Tráfico leva mais um episódio de terror ao Engenho Velho da Federação

Polícia Militar diz que pretende instalar duas Bases Móveis no bairro

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  • Bruno Wendel

Publicado em 14 de julho de 2020 às 18:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Marina Silva/CORREIO

Como é viver num local onde o medo é a principal companhia? Essa é a situação dos moradores do bairro do Engenho Velho da Federação, que há 15 dias dormem e acordam com os tiros deflagrados pela disputa entre duas facções criminosas. O caso mais recente aconteceu na noite desta segunda-feira (13), quando cerca de 20 homens do Comando da Paz (CP) invadiram a localidade da Mangueira e mataram Gilson do Carmo Moura, 20 anos. Segundo moradores, o rapaz seria integrante do grupo rival Bonde do Maluco (BDM). 

Nas redes sociais, circulam vídeos da ação dos bandidos. Um deles mostra a chegada de traficantes do CP à Mangueira. Em outra gravação, feita também por moradores, dá para ouvir o baralho dos tiros. Segundo a Polícia Civil, Gilson possuía uma passagem por tráfico de drogas. A autoria e motivação do crime são apuradas pela 1ª DH/Atlântico, unidade do Departamento de Homicídio e Proteção à Pessoa (DHPP).  Homem foi morto por rivais na Mangueira, no Engenho Velho da Federação (Foto: Marina Silva/CORREIO) Para minimizar os impactos da violência na região, a Polícia Militar informou que há previsão de que duas Bases Móveis sejam posicionadas a partir de desta terça-feira (14) em pontos estratégicos no bairro do Engenho Velho da Federação. A medida era para ter sido posta em prática no início deste mês, conforme anúncio do comandante-geral da PM, coronel Anselmo Brandão, durante a implantação da Base Móvel no bairro de Sussuarana (leia mais abaixo).

Briga antiga A briga entre as duas organizações criminosas para assumir o controle do tráfico de drogas no Engenho Velho da Federação é antiga, mas se intensificou no dia 28 de junho quando quatro homens do Comando da Paz, facção que atua na localidade do Forno, entraram atirando nas ruas Xisto Bahia e das Palmeiras, conhecidas como Lajinha e Baixa da Égua, que são dominadas pelo BDM. Como resultado da ação, uma criança de 9 anos ficou ferida. O menino levou um tiro na perna e foi encaminhado para o Hospital Geral do Estado (HGE) e já teve alta. 

Moradores cobram medidas mais efetivas da polícia, como a ocupação do bairro. “O Engenho Velho (da Federação) é divido em duas facções, BDM e CP, e isso vem deixando todo mundo apavorado. O policiamento existe, mas é feito na área principal, onde a viatura consegue chegar com facilidade. Tem becos que você entra na Vasco da Gama, próximo ao Bompreço, e vai sair lá em cima na Universidade Católica (Ucsal). Então, é difícil a topografia. Tem que ser uma operação para ficar dentro do bairro, senão vai continuar morrendo gente, não tem jeito”, declarou um morador entrevistado pelo CORREIO.

Invasão O ataque dos integrante do CP aconteceu por volta das 20h desta segunda. O grupo, liderado por Gel Baiano, deixou a localidade do Forno e seguiu uma parte a pé e outra em carros – um total de 15 homens armados com pistolas. O rapaz morto estava sozinho quando foi surpreendido numa escadaria da Ladeira Santo Antônio, na Rua Silvestre Farias. Ele sofreu várias perfurações e morreu no local. Segundo moradores, a vítima fazia parte da BDM, facção que controla o tráfico na Mangueira.   O grupo da CP que atua no Forno está de olho em outros pontos de drogas do Engenho Velho da Federação, controlados pelo BDM, como a Muriçoca, que tem como líder o Manga – seus principais “soldados” são Biscoito, Sidnei, Vinícius e Barrote. O BDM está presente também no Parque São Brás e Lajinha. Sobre o crime desta segunda, a PM informou que policiais da 41ª Companhia Independente (CIPM/Federação) foram acionados com informações de disparos de arma de fogo e de um homem ferido na Rua Silvestre Farias. 

“No local, a guarnição localizou a vítima já sem vida, isolou a área e acionou a perícia para proceder com a remoção do corpo. A motivação e autoria são desconhecidas. O policiamento foi intensificado na região e adjacências”, diz nota enviada ao CORREIO. Viatura da Polícia Militar circulando na via principal do bairro (Foto: Marina Silva/CORREIO) Pânico Na manhã desta terça (14), o CORREIO ouviu moradores do bairro. Todos os depoimentos relataram o pavor e cobraram uma ação mais presencial da polícia.“A população de bem está em pânico total. As pessoas não saem de casa. Para ir trabalhar é um trabalho danado. As autoridades deveriam dar uma reposta ao tráfico de drogas no bairro. Fazer uma operação e ficar vários dias no bairro para ver se segura a onda, caso contrário vai morrer é gente até esses caras tomarem a boca”, disse uma mulher. “A comunidade de bem pede mais atuação da polícia, com mais energia e ficar no bairro. Os caras do Nordeste de Amaralina, que são CP também, se juntam com os caras do Engenho Velho (da Federação) e formam um grupo de 30, 40 homens armados”, declarou um morador. Expulsão de moradores Uma outra situação apontada como reflexo da violência é a expulsão de moradores. “Tenha certeza: o cidadão de bem que mora na Muriçoca, que não tem nada a ver, que não se envolve, ele não pode ir a outros lugres do bairro comprar uma fruta, porque pode ser área de outra facção e pegar para ele. Além da troca de tiros e dos assassinados, tem várias famílias que são postas para fora de suas casas. Se você chegar na região do Forno e da Lajinha, que é o local mais perigoso, tem muita família que foi expulsa. Muita casa vazia”, contou uma senhora.  Em nota, a Polícia Militar informou que o “policiamento nos becos e vielas existe, é constante e inclusive já foi e é objeto de inúmeras matérias nas mídias televisivas sendo comum encontrar guarnições realizando incursões diariamente em diversos pontos do bairro com a finalidade de reprimir e prevenir crimes”, diz nota.

A PM disse ainda que, “como a Polícia Militar atua de acordo com a mancha criminal, torna-se fundamental o apoio da população através do registro da ocorrência na delegacia, das denúncias ou do acionamento via 190 assim que presenciarem o crime ou alguma atividade delituosa”. 

Sussuarana Numa situação semelhante à do Engenho Velho da Federação, traficantes da façção BDM e da Tropa do A entraram num confronto que durou toda madrugada do dia 30 na localidade do Parque Jocélia, em Sussuarana. Logo, vídeos gravados pelos próprios moradores mostraram o cenário pós-guerra: carros, casas, muros e outros perfurados a tiros, inclusive de fuzil.  No dia seguinte, o comandante da PM, coronel Anselmo Brandão, esteve pessoalmente no local e determinou a instalação de uma Base Móvel. Na ocasião, ao ser questionado se a ocupação ocorreria também em outros bairros, o comandante da PM disse que a instalação da base seria também imediata na mesma semana nos bairros de Engenho Velho da Federação e Saramandaia, o que não aconteceu.