Tecnologia desenvolvida por indiano que morou na Bahia vai sobrevoar Marte

Conheça a história Venkata Rajasekhara Gosula, responsável por chip que dá potência à navegação de helicóptero da Nasa

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  • Carolina Cerqueira

Publicado em 16 de abril de 2021 às 05:45

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Arquivo pessoal

O quarto planeta a partir do Sol, também conhecido como “Planeta Vermelho” e um estado brasileiro de 417 municípios aqui na Terra. Dois lugares com uma distância enorme, mas conectados por Venkata Rajasekhara Gosula, o Raja, um indiano de 56 anos que chegou à Bahia aos seis. É que, nos próximos dias, a Nasa vai sobrevoar Marte com uma espécie de drone, inspirado nos irmãos Wright, cujo chip foi desenvolvido sob a liderança de Raja, que é engenheiro eletricista, quando ele trabalhava na empresa Qualcomm. 

O objetivo do tão esperado primeiro voo do helicóptero Ingenuity, de 1,8 kg e 1,2 m, que leva um drone, é captar imagens do planeta e treinar o sobrevoo em locais de condições adversas. Será o primeiro voo motorizado de uma aeronave em outro planeta. O drone contém um chip (o PM8941) que tem uma parte digital e outra analógica e é responsável pela potência da placa de navegação do equipamento. A parte digital  foi desenvolvida por uma equipe de 10 engenheiros liderada por Raja, há cerca de oito anos. 

Inicialmente, o aparelho foi criado para celulares e foi utilizado por marcas como Sony, Samsung, Nokia e LG. Depois, quando a Qualcomm decidiu entrar no mercado de drones, ele passou a ser usado no kit de robótica dos equipamentos, nomeado de Qualcomm Robotics Flight Kit 801. “O sucesso do chip PM8941 nos celulares o ajudou a ser escolhido para o kit de robótica”, diz Raja. Chip PM8941 desenvolvido sob a liderança de Raja (Foto Arquivo pessoal) E foi assim que o kit, que contém o chip, foi parar nos laboratórios da Nasa. “Depois que saí da Qualcomm, não sabia sobre essa conexão entre o PM8941 e o Ingenuity. Eu não fazia ideia. Aí comecei a receber mensagens de ex-colegas ainda na Qualcomm sobre nosso chip estar em Marte”, conta. 

“Sempre me sinto com sorte quando os projetos em que trabalho terminam em produtos vendidos aos milhões em todo o mundo. Saber que os circuitos que projetei estão funcionando sob o capô em todos os lugares é o orgulho da engenharia. Mas saber que eles estão trabalhando em Marte é algo fora deste mundo!”, revela Raja, orgulhoso. Helicóptero Ingenuity que carrega o chip desenvolvido por Raja (Foto: Arquivo pessoal) Indiano de coração baiano

Um fã de acarajé, pimenta e carnaval. Mesmo tendo nascido na Índia, Raja chegou a Salvador ainda criança e diz que a Bahia é a sua casa. Hoje ele mora nos Estados Unidos, é casado com uma brasileira, tem dois filhos e nunca se desconectou da sua terra. Seus pais e seu irmão moram aqui e só mesmo o coronavírus impediu as visitas anuais para matar a saudade.    “Meus pais ainda tentavam dar uma educação baseada na cultura indiana, mas todos os amigos e colegas eram brasileiros, não teve jeito. Até meus pais acho que sucumbiram e viraram brasileiros. Sempre há esse embate entre a cultura em casa e a cultura fora de casa e digo que acaba sendo uma mistura”, explica Raja, que se denomina um ‘baiano-americano-indiano’. Raja e a esposa matando a saudade do acarajé em visita à Bahia (Foto: aquivo pessoal) Quando questionado sobre o que sente falta na Bahia, a resposta veio até listada em ordem de importância, colocando no pódio a família, a calorosidade e bom humor do povo baiano e o acarajé. Também teve espaço para a moqueca, caldo de sururu, vatapá, caruru, caldo de cana, as frutas que só a Bahia tem e, claro, a água do mar na temperatura de dar inveja a qualquer gringo. 

O irmão, Vijaya Gosula, de 49 anos, revela que Raja também é fã de futebol. “A versão brasileira do meu nome é Vitor, aí ele escolheu torcer para o Vitória por causa disso. Eu, para fazer valer o conflito entre irmãos, me tornei torcedor do Bahia”, diz ele, rindo.  Raja durante a Copa do Mundo de 2018 (Foto: Arquivo pessoal) Raja chegou em Salvador em 1971, aos seis anos e morou no bairro do Stiep. “Meu pai estava fazendo doutorado nos Estados Unidos e um dos professores da banca de doutorado dele era brasileiro e falou para ele de uma vaga de professor de matemática na Ufba. Aí a família toda foi junto”, conta. 

Aqui, estudou na Escola Panamericana e no Colégio Antônio Vieira. Depois, ingressou na Universidade Federal da Bahia (Ufba) para cursar Engenharia Elétrica e foi para os Estados Unidos, em 1983, onde fez dois mestrados, um em engenharia eletrônica e outro em computação.

Vijaya Gosula conta que a família toda é fã dos números. A mãe é formada em bioquímica, o pai é PhD em Matemática, Vijaya é físico e químico e a irmã cursou engenharia da computação na Ufba. “É todo mundo meio nerd. Os três irmãos estudaram fora do país, só eu voltei para o Brasil e moro em Salvador, assim como meus pais”, diz o irmão.  Raja hoje trabalha em San Diego, na Califórnia (Foto: Arquivo pessoal) Raja também esteve em Salvador de 2007 a 2011 a trabalho, como diretor da empresa LSI-TEC Nordeste, uma instituição de ciência e tecnologia. Atualmente, trabalha na empresa Cisco Systems, em San Diego, na Califórnia, desenvolvendo circuitos digitais para processamento de sinais de produtos de fotônica de silício, usada em redes de comunicações de fibra ótica. E, claro, pretende continuar espalhando seus frutos tecnológicos pelo mundo todo. 

*Com orientação da chefe de reportagem Perla Ribeiro