Serviços públicos, operação privada

Pior do que ter que pagar pelos serviços públicos é não contar com eles, ou tê-los de forma inadequada

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  • Waldeck Ornelas

Publicado em 26 de dezembro de 2020 às 09:00

- Atualizado há um ano

O conjunto dos serviços públicos de competência das prefeituras, diretamente relacionados com o interesse local e a qualidade de vida da população – transporte coletivo, abastecimento de água, esgotamento sanitário, iluminação pública, limpeza urbana – estão todos fora do alcance de sua capacidade fiscal, razão pela qual são cobrados separadamente, ainda que prestados diretamente pelo próprio governo municipal. A população muitas vezes nem se dá conta disto, quando por exemplo paga a tarifa do transporte coletivo, por já estar habituada; mas reclama da taxa de lixo, cobrada junto com o IPTU; não vê a contribuição para o custeio da iluminação pública, embutida na conta de luz; paga o consumo de água; mas estranha quando é adicionado na fatura o serviço de esgotamento sanitário. 

Pior do que ter que pagar pelos serviços públicos é não contar com eles, ou tê-los de forma inadequada, sem regularidade e sem qualidade. Faltam às prefeituras não apenas capacidade financeira para disponibilizar os serviços, mas também capacidade técnica para gerir negócios que são complexos e custosos, o que também acarreta pouco domínio sobre os custos.  

Na grande maioria dos municípios, onde existem, o serviço de transporte coletivo funciona por ônibus no precário regime de permissão, com veículos de propriedade individual, sem oficinas nem estrutura de manutenção; o abastecimento de água é concedido à empresa estadual de saneamento, sem pagamento de outorga e sequer contrato de programa ou operado diretamente por serviço autônomo municipal, incapazes de acompanhar a expansão da cidade; o esgotamento sanitário só existe em pouco mais da metade das cidades e apenas 43% da população possui esgoto coletado e tratado; a limpeza urbana resume-se a varrição e coleta, sem adequada disposição final do lixo; a iluminação pública é o mais estruturado e amplo dos serviços, geralmente operado por concessionárias. Ou seja, quando se trata de serviços públicos, a população da maioria das nossas cidades vive ainda no pior dos mundos. 

Hoje em dia as boas práticas de gestão são as mesmas, tanto na área pública quanto na iniciativa privada, mas o setor público tem amarras institucionais, por exemplo, nas relações de trabalho com os servidores públicos e limitações nos valores adotados pelos políticos, que terminam afetando as questões de eficiência e taxa de cobertura dos serviços, comprometendo a eficiência e efetividade na sua prestação.  

Daí que a atração do setor privado é fundamental, para garantir que os serviços sejam prestados de forma adequada, já que o pagamento por eles existe em qualquer hipótese. O que vai ser diferente é a forma como essa atração vai se dar. E aí existem várias modalidades de relação entre os setores público e privado, abrangendo licitações, concessões e parcerias público-privadas. Nas licitações o Poder Público contrata o serviço e o remunera com recursos próprios. É o modelo menos adequado para serviços públicos, que devem ser remunerados pelos usuários e ter horizonte de longo prazo. 

No regime de concessão uma empresa privada é contratada para prestar o serviço e cobra a tarifa dos usuários. É o modelo mais frequente para o transporte coletivo por ônibus. No caso de iluminação pública e limpeza urbana, as prefeituras remuneram as prestadoras com recursos das respectivas taxas. Em ambos os casos é preciso estar atento à necessidade de realização de obra e a sua contínua expansão. 

As parcerias púbico-privadas, com prazo superior a cinco anos e porte mínimo, admite duas modalidades: a patrocinada e a administrativa e tem sido recentemente a alternativa mais buscada. A formação de consórcios é uma alternativa tanto para pequenas cidades, por falta de escala, quanto para regiões metropolitanas e aglomerações urbanas, pela conveniência de integração e otimização dos serviços.   

Para todos os casos é indispensável a existência prévia de estudos básicos e projetos técnicos cuidadosamente preparados, inclusive para definir a modelagem mais adequada.

Waldeck Ornélas é especialista em planejamento urbano-regional.