Sem proteção, voluntária passa mal após limpar praia com óleo em Salvador

Tóxicos liberados pelo petróleo cru podem causar dermatites e problemas respiratórios

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  • Da Redação

Publicado em 25 de outubro de 2019 às 19:11

- Atualizado há um ano

. Crédito: Marina Silva/CORREIO

Quem antes ia às praias para surfar, agora chega na beira-mar com máscaras com filtros para químicos, luvas emborrachadas, galochas e blusas de manga comprida. Esses são equipamentos necessários para limpar o litoral com segurança. Foi sem os EPIs que a bióloga e professora de surf, Carla Circenis, 49 anos, passou mal após limpar a praia de Stella Maris.

Depois de ter contato com o petróleo cru, Carla conta que seus olhos ficaram irritados e a pele empolada. Ela ainda teve um princípio de sinusite e dor de barriga. “Eu fui imprudente porque estava sem máscara, óculos e de short, teve um momento que eu estava de joelho no óleo em Stella. Minha pele teve muito contato com o óleo”, diz.

A voluntária do grupo Guardiões do Litoral disse que toda precaução acabou quando ela viu a praia de Stella Maris coberta de grandes placas de óleo, no dia 17 de outubro. A reação foi calçar os sapatos usados para dar aula de surfe, um par de crocs, e luvas para começar a limpeza do local. Os sintomas duraram um final de semana. Voluntário coleta óleo da praia de Pedra do Sal com EPIs (Marina Hortélio/CORREIO) Mesmo sabendo que o material pode trazer malefícios para a saúde, Carla não imaginava que o petróleo cru poderia ser tão tóxico. Por ser bióloga, ela sabe que o óleo é trifásico, liberando um gás tóxico, uma parte que é levada pela correnteza e uma parte que decanta para o fundo do mar.

Segundo a infectologista e professora da Unifacs e da Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública, Ana Paula Alcântara, as duas principais formas de contaminação pelo óleo são via respiração e pele. Ela aponta que a intoxicação com os gases liberados pelo petróleo cru pode ser ainda mais severa que a pela pele devido a sensibilidade do pulmão.

“A depender da intensidade pode chegar a uma dermatite que se assemelha a uma assadura. Os gases que podem fazer algum grau de reação inflamatória brônquica”, explicou. Dentre os sintomas para o sistema respiratório, o contaminado por sentir falta de ar, cansaço, chiado no peito, tosse seca e até desencadear uma crise de asma.

Quem apresentar esses sintomas após a limpeza das praias deve ir ao médico, indica a dermatologista Anete Olivieri. “Tem que se proteger, usar roupa adequada e luva para não deixar o óleo tocar na pele. Depois da limpeza a pessoa deve tomar um banho bem tomado para tirar qualquer resquício que tenha”, explicou. Quem tiver reações na pele pode ir ao dermatologista e se outros sintomas aparecerem, a médica indica ir a um serviço de emergência.

A infectologista, Ana Paula Alcântara, ainda afirmou que o contato com os químicos do óleo podem ter uma ação sobre a medula óssea. Segundo a médica, os pacientes podem ter uma insuficiência medular.

Apesar do relato de Carla, a Secretaria Municipal de Saúde (SMS) e a Secretaria Estadual de Saúde (Sesab) não registraram nenhum caso de paciente com sintomas causados pelos contato com o óleo nas redes públicas. Em Pernambuco, foram registrados 19 casos de intoxicação. 

Proteção dos voluntários Ambas as médicas ressaltam a importância da proteção para evitar contágio pelo petróleo. Em Stella Maris, os Equipamentos de Proteção Individual só chegaram ao local no sábado (19), quando Carla já tinha se infectado. A partir da chegada do aparato, os voluntários começaram a trabalhar com todo material de segurança indicado.

Carla conta que os voluntário não receberam treinamento, mas buscaram informações sobre como combater o óleo com professores universitários e em livros. Para organizar a ação, o grupo de voluntários apontou um responsável para coordenar as medidas e monitorar cada praia.

Um dos criadores do grupo de voluntários, o engenheiro Arthur Sehbe indica que todos os guardiões do litoral tem grande precaução durante a limpeza para evitar contágios. Como são mais de 500 voluntários no grupo, a quantidade de EPIs utilizada é grande. O grupo criou uma vaquinha online e conseguiu arrecadar R$ 50 mil para a compra destes aparatos de proteção.

Já foram gastos mais de R$ 27 mil com a compra de EPIs, que vão ser distribuídos pelo estado. O grupo tenta enviar os equipamentos para Maraú, um dos últimos municípios atingidos. “As pessoas têm que evitar o toque nas manchas. Se tiver contato, tem que tirar com algum tipo de óleo vegetal, passar sabão neutro e observar o local afetado. Ainda é importante observar se tem ardência nos olhos e nas vias respiratórias. É um resíduo perigoso e deve ser manipulado de forma adequada”, ressaltou.

O superintendente do Ibama, Rodrigo Alves, também ressalta a necessidade de se proteger ao realizar a limpeza das praias. Ele indica que os voluntários recorram aos agentes de limpeza dos municípios para saber como se proteger e onde descartar os resíduos.

Doação de EPIs O voluntários ainda vão receber mais apoio, a Coelba já começou a doar, a última quinta (24), 6.950 equipamentos de proteção individual para o Governo da Bahia, por meio do Inema. Os aparatos devem ser entregues para pessoas que realizam trabalho voluntário no litoral baiano.

Dentre os itens doados, estão luvas, botas e máscaras. Como o óleo é tóxico e pode causar danos a saúde, a empresa ressalta que é importante evitar o contato com a pele. A Coelba decidiu fazer a doação para levar mais segurança à atividade e minimizar os riscos à saúde dos voluntários. O repasse dos EPIs fica por parte do Inema.

*Com orientação da chefe de reportagem Perla Ribeiro