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Paulo Leandro
Publicado em 28 de dezembro de 2019 às 05:00
- Atualizado há 2 anos
O que diferencia o olhar de um Renato Portaluppi da mundividência de um Roger do Bahia? O que faz um treinador, principal liderança dos jogadores, identificar-se com a justiça aritmética, aristocrática, meritocrática, diante da reparadora, geométrica, proporcional? >
Outra curiosidade nasce da verificação do patrulhamento constante da imprensa em relação a um dos pontos de vista. Raramente, ouço ou leio um repórter perguntar, em tom de Santa Inquisição: >
- Você se considera um cara de direita? >
O que sói ocorrer é o oposto, como se o newspaperman virasse preposto dos integralistas, questionando o profissional por ter desenvolvido a capacidade de verificar princípios e valores mais adequados ou não ao melhor convívio humano: >
- Você se considera um cara de esquerda?, perguntam, como se fosse algo assim “você tem parte com o demônio?”>
Nem precisaríamos citar o exemplo do atual campeão do mundo, o treinador do Liverpool. Além de Reds (Vermelhos), o team não só preza valores humanitários, como tem a recompensa da divindade ao ser reconhecido como o melhor, capaz de vencer o time do “gado” brasileiro.>
O orgulho de “ser de esquerda” está intimamente relacionado à capacidade cognitiva e ao repertório de virtudes: além do conhecimento, da moderação e da coragem, um sentimento de compaixão mais desenvolvido para sentir a dor e o sofrimento de outras pessoas. >
Por isso, o treinador do Liverpool, cujo nome as musas sonegam-me provisoriamente, não teve a menor dúvida, só faltou bater no peito, antes de exclamar em ótimo som para o repórter que tivesse ouvidos: >
- Jamais votaria na direita. Sim, sou de esquerda sim. Yeah!>
Da mesma estirpe de um Ademir da Guia, de um Afonsinho, de um Dr. Sócrates, há estes futebolistas cuja inclinação natural pelo melhor convívio fortalece um caráter de autenticidade iniludível. >
A escolha vai depender muito de como este ser lançado no mundo entende o conceito de justiça, personificada no ente “dikê” grego. Impresso é bom porque você pode agora voltar ao primeiro parágrafo e entender melhor. >
Vamos dizer que o cágado aposte uma corrida com o coelho. Partem os dois da mesma linha. Estão em igualdade. Será justo se o coelho vencer. O regulamento foi igual. Esta é a justiça do “ser-de-direita”. O mérito será do coelho e, aritmeticamente, terá acesso a suculentas cenouras. >
Já o “ser-de-esquerda” defende equidade: se o coelho corre muito mais, como pode sair do mesmo ponto do amigo quelônio? A justiça, aqui, precisa reparar esta diferença, daí a importância de toda a política de inclusão, ora em fase de destruição no Brasil. >
Nem as pessoas com deficiência os “seres-de-direita” consideram, pois já tramita um projeto de lei acabando com as cotas no trabalho, como vinha acontecendo desde 1991. O conceito de igualdade destrói também as oportunidades dos herdeiros do pós-abolição. >
Roger é só uma exceção em um futebol que foi negro quando se pagava mal e os dirigentes controlavam os ganhos dos jogadores, forçando-os a assinar contratos em branco (saiu o trocadilho, sem querer).>
Quando percebermos a próxima maledicência, para inquirir se o futebolista é de “esquerda”, agora já sabemos por que incomoda tanto.>