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Da Redação
Publicado em 23 de maio de 2021 às 12:46
- Atualizado há 2 anos
Ao fim das três primeiras semanas de depoimentos na CPI da Covid, o presidente da comissão, senador Omar Aziz (PSD-AM), está convicto de que o governo cometeu uma série de erros no combate à pandemia. Mesmo expondo impressões críticas, o parlamentar assumiu um tom paternal ao liderar os trabalhos no fogo cruzado entre governistas e opositores, garantindo, até aqui, que ambos os lados pressionassem e defendessem os convocados.>
O estilo do senador resultou em reconhecimentos até de aliados do Planalto, minoritários na CPI que mais despertou atenção nos tempos de predomínio do Twitter e do Facebook, com potencial explosivo contra o governo de Jair Bolsonaro. "Esta CPI é diferente das outras porque é a primeira que está na casa de todos os brasileiros. Temos uma responsabilidade com as mais de 446 mil famílias enlutadas", diz o senador ao Estadão. "Quem quiser politizar, vai precisar responder aos brasileiros. Não vou permitir politização. Estamos fazendo uma investigação com o máximo de isenção", ressaltou. "E que todos os brasileiros recebam as suas duas doses de vacina.">
Aos 62 anos, engenheiro civil e paulista de Garça - mas com carreira política feita toda no Amazonas -, Aziz não dispensa, no dia a dia da CPI, algumas alfinetadas para pontuar sua insatisfação com as respostas escorregadias dos convocados, alguns deles ex-ministros interessados apenas em adular o presidente da República.>
Quando o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, sentado ao seu lado, recusou-se a responder ao relator, Renan Calheiros (MDB-AL), se concordava com o ponto de vista de Bolsonaro sobre o uso da hidroxicloroquina contra a covid, Aziz saiu-se com esta: "Até minha filha de 12 anos falaria ‘sim’ ou ‘não’". No mesmo depoimento, tomou a liberdade de aconselhar Queiroga ao estilo "sincerão". "Aconselho V. Exa. a ser bastante objetivo para que não haja, mais tarde, problemas pessoais para V. Exa., porque, pelo andar da carruagem, se troca de ministro como quem troca de camiseta.">
Na oitiva de Fabio Wajngarten, ex-secretário de Comunicação de Bolsonaro, o senador Eduardo Girão (Podemos-CE), ligado ao Planalto, disse que o depoente estava sendo humilhado e induzido Aziz retrucou: "Humilhado é 425 mil mortes neste Brasil. Essas pessoas estão sendo humilhadas porque não tem vacina no País. Ele? Ele está muito bem protegido, todo mês tem o dinheirinho dele para comer", disse.>
Tradicionalmente, os relatores são os que mais se destacam na história das CPIs. Eles têm tempo livre para interrogatórios, podem partir para inquisições e direcionam as conclusões. Esse poder foi entregue por Aziz a Renan Calheiros. Contudo, desde antes do início dos trabalhos, a imparcialidade do veterano relator é questionada pelos governistas.>
‘Deixa disso’. Nos embates mais acirrados, Aziz é partidário do "deixa disso": entra em campo apaziguando e suspende a sessão por alguns minutos para frustrar o objetivo dos brigões de fazerem performances caprichadas para câmeras e microfones. No insulto mais grosseiro até aqui, quando Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), chamou Renan Calheiros de vagabundo, Aziz tirou por menos e paralisou a reunião para abreviar a briga. "Senador Flávio, eu estou tentando equilibradamente conduzir as coisas. E as agressões aqui não vão levar a lugar nenhum.">
Aziz é de um partido que, em tese, está na base do governo Bolsonaro. A escolha dele para a presidência contou com o aval do governo. O Planalto vislumbrou a possibilidade de um parlamentar da oposição ocupar o posto. O requerimento de instalação da CPI partiu de Randolfe Rodrigues (Rede-AP). Geralmente, quem propõe uma comissão a preside. Randolfe tornou-se o vice-presidente e trabalhou para que Renan Calheiros fosse confirmado na relatoria. Sob os holofotes de uma CPI, porém, toda ligação com o Planalto tem limite. O fato de Aziz ser do Amazonas, onde em janeiro o sistema de saúde entrou em colapso por falta de oxigênio para pacientes com a covid-19, dá a ele motivos para fincar os dois pés na procura por culpados.>
Segundo o líder do governo no Senado, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), ele tem mantido o equilíbrio, "buscando valorizar as posições de todos os membros da comissão, independentemente das suas". Seu maior arroubo, até aqui, foi uma reação à tentativa do governista Luis Carlos Heinze (Progressistas-RS) de poupar o ex-ministro Eduardo Pazuello, alegando que o governo Bolsonaro havia enviado mais de R$ 2 bilhões ao Amazonas no ano passado. Aziz gritou e chamou Heinze de mentiroso. Em seguida, desculpou-se.>
"Faltou oxigênio", disse, "as pessoas morreram. Eu recebi, no meu celular, mensagens de amigos, dizendo: ‘Meu pai está sem oxigênio. Omar, me ajude’. E fiquei ligando para ministro, atrás de oxigênio. E a gente de mãos atadas. Nunca foi falta de dinheiro".>
Omar Aziz caiu nas graças de internautas. Uma publicação que viralizou horas antes do depoimento do ex-chanceler Ernesto Araújo o associava ao técnico da seleção brasileira conduzindo os jogadores até o estádio em dia de Copa do Mundo. "O técnico Omar acredita em bom jogo", dizia o post.>
De fato, o senador aumentou a relevância nas redes. Do início da CPI até sexta-feira, ganhou 28 mil seguidores no Twitter. Chegou a 85,7 mil. Apenas no segundo dia de depoimento de Pazuello mais de 6 mil usuários aderiram ao perfil. Ganhou mais do que Renan Calheiros, que passou de 173 mil para 191 mil.>
Lutas antigas. Na internet, ele apresenta um perfil jovial, antenado. O estilo "quadradão" do senador que ganhou a simpatia das redes também pode ser aplicado à própria sistemática de CPI, um instrumento que desde as investigações do mensalão não atraía tanta audiência e voltou aos holofotes.>
A postura de Aziz nas redes e no plenário lhe valeu a alcunha de "herói com voz de vilão", referência ao seu tom rouco. Ele tem uma empresa para gerenciar toda a sua comunicação. Seu perfil oficial interage durante as sessões, pede sugestões e embarca em brincadeiras. A um usuário que perguntou qual filme veria no fim de semana, respondeu: "‘Retroceder nunca... render-se jamais!’.>
A CPI marca a entrada do senador no jogo político nacional. No Amazonas, foi vereador e vice-prefeito de Manaus, deputado estadual e governador. Em 2019, uma investigação sobre contratos do governo para a gestão de unidades de saúde prendeu sua mulher, a deputada estadual Nejmi Aziz, e três irmãos. O senador não se tornou réu.>
Com Aziz na CPI, apenas algumas páginas da extrema-direta na internet fizeram menção ao caso. Os governistas precisam dele para que os requerimentos que visam ampliar o foco da comissão sejam votados. Também cabe ao senador tomar algumas medidas que os governistas trabalham para evitar. Foi dele a decisão de negar o pedido de prisão de Wajngarten, feito por Calheiros. "Não serei carcereiro.">
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.>
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