Uma baiana no barril de Chernobyl: ‘não via a hora de sair de onde estava apitando’

Gabriela Valverde, do perfil Viajando com Gabi, ficou pertinho de reator que explodiu e relata experiência

Publicado em 1 de setembro de 2019 às 09:33

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: @viajandocomgabi

Quando o reator número 4 da usina nuclear de Chernobyl, na Ucrânia, explodiu, em abril de 1986, Gabriela Valverde ainda era um bebê cheio de energia, com menos de um aninho de vida. Mais de três décadas depois, ainda se discute o número de mortes em decorrência do acidente. A Agência Internacional de Energia Atômica estima em 4 mil, sendo duas no dia, pela explosão, e 28 nas semanas seguintes, pela radiação, mas o mais impressionante é que esse perigo invisível ainda paira no ar, e Gabi, hoje com 33 anos, pôde comprovar na semana passada.

“Você não sente o cheiro, não toca, não vê. Sem o medidor de radiação você não tem nem ideia dos riscos. Visitar um lugar onde existe um risco invisível foi a experiência mais diferente da minha vida”, afirmou a autodenominada nômade digital, que já conheceu 79 países, após a visita a Pripyat, cidade onde a usina desativada fica localizada.

O grande sucesso da minissérie Chernobyl, que estreou no canal fechado HBO em maio, encenando os horrores do acidente nuclear, provocou um curioso aumento do turismo na região – as reservas em hotéis chegaram a aumentar 40% na cidade, que fica a pouco mais de 100 km da capital do país, Kiev.

Mas Gabriela Valverde, dona do perfil de viagens @viajandocomgabi, com 237 mil seguidores no Instagram, conta que não é um desses turistas modinha, apesar de admitir que, mesmo diante do barril, a produção televisiva aumentou a curiosidade pelo local. “Eu só vi a série quando já estava em Kiev, dias antes de conhecer Chernobyl. A série aumentou o número de interessados com certeza, mas eu já queria ir lá muito antes dela existir”, afirmou. Gabriela Valverde em ponte de Prypiat (Foto: @viajandocomgabi) Exposição O passeio turístico ocorreu no último dia 20, quando Gabi entrou numa van com outras 13 pessoas – incluindo um motorista e um guia – para um tour pela área atingida e, praticamente, evacuada após o acidente. Embora somente uma exposição mais prolongada à radiação que resta represente perigo real, os números do passeio assustaram a viajante. 

“Quando o medidor apitava, eu ficava tão nervosa que já queria voltar pro carro. Não toquei em nada, não sentei em lugar algum e não comi do lado de fora do carro. O guia falou que para haver danos precisa ser exposto por mais tempo. E que estávamos seguros”, relembra ela, que antes de ir embora passou por um medidor corporal, “tipo um scanner, que fala se os níveis de radiação do nosso corpo estão ok”.

Segundo a Organização Mundial de Saúde, até 0.3 mSv/h (milésimos de Sievert, unidade que mede os efeitos biológicos da radiação) é aceitável, mas Gabi enfrentou 10mSv/h ao passar pela Floresta Vermelha, e 24mSv/h, no Café Prypiat. Medidor próximo a estátua de Lênin aponta 17 mSv/h. Valor aceitável é 0.3 mSv/h (Foto: @viajandocomgabi) Agora, como garantir que não passa nada (e nem pode)? “Eles recomendam ir de sapato fechado, calça e camisa de manga comprida. E alugam trajes especiais e bolsa para sapato, para colocar por cima. No nosso grupo duas pessoas utilizaram trajes especiais”, explica.

Como reforço de segurança, os visitantes também têm de colocar um medidor no pescoço, a fim de saber o total de exposição à radiação durante o tour.

E é bom que o protetor funcione mesmo, porque o passeio é longo – cerca de 12 horas – e vai até o olho do furacão. “Chegamos até a frente dele [reator 4], muito perto”, diz ela, ao mostrar uma foto a poucos metros do galpão. Em 2016, um novo abrigo para isolar o reator, feito de aço, foi entregue.

[[galeria]]

Moradores Apesar da possibilidade de chegar perto das ‘instalações’ originais da tragédia, a série não foi gravada em Prypiat. “Foi quase toda filmada na Lituânia, onde fica Ignalina, usina irmã de Chernobyl. E as cenas em Prypiat foram feitas em Vilnius. Ficou muito parecido. Achei incrível a similaridade”, comenta Gabi.

Mas se a produção que voltou a despertar o interesse sobre o assunto não passou perto, há quem ainda more por lá desde sempre. “Não tinha ideia de que Chernobyl ainda tem 3 mil pessoas morando e que também existem os ‘self-settlers’, pessoas que voltaram para suas casas depois do acidente. Difícil imaginar. Para isso precisamos entender mais sobre o acidente”, diz a nômade digital.

Aliás, o próprio guia do passeio trabalhava na usina e também vive em Chernobyl.

Quanto custa ir Pra quem mora longe de lá, mas deseja dar um rolê, Gabriela Valverde dá o canal pra quem parte da Bahia. “Recomendo voar para Portugal, França ou Alemanha que é fácil pegar voo interno. Ou compra para Kiev fazendo um ‘stopover’ de alguns dias para conhecer outro país. Mas o destino final tem que ser Kiev, capital da Ucrânia e principal base para fazer o tour”, afirma ela.

Os passeios têm preços que variam de 80 euros (R$ 369) a 150 euros (R$ 684). “Precisa marcar com antecedência, pois eles pegam os dados do passaporte para registrar sua ida junto ao governo”, alerta Gabi.

Quanto à passagem, partindo de Salvador, dava pra achar passagens, ida e volta, essa semana, a partir de R$ 3,8 mil. De hospedagem, é possível achar diária em hotel ou hostel a partir de R$ 60. Gabi viaja pelo mundo desde 2015 (Foto: @viajandocomgabi) Quem é ela Cria do bairro do Imbuí, em Salvador, Gabriela Valverde, 33 anos, é pós-graduada em Psicologia. Realizou sua primeira viagem internacional em 2012 e vive viajando pelo mundo desde 2015. São 79 países no currículo, alguns deles já revisitados, como ela mostra no perfil @viajandocomgabi. “Viajo por conta própria e faço parcerias para viabilizar a viagem quando acho interessante. Trabalhei em navio de cruzeiro 2 anos pra juntar grana pra viajar e hoje monetizo as viagens através do Instagram”, explica a nômade digital.