Som histórico de volta: sinos da Igreja do Bonfim tocam novamente depois de 30 anos

Automatização que possibilitou a volta do badalar custou R$ 65 mil e já foi feita em oito igrejas de Salvador

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  • Wendel de Novais

Publicado em 13 de maio de 2021 às 14:52

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Nara Gentil/CORREIO

Pela oportunidade de ouvir um som histórico e saudoso. Foi por isso que Manelice Reis, 57 anos, que está desempregada, saiu de sua casa, na Ribeira, rumo à Colina Sagrada em passos apressados. É que, pela TV, a soteropolitana viu que, nesta quinta-feira (13), após três décadas em que ficaram parados, os quatro sinos da Basílica do Senhor do Bonfim voltariam a tocar juntos. "Na hora do café, cedinho, falaram na TV que os sinos iam tocar. Ali, eu já fiquei toda arrepiada. Me emocionei, comecei a chorar. Até tinha coisa pra fazer, mas eu nem me importei, nada é mais importante que ver isso. Corri, tomei meu banho e me mandei pra cá", relata.

O som que Manelice saiu de casa para escutar hoje poderá ser ouvido outras milhares de vezes por ela e por quem mais quiser. Porque, ao contrário do que acontecia antes quando ele ecoava apenas em ocasiões especiais, o campanário com os quatros sinos vai vibrar todos os dias às 12h e 18h daqui em diante. A revitalização e automatização do sistema dos sinos que possibilitou esse toque diário contou com o investimento de R$ 65 mil arrecadado integralmente com benfeitores pela Secretaria do Turismo do Estado (Setur), que conduz o Projeto de Resgate do Toque dos Sinos e restaurou oito campanários em Salvador e um em Porto Seguro.

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Um projeto que, além de fazer os sons do campanário de sinos ecoarem pela colina, restaurou uma das tradições históricas da Igreja e deu de volta aos fiéis uma sensação perdida nas últimas quatro décadas. Manelice, por exemplo, não conseguia segurar a emoção antes mesmo que os sinos tocassem. "Ave Maria, a emoção não cabe em mim, já tô é chorando aqui por conta da expectativa. O som dos sinos é forte, toca profundamente em nós. Eu tenho isso como resposta aos nossos pedidos para o Senhor do Bonfim", diz emocionada. Manelice não pôde perder a volta do toque dos sinos (Foto: Nara Gentil/CORREIO) Emoção que também tocou a dona de casa Jacilene Sampaio, 43, que subiu a colina de joelhos sem saber que, ao chegar na porta da Igreja, iria poder ouvir o som dos sinos tocando em harmonia pela primeira vez. “Eu subi de joelhos porque Deus me mandou fazer isso. Nem sabia dessa notícia. Só dá pra dizer que é milagre porque nada é à toa. Se eu chegasse aqui e a Igreja estivesse fechada, já valeria a pena. Agora, me sinto ainda mais abençoada``, conta.  Jacilene comemorou a volta dos sinos depois de três décadas (Foto: Nara Gentil/CORREIO) Outro que se sentiu duplamente presenteado foi o aposentado Carlos Roberto Lima, 73, que faz aniversário hoje e, assim como todo ano, veio agradecer pela vida sem esperar pela grata surpresa. “Eu vim para agradecer por estar com saúde e bem como já é tradição pra mim. Não fazia ideia da volta dos sinos, o que me deixa ainda mais feliz. Realmente não tem como não se sentir duplamente agraciado por esses presentes. A vida e essa tradição que é tão cara para nós”, declara. Carlos se sentiu duplamente presenteado com o aniversário e o badalar dos sinos (Foto: Nara Gentil/CORREIO) Tradição na liturgia

Historiador e coordenador do projeto que traz o badalar dos sinos de volta, Rafael Dantas explica o apelo emocional e histórico que a tradição de tocar os sinos tem para os fiéis. "Os sinos foram constantes na sociedade  e, há meio séculos, eles vinham se perdendo. O badalar, historicamente, tem uma relevância litúrgica. É um chamado com Deus que toca os fiéis e, por isso, se torna um atrativo maior para o turismo religioso que procuramos fomentar", explica.

Dantas fala ainda sobre a influência que o tocar dos sinos tinham na relação com o tempo feita pelas pessoas e que pode retornar. "É também um aviso social. Antes do relógio e do smartphone, as pessoas estavam constantemente ligada no badalar dos sinos para saber coisas como a hora do almoço, de jantar. Algo que é resgatado com a verdadeira sinfonia de sinos que volta a tocar com o projeto de revitalização", diz.

Impacto para o turismo

Titular da Setur, Fausto Franco disse que a reinauguração dos sinos no Bonfim e nos demais templos da capital é também uma estratégia de incentivo ao turismo. "Um dia importante pra nós. Afinal, quem é que vem pra Salvador e não vem na Igreja do Bonfim? A nossa intenção é pegar as igrejas de cunho turístico e resgatar o toque dos sinos que, além de momento de reflexão, vira uma atração a mais pra quem vem para conhecer. E a Basílica do Bonfim não poderia de forma nenhuma ficar fora dessa iniciativa", fala. Secretário afirma que sinfonia de sinos na cidade é um importante incetivo ao turismo religioso (Foto: Nara Gentil/CORREIO) Entre as igrejas que receberam o novo sistema, que chegou através do  Projeto de Resgate do Toque dos Sinos, estão a Igreja do Rosário dos Pretos, a Igreja de Nossa Senhora da Graça, a Igreja de Santo Antônio da Barra, a Igreja do Passo e a Igreja da Ajuda. 

*sob supervisão da chefe de reportagem Perla Ribeiro