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Da Redação
Publicado em 21 de julho de 2020 às 05:30
- Atualizado há 2 anos
Os foliões de plantão devem começar a se acostumar com a ideia de um Verão diferente em Salvador, já que a temporada das festas populares na capital pode acabar sofrendo com a pandemia do novo coronavírus. A prefeitura de Salvador discute a possibilidade de adiamento do Carnaval e cancelamento de outras celebrações, como a Festa de Iemanjá e o Festival da Virada. >
Na segunda (20), o prefeito ACM Neto voltou a falar sobre a possível transferência da folia momesca de 2021, que se inicia em 10 de fevereiro, para outra data, afirmando que mantém diálogos com outras cidades e com representantes do setor. Durante inauguração de uma unidade de saúde no Arraial do Retiro, o gestor municipal mencionou que a festa poderia acontecer em julho do ano que vem. >
“Estamos achando que poderia, caso seja necessário, poderia acontecer no começo de julho, antes da Olimpíada (de Tóquio)”, diz, explicando que é um calendário que deve ser construído também com ajuda dos envolvidos na festa. Os Jogos Olímpicos da capital japonesa começam em 23 de julho. >
Sem Carnaval, as datas de festas e lavagens que o precedem também seriam canceladas. “A gente não precisa comentar festa a festa. Se não tiver Carnaval, claro que não vai ter (Lavagem do) Bonfim, (festas de) Iemanjá, Santa Bárbara. É óbvio, uma coisa mais do que natural. Ainda não tomamos a decisão oficial do cancelamento, mas o dever de transparência que tenho com a cidade, tenho que deixar claro que o caminho é esse, a tendência é essa”, diz Neto. Prefeito comentou o cancelamento da festas duranta inauguração de uma unidade de saúde (Foto: Arquivo/Divulgação/PMS) O calendário de festas de Salvador é uma das atividades mais importantes para a cidade e o presidente da Empresa Salvador Turismo (Saltur), Isaac Edington, não nega que os eventos estão sendo prejudicados pela pandemia. >
“Não tem outra alternativa, temos que suspender até que se tenha uma segurança para que os eventos retornem. O limite para se decidir sobre o Carnaval é novembro e temos que esperar mais informações sobre a pandemia para decidir sobre o que pode ser feito. Estamos preocupados com esse tema. A gente não tem só o Carnaval, mas todo um elenco de atividades fortes para a economia da cidade, como as festas populares e o Festival da Virada, que trabalhamos para fortalecer ainda mais e desenvolver a cidade. A atividade de eventos mais importante é o Carnaval, que ecoa e gera desenvolvimento não só durante a festa, mas no ano todo. Essa atividade é responsável por irrigar a economia da cidade para cadeias produtivas importantes”, afirma.>
O setor de turismo e eventos teme o cancelamento dos festejos, especialmente após às duras perdas que vem somando desde o início da pandemia. As festas populares de Salvador seriam a última esperança para as agências de viagem soteropolitanas, aponta a presidente da seccional baiana da Associação Brasileira de Agências de Viagens (Abav-BA), ngela Carvalho.>
“De março para cá, as agências não estão faturando. Estamos há 4 meses sem vendas. Tínhamos a expectativa de que tudo voltasse em julho, mas isso não ocorreu. Agora, a grande esperança é o movimento do Verão, com o Réveillon, o Carnaval e todo o calendário de dezembro”, informa Carvalho, que ressalta ainda que o faturamentos das agências de viagem cresce cerca de 20% no período das festas, em anos normais.>
Os hotéis de Salvador também têm forte dependência do calendário de festas do verão. De acordo com o presidente da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis - Regional Bahia (ABIH-BA), Luciano Lopes, apenas o Carnaval representa entre 12% e 13% do faturamento anual do setor hoteleiro da capital.“As festas populares como Santa Bárbara e Iemanjá trazem um número de turistas muito grande. Nesse ano, que o 2 de fevereiro caiu no final de semana, a ocupação dos hotéis ficou em torno de 95%. A perda dessa festa causa um grande impacto, pois vamos deixar de ter essa taxa de ocupação. Entretanto, sei que, sem a vacina, é difícil manter a festa pois ela atrai uma grande aglomeração”, destaca Lopes.O “boom” nas festas com a chegada do Verão alavanca o setor de produção de eventos. Sócia-proprietária da Giro Produções, Taiana Veloso calcula que cerca de 25% da rentabilidade da empresa ocorre no final do ano, entre festas e eventos corporativos. “O mercado aquece. É um setor muito sazonal e é no Verão onde mais se ganha. Isso também gera mais empregos, desde o ambulante que vende a cerveja até a pessoa que confecciona os ingressos das festas. São muitos profissionais envolvidos e a perda deve ser muito grande, caso estas festas não ocorram”, analisa.>
Patrocinadora do Carnaval e das festas populares de 2020, a cervejaria Ambev aponta para a incerteza que paira quanto à realização dos festejos no ano que vem. A empresa, entretanto, garante que está dialogando com as partes responsáveis para buscar alternativas. “O cenário ainda é incerto. Estamos em contato com todos os responsáveis que fazem o Carnaval acontecer para dialogarmos e entendemos juntos o melhor caminho. Sabemos que o Carnaval faz parte da cultura brasileira e, no momento, nosso papel é colaborar para que todo este ecossistema, que faz a grande festa acontecer, encontre uma alternativa segura para sua realização”, afirma Felipe Bratfisch, gerente de nacional de Marketing de Experiência e Patrocínios da Cervejaria Ambev.>
Pescadores Não são só os empresários do turismo que podem perder caso as tradicionais festas de Salvador venham a ser canceladas. Os pescadores da Colônia de Pesca Z1, no Rio Vermelho, onde fica a Casa de Iemanjá, também deixarão de lucram com a festa para a Rainha do Mar. “A gente coloca os presentes para os turistas no mar e também leva as pessoas para acompanhar o presente principal. Isso dá um dinheiro bom, cada pescador deve ganhar cerca de R$ 600 entre os dias 1º e 2 de fevereiro”, calcula o pescador Lilo Silva, que atua no bairro.>
Os bares e restaurantes que têm uma localização privilegiada no circuito do carnaval não devem colher muitos frutos da folia, caso ela seja cancelada ou adiada, acredita o presidente da Federação Baiana de Hospedagem e Alimentação (Febha), Silvio Pessoa. Segundo ele, os estabelecimentos da região da folia, pelo menos, dobram o faturamento no período. >
Para ele, nem mesmo a realização da festa em julho seria capaz de reverter as perdas econômicas. “Eu sempre comentei que o Carnaval é o 13º mês no turismo, é quando fazemos um colchão para passar a baixa estação. Nós podemos perder essa época de grande rentabilidade. Se adiar, não deve ter a mesma força. Carnaval em julho para mim seria uma micareta, não vai ter a pujança que a folia na data correta”, pontua Pessoa.>
Ainda sem alternativas para o possível cancelamento dos festejos, o Grupo San Sebastian, que produz eventos nacionais e tem no carnaval um dos momentos mais importantes do ano, também acredita que a realização da folia momesca em julho não deve conseguir substituir a festa quando realizada no começo do ano. “Acredito que adiar seja um paliativo, já que é esperado que seja uma festa muito menor do que o Carnaval de sempre”, afirma José Augusto Vasconcelos, um dos sócios do grupo.>
Mesmo já prevendo a possibilidade de cancelamento ou adiamento das festas caso uma vacina para o coronavírus não seja descoberta, o Conselho Municipal do Carnaval e Outras Festas Populares (Comcar) ainda trabalha com a possibilidade de realização do Carnaval em fevereiro. “Estamos esperando ocorrer na data marcada. Trabalhamos para a festa acontecer, mas quem define isso é a pandemia. Não temos que discutir, é uma decisão do gestor da cidade”, aponta Jairo da Mata, presidente da entidade, que diz esperar um posicionamento da prefeitura até novembro.>
Com adiamento ou não, da Mata acredita que a festa vai ser mais modesta do que a folia momesca de 2020. “Sabemos que não será um Carnaval como nos moldes que realizamos nos anos passados. Vamos buscar usar toda a criatividade para chegar no molde adequado, mas a economia estará muito afetada e isso reflete na festa, com as vendas de blocos e camarotes, por exemplo”, indica.>
Celebração religiosa Apesar das possíveis mudanças no calendário das festas, as datas são imutáveis do ponto de vista religioso, ressalta a Assessoria de Comunicação da Arquidiocese de Salvador. “Cada paróquia é responsável pela festa do seu padroeiro, cujas datas são fixas. Desta forma, caberá a paróquia discernir de que forma organizar a Missa Solene, com possibilidade de transmissão ao vivo pelas redes sociais, e sempre seguindo as orientações da Arquidiocese de Salvador, dos órgãos de saúde, da prefeitura e do Governo do Estado”, pontua.>
Com o auxílio das redes sociais, os fiéis também poderão celebrar isolados em casa. “Caso não seja possível realizar as Solenidades com a presença física dos fiéis, devido à pandemia, elas acontecerão através das redes sociais. Desta forma, não haverá nenhum impacto no que diz respeito à parte espiritual. Contudo, o impacto será relacionado ao ‘calor humano’, já que possivelmente os fiéis deverão acompanhar por meio dos aparatos tecnológicos”, ressalta a Arquidiocese de Salvador.>
A pandemia também não deve atrapalhar as homenagens à Iemanjá feitas pelos pescadores da Colônia de Pesca do Rio Vermelho, que lamentam a possibilidade de não ver o bairro cheio no 2 de fevereiro. “Caso a festa seja cancelada, a gente combinou de fazer um ou dois balaios para levar para o mar no dia. Temos muita fé em Iemanjá, que nos dá proteção e garante a boa pesca. Vamos fazer algo só entre os pescadores, mas ficamos sentidos por não poder ter a população com a gente”, lamenta Lilo.>
Expectativa Antes da pandemia, os números das festas de verão de 2020 empolgavam o setor de turismo e eventos, que tinha altas expectativas para a estação em 2021.>
“Antes da pandemia, o setor hoteleiro esperava crescer em torno de 6% neste ano e as festas ajudavam muito nisso. Os feriados prolongados também iriam favorecer o turismo, mas agora vai ser difícil”, aponta o presidente da ABIH-BA, Luciano Lopes.>
O trabalho de fortalecimento do turismo em Salvador permitiu que o visitante ficasse na cidade, ao invés de ir para outros locais do litoral baiano. “Neste ano, a expectativa era muito boa pois Salvador voltou a interessar o turista. Antes, ele vinha para cá e ia para praias, como as do litoral norte. Agora, com os novos equipamentos turísticos e pontos turísticos inaugurados, os visitantes voltaram a ter interesse em vir ou voltar para Salvador”, afirma a presidente da Abav-BA, ngela Carvalho.>
Além de impulsionar a economia, as festas do Verão de Salvador também são grande divulgadoras da capital baiana, relembra Roberto Duran, presidente da Salvador Destination.“Esses festejos do calendário de Salvador são fundamentais para o marketing e o desenvolvimento da cidade. Eles fazem com que tenhamos uma situação diferenciada de outros destinos. Como as tradições culturais fazem com que a cidade se torne um grande atrativo turístico, a não realização das festas causa um impacto negativo em toda a cadeia produtiva”, afirma.É justamente pela capacidade de chamar a atenção do Brasil para Salvador, que o presidente da Febha opta por se manter otimista quanto a realização das festas. “Além de serem extremamente importantes para a economia local, as festas também divulgam nossa cidade como destino turístico. Estou me espelhando em outras cidades para me manter otimista de que a crise vai passar e as comemorações não serão sacrificadas”, diz Silvio Pessoa.>
A possibilidade de mudança no calendário festivo aponta para a necessidade de buscar formas de minimizar as possíveis perdas do período. As empresas de produção de eventos, por exemplo, podem buscar alternativas online para manter a atuação mesmo sem as festas, como pretende fazer a Giro Produções.>
“Nós temos propostas prontas para clientes. Podemos fazer lives com capacidade de atingir mil pessoas, por exemplo. Temos que dançar conforme a música e o que podemos fazer é oferecer esses serviços. Ainda não vejo isso no Carnaval, mas somos adaptáveis e, com união dos profissionais, podemos conseguir fazer”, garante Taiana, sócia-proprietária da empresa.>
*Com orientação da subeditora Clarissa Pacheco>