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“Uma soberba simplicidade”

  • Foto do(a) author(a) Kátia Borges
  • Kátia Borges

Publicado em 16 de julho de 2022 às 07:00

 - Atualizado há 2 anos

. Crédito: .

No prefácio que Charles Bukowski escreveu para “Pergunte ao pó”, de John Fante, numa edição da Black Sparrow do início dos anos 1980, ele conta de suas andanças em busca de referências literárias nas bibliotecas públicas de Los Angeles, quando ainda era um jovem aspirante a escritor e vivia bêbado e faminto. 

No Brasil, “Pergunte ao pó” chegou com tradução do poeta curitibano Paulo Leminski, o que empresta ainda mais charme à edição brasileira de 1984 da José Olympio (o exemplar que tenho aqui foi traduzido por Roberto Muggiatti, jornalista especializado em música). Muggiatti também é uma lenda, diga-se.

Embora este seja o mais famoso dos livros de Fante, ganhou até adaptação cinematográfica em 2006, meu romance predileto deste autor é o subestimado “Sonhos de Bunker Hill”, derradeiro livro, ditado na escuridão da cegueira, no qual ele retoma o personagem do primeiro título, “Espere a primavera, Bandini” (1938). 

Fante não gostava muito, dizem, mas acabou incluído à fórceps na galeria dos beatiniks como se fosse uma espécie de precursor de Jack Kerouac e das aventuras sincopadas de Dean Moriarty.  Agora, imagine um encontro entre Arturo Bandini, Dean Moriarty e Holden Caulfield de “O apanhador no campo de centeio”, de Salinger? 

“Parecia que todo mundo estava fazendo jogos de palavras, que aqueles que não diziam quase nada eram considerados excelentes escritores”. Mesmo desanimado com o cenário da época, Bukowski seguia lendo, de lições de anatomia a matemática, até encontrar aquele romance dando sopa em uma das estantes. 

Mesmo sem qualquer referência sobre o livro, ele sentiu logo na leitura das primeiras páginas ter finalmente encontrado um interlocutor autêntico. “O humor e a dor entrelaçados a uma soberba simplicidade. O começo daquele livro foi um milagre arrebatador e enorme para mim”, descreve no prefácio. 

Bukowski chantageou a Black Sparrow, então sua editora, a reeditar “Pergunte ao Pó”. Entre os dois eventos, guardou reverência absoluta a Fante. Tanta reverência que sequer conseguia se aproximar fisicamente dele. “Fante foi meu deus e eu sabia que os deuses deviam ser deixados em paz, a gente não batia nas suas portas”.