para automóveis e já formei muita gente nesse ramo. Coloquei pessoas para trabalhar aqui e depois elas foram buscando suas melhorias e abrindo seus negócios”, conta.

Para Gildo, a região ainda precisa de um ordenamento melhor do mercado informal. “O bairro é uma das entradas da cidade e precisa dessa melhoria, de arrumar uma área melhor para o pessoal e dar um aspecto mais bonito”, afirma o comerciante.

O projeto Correio 40 Anos tem oferecimento Bradesco, patrocínio Hapvida e Sotero Ambiental, apoio institucional Prefeitura de Salvador, apoio Vinci Airports, Sesi, Salvador Shopping, Unijorge, Claro, Sebrae, Itaipava Arena Fonte Nova, Santa Casa da Bahia e Coelba.