Turismo de experiência é a nova aposta de empreendedores

Sebrae vê grande potencial de crescimento no setor

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  • Da Redação

Publicado em 17 de dezembro de 2018 às 06:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: ASN/divulgação

Quando os estrangeiros começaram a visitar favelas do Rio acompanhados de guias de turismo, parte da população brasileira torceu o nariz para o que parecia ser um exotismo. Mas é cada vez maior o número de pessoas que, em suas viagens, querem ir além de uma selfie no ponto turístico para mergulhar na cultura local, como ter aulas de capoeira em Salvador ou fazer atividades cotidianas de um soteropolitano, como ver o pôr do sol desde o Farol da Barra.

O chamado turismo de experiência é uma das apostas das autoridades para criar novos postos de trabalho e empreendimentos em um setor que faturou US$ 163 bilhões no Brasil no ano passado e que, estima-se, vai responder por 8,2% do PIB em 2028, segundo estudo da consultoria Oxford Economics feito para o Conselho Mundial de Viagens e Turismo (WTTC). 

“Por que não promover piquenique com turistas durante o pôr do sol ou elaborar um roteiro com as cinco igrejas mais importantes da cidade”, questiona Ana Paula Flavio Almeida, da Coordenação de Turismo e Economia Criativa (CTEC), do Sebrae. Ela ressalta que no Centro Histórico já existe uma comunidade de prestadores de serviço voltados para turistas, mas que não podem ser encontrados na internet para que o visitante saiba como encontrar o que está procurando na cidade.

No site Viator, do grupo TripAdvisor, porém, o turista pode encontrar desde um passeio de helicóptero de 40 minutos sobre Salvador e Litoral Norte, por 570 euros (R$ 2.490), uma aula particular de seis horas para aprender a fazer moqueca por 96,79 euros (R$  423) e um passeio pela favela de Saramandaia por 98,59 euros (R$ 430). Até a Arena Fonte Nova entrou na onda e oferece um tour de uma hora e 15 minutos por 8,32 euros (R$ 36).

“Hoje,  guias de turismo não precisam mais depender só das agências e podem criar seus roteiros e experiências, vendendo através dos canais digitais como o Viator ou Airbnb”, diz Ana Paula. “O mesmo vale para empreendedores capacitados e empresários que queiram expandir e inovar no atendimento, oferecendo mais opções de atividades para seus clientes”, completa. 

Aposta

A aposta do Sebrae é que surjam pequenas iniciativas de prestação de serviços para turistas. Como o site Goon (guidegoon.com), plataforma que reúne dados de guias de turismo profissionais de Salvador e dá informações sobre os idiomas que cada um fala e as suas respectivas espacialidades: natureza, história, cultura. “Desenvolvemos um produto bem específico para criar um diferencial em relação ao Viator e outros sites internacionais”, explica um dos criadores do projeto, Marcus Casaes, que está desenvolvendo o projeto em parceria com a prefeitura de Salvador depois de ter sido um dos projetos selecionados na versão 2017 do Hackathon+Turismo, maratona de inovação promovida anualmente pelo Sebrae e pela Rede Mais.

Os organizadores do guia almejam fazer parceria com pelo menos metade dos cerca de 300 guias de turismo sindicalizados. Pelo modelo de negócio proposto, os turistas acessam o serviço gratuitamente através do site e os guias que se associarem baixam o aplicativo e pagam uma assinatura. Sobre o percentual, Casaes desconversa. “Essa é uma informação mais sigilosa e estratégica da startup. Mas é algo que é muito bom para todos”, afirma.    “No exterior, temos visto muito essa prática de vender experiência online para acesso direto ao turista, e agora isso está se expandindo pelo Brasil”, afirma Ana Paula, que acredita em uma maior disseminação dessa cultura a partir da realização do 39º Congresso Brasileiro de Guias de Turismo, que acontece de 22 a 29 de março do ano que vem em Salvador, no Hotel Pestana Portas do Carmo.

Tradição

Para quem sonha em montar negócios tradicionais de turismo, como pousadas, bares e restaurantes, Ana Paula considera haver dois bairros mais consolidados para esse tipo de empreendimento: Rio Vermelho e Santo Antonio Além do Carmo. “Cabe aí avaliação do posicionamento de mercado. O que se pretende ofertar e para qual público”, assinala. Sobre o que diferencia os dois bairros, ela disse: “O Rio Vermelho, nos últimos anos, tem atraído um público mais jovem, que não gasta muito”.

Professor de empreendedorismo do curso de Gestão de Turismo da Unifacs, Paulo Henrique Oliveira vê como áreas com bom potencial para empreender no setor de Turismo a gastronomia (pratos de outras regiões da Bahia), o aluguel de barcos, receptivo para idosos e pessoas com deficiência, além de divulgação de produtos turísticos nas redes sociais. “Uma das principais fontes de informação sobre destinos turísticos é o Youtube”, exemplifica.  No interior do estado, Boipeba e Barra Grande são os locais apontados por ele como os mais promissores para empreendimentos turísticos, uma vez que Praia do Forte, Itacaré e Morro de São Paulo já apresentam muita concorrência. Natalia Borini Prida (Foto: Acervo Pessoal) Natalia Borini Prida, da Brazil Trip Tour  

“Eu fui morar em Itacaré em 2009, já vou fazer 10 anos lá. Eu sou economista, com mestrado em desenvolvimento local, e queria morar em um lugar pequeno para ver como eram as relações entre as instituições e a comunidade. Como era um trabalho voluntário, surgiu a possibilidade de trabalhar com a  agência Brazil Trip Tour. 

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Começamos então a articular um trabalho com os moradores que têm um serviço para oferecer.  Nós trabalhamos com passeios, transfers e hospedagem. Nesse caso, a gente só faz a intermediação. Nós montamos o pacote e temos um comissionamento. A gente prioriza sempre a oferta de casas de quem é local. Damos preferência a indicar pessoas que gostam de interagir e não apenas quem tem uma casa lá só para ganhar dinheiro. A gente sabe que é bem diferente o atendimento quando alguém só pensa em ter lucro e a pessoa que mora lá, que está comprometida com o destino. 

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Quanto aos clientes, há os que têm uma visão  ampla e outros que querem apenas seguir um roteiro. A primeira pergunta que eu faço quando um cliente entra em contato comigo é o que eles gostam de fazer. As pessoas normalmente chegam perguntando o que é que tem. Então, a gente tenta adaptar o que tem com o que as pessoas querem fazer. 

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Itacaré tem, além de sol e praia, turismo de aventura, de observação, ecoturismo, turismo rural, cultural e náutico. Se eles querem alguma coisa diferente, a gente organiza.A maioria dos turistas que vêm para Itacaré é formada por brasileiros, mas recebemos vários estrangeiros, a maioria desses pesquisa com antecedência e já sabe da nossa história através do site. 

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Quem vem pela primeira vez normalmente busca o tradicional. A partir da segunda visita, as pessoas se animam a coisas diferentes, como pessoas de grandes cidades que viajam muito e buscam turismo de experiência”.

Novos negócios em turismo - abrace uma oportunidade

Vendas online Muitos serviços que são oferecidos aos turistas de forma improvisada na rua podem virar um bom negócio se estiverem disponíveis na internet. Alguém que queira vir a Salvador para aprender a fazer uma moqueca de camarão, por exemplo, vai ter sua vida facilitada se encontrar um site que ofereça o curso. Há espaço também para novos canais de divulgação de produtos. Os turistas já têm a opção de acessar o Viator ou o AirBnb para contratarem a maioria dos serviços necessários a um visitante. Mas essas plataformas são globais. Canais que divulguem conteúdo específico da cidade ou de um bairro podem ter sucesso desde que ofereçam um diferencial, como material detalhado para assinantes, por exemplo. 

Experiência A Organização Mundial do Turismo considera que o viajante deste milênio quer fazer parte, por alguns dias, do contexto local e não apenas tirar fotografias. Mas para que o serviço ou produto que se oferece tenha sucesso dentro dessa lógica de experimentar é fundamental que aspectos básicos de qualidade como atendimento, higiene, pontualidade, organização, boa conservação e limpeza já façam parte do cotidiano de quem oferece.  Não adianta ter um site em inglês anunciando um piquenique no Morro do Cristo para o pôr do sol se o lanche só chegar depois de escurecer, se a comida não tiver boa aparência ou estiver estragada e se, para completar, aparecer alguém anunciando um assalto. A propaganda online não vai ser boa.   

Passeios Um turista que venha a Salvador em um feriadão vai ter sua experiência otimizada se já chegar sabendo que horas ele vai visitar as principais igrejas da cidade ou tiver um roteiro de restaurantes escolhido com antecedência.

Diferencial Oferecer serviços a públicos específicos, como passeios para idosos, pode ser uma maneira de se destacar perante a concorrência. A Taty Melo Tour, por exemplo, oferece atendimento em linguagem de libras para clientes surdos. Outra inovação pode ser abrir lanchonetes e restaurantes que ofereçam pratos regionais que não sejam à base de dendê. Há uma  variedade de sabores no interior do estado que podem servir de base para um novo negócio gastronômico. 

Localização  Para quem planeja investir em um negócio tradicional, como pousada ou restaurante, o Sebrae ressalta que é fundamental estudar o perfil do consumidor que frequanta o bairro. Barra Grande, no Baixo Sul, surge como uma área promissora para empreendimentos voltados para o público AA e a Ilha de Boipeba aparece como uma nova candidata a rivalizar em breve com Morro de São Paulo, Praia do Forte e Itacaré, destinos consolidados. Em Salvador, Rio Vermelho e Santo Antonio Além do Carmo figuram como os bairros mais adequados para a instalação de negócios voltados para o turismo. Mas o Sebrae avalia a Barra como um bairro subestimado para a abertura de negócios inovadores, principalmente com o fechamento de vários negócios tradicionais naquele espaço, abrindo espaço físico para inovadores.  

Atrações inusitadas Um dos aspectos defendidos pelos articuladores das propostas de inovação no setor de turismo é a formatação de produtos e serviços criativos. A consultoria do Sebrae-BA  se propõe a desenvolver novos produtos e serviços, primando pela identidade local ou tematização, visando oferecer experiências inusitadas aos clientes. A metodologia contempla o desenvolvimento de todos os detalhes para a implantação do novo serviço ou produto, modelagem de negócios, criação da identidade visual, implantação de prototipagem, precificação, apresentação para especialistas e/ou clientes visando o recebimento de avaliação e sugestões de melhorias, plano de ação para implementação e plano de divulgação e comercialização.