Sem isolamento, cenário no Subúrbio Ferroviário é preocupante

Prefeitura insere Periperi na lista de bairros com medidas severas de restrição; com 475 casos e 66 óbitos por coronavírus, subúrbio entra no foco da prefeitura

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  • Daniel Aloísio

Publicado em 28 de maio de 2020 às 05:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Arisson Marinho/CORREIO

A partir dessa quinta-feira (28), Periperi vai se juntar a uma lista que contém outros dois bairros do Subúrbio Ferroviário de Salvador: Plataforma e Lobato. Ambos têm em comum a aplicação de medidas de isolamento mais restritivas para conter a disseminação da covid-19, doença causada pelo novo coronavírus, em Salvador.  

Com a entrada de Periperi na lista, quase um quinto dos bairros do Subúrbio estão com uma atuação mais efetiva da prefeitura nessa pandemia. Essa realidade é um reflexo da preocupação municipal com o avanço da doença nessa região de Salvador.  

No total, nos 16 bairros do Subúrbio, 475 casos de coronavírus foram registrados, sendo 400 só no mês de maio e 197 nos últimos sete dias. Esses dados foram contabilizados até a segunda-feira (25) e foram obtidos pelo CORREIO através do comitê municipal que define quais bairros passarão pelas medidas mais restritivas. Confira a demonstração detalhada do Subúrbio por bairros:   Uma análise desses números também foi feita pelo prefeito ACM Neto. “Desde que iniciamos as ações de setorização, identificamos as localidades com maior incidência da doença. Os números do subúrbio têm nos preocupado. Por isso, adotamos medidas regionalizadas e ações de proteção à vida. Além desse fator, há um visível relaxamento do isolamento social”, disse.  

Além dos três bairros do subúrbio, as medidas de isolamento mais restritivas estão válidas em Brotas, Cosme de Farias, Liberdade, Massaranduba e Uruguai. Outros bairros já passaram por essas medidas, mas tiveram o isolamento afrouxado por terem conseguido diminuir a taxa de transmissão da doença, segundo os dados da prefeitura, como é o caso do Centro, Pituba, Boca do Rio e Bonfim.  

No Subúrbio, dos três bairros mais preocupantes, nenhum conseguiu ter redução das medidas de isolamento. Plataforma, por exemplo, está na mira da prefeitura desde o começo das ações de setorização, no dia 11 de maio. Esta quinta-feira completa 18 dias de presença mais efetiva do executivo municipal no bairro.  

Do total de casos de covid-19 registrados em Salvador, cerca de 18% estão na região do subúrbio. Segundo o censo demográfico realizado em 2010 pelo IBGE, a população da região é de 335 mil habitantes, o que equivale a 13% dos moradores de Salvador.   

Baixo isolamento  “Tenho visto um movimento grande nas ruas dessa região, mesmo sendo uma semana chave, preparada para as pessoas ficarem em casa. Temos que ter a consciência de que, ou a gente aumenta o isolamento e reduz a taxa de transmissão ou seremos obrigados a viver com essas medidas de restrição”, completou Neto. (Foto: Max Haack/Divulgação) Essa observação do prefeito é confirmada por moradores do subúrbio. A estudante de jornalismo Alice Santana, 30 anos, tem participado das aulas pela internet, em sua casa de Paripe, nesse período. Mas quando ela precisa ir ao mercado, percebe que no bairro “não existe isolamento. Tudo funciona normalmente”, disse.  “Na primeira semana da pandemia, até lojas grandes fecharam. Depois, a partir do final de abril, parece que as pessoas esqueceram da necessidade de ficar em casa. Até lojas que ultrapassam 200 metros quadrados e que não são essenciais estão abertas, como lojas de calçados, por exemplo”, completou Alice.  Já Denise Araújo, 29, que mora sozinha com a mãe, percebe que o pessoal da sua rua tem saído muito de casa. “O pessoal vai para a rua conversar ou beber cerveja, como se não tivesse pandemia. Eu fico mais em casa, pois minha mãe é idosa, mas vejo essa realidade em Fazenda Coutos”, argumentou.  

O estudante Daniel Brito, 22, morador de Pirajá, também tem percebido uma falta de prudência das pessoas do bairro. “Nesse São João antecipado, as pessoas estavam nas ruas, soltando fogos e comemorando. Aparentemente, a vida aqui segue normal e não parece que temos vírus”, disse. 

Segundo os dados divulgados pela prefeitura, Paripe possui 43 casos de coronavírus, 20 só na última semana, e nove óbitos. Já Fazenda Coutos tem 33 casos, 16 nos últimos sete dias, e oito óbitos. Por fim, Pirajá está com 48 casos, 23 na última semana, mas, felizmente, com nenhum óbito.  

Esses três bairros, como todos os outros do Subúrbio, estão na mira da Prefeitura. Neto destaca, no entanto, que não é só essa região que tem problemas: “Estamos observando também outras áreas populares que tem crescimento de novos casos de coronavírus, como São Marcos, Pernambués e Cajazeira XI”.  

Periperi  Com 55 casos registrados no mês de maio, somente 26 nos últimos sete dias, o bairro de Periperi tem preocupado as autoridades municipais. “Eu fiz questão de vir a Periperi, pois soube que teve movimentação aqui nessa semana, com direito a guerra de espada. Daí a necessidade de já irmos atuando no bairro, trazendo uma mensagem a cada morador de conscientização para ficar em casa”, disse o prefeito.   As ruas de Periperi estavam movimentadas na manhã de feriado (Foto: Max Haack/Divulgação) Ele conversou com a imprensa na sede do Centro Espírita Cruz da Redenção, que foi beneficiada pela Secretaria Municipal de Promoção Social e Combate à Pobreza (Sempre) com 50 cestas básicas, kits de higiene e máscaras cada, a serem distribuídas principalmente às gestantes atendidas pela instituição. Uma outra entidade também foi contemplada pelo órgão: Lar Fabiano de Cristo, que ganhou 100 cestas básicas, kits de higiene e máscaras, a serem distribuídas, dentre outros públicos-alvo, idosos e crianças assistidos no local. 

Essas ações sociais já fazem parte da atuação da prefeitura nesse bairro, o que começa oficialmente na quinta-feira. Um dia antes, agentes municipais já estavam higienizando o bairro e conversando com os ambulantes e feirantes sobre o fechamento do mercado informal. Só é permitido o funcionamento das atividades essenciais, como supermercados, farmácias e estabelecimentos que utilizam o sistema de delivery, sem retirada no local, além de serviços de saúde. 

Haverá, ainda, ações de proteção à vida que envolvem distribuição de máscaras, realização de testes rápidos, medição de temperatura, doação de cestas básicas para feirantes e ambulantes ações de combate ao mosquito e Cras Itinerante. 

Para o feirante Jean Santos, 39, que não usava máscara e não apresentava um frasco de álcool em gel visivelmente na barraca, a proibição do mercado informal é um mal negócio, mesmo com o recebimento da cesta básica. “A gente vive disso aqui, é a forma como colocamos comida na mesa. Fico preocupado com a doença, mas preciso trabalhar”, disse.   (Foto: Arisson Marinho/CORREIO) Jean explicou que não usava a máscara, pois tinha tirado para fazer um lanche. Ele atua há 10 anos na Rua Ambrósio Calmon, que terá o tráfego de veículos suspenso para ampliar o isolamento no bairro. O mesmo acontecerá com a Rua Carlos Gomes, ambas no trecho entre a Rua das Pedrinhas até o Mercado Municipal. Somente moradores terão acesso às vias, mediante comprovação. 

O comerciante Benício José Ferreira, 66, fechou há seis dias uma loja de cama, mesa e banho, quando viu o número de casos subir no bairro. “Na minha casa tem três velhos: eu, minha esposa, que tem 64 anos, e minha sogra, com 90 anos. Tenho que preservá-los”, disse. De máscara, ele saiu à rua para acompanhar o trabalho dos agentes da prefeitura. 

“Eu concordo com as medidas do poder públicos, mas vejo que a população não respeita. Se nós estivéssemos comprometidos com o isolamento social, nossa realidade seria diferente. Era bom que Periperi ficasse fechada por sete semanas, não só sete dias”, disse.  

Já Ana Caroline, 36, foi até a rua para tentar conseguir as máscaras doadas pela prefeitura. Ela conhece pessoas do bairro que estão sofrendo por causa da doença. “A gente só sente na pele quando acontece com alguém da família. Morreu o rapaz que trabalhava na lotérica e os pais dele também. Soube que a irmã está na UTI e que os dois filhos estão com a doença. O tio do meu vizinho morreu ontem, inclusive”, relatou.  

*Com orientação da chefe de reportagem Perla Ribeiro